quinta-feira, 17 de maio de 2012

O POETA

O poeta é publicado nos jornais. É lido e, quiçá, discutido. Agora olha a gata branca. Para os gatos o tempo é circular, é o eterno retorno. Para o poeta há dias incendiários, outros tranquilos como este. Ainda assim o poeta não faz da vida uma guerra, a luta pela existência. Tem dias tristes, deprimentes mas tem outros de vida plena. Vai conhecendo os homens e as mulheres. Não se inscreveu em campeonatos nem sente inveja. Preocupa-se com a construção de si mesmo e do homem. Muitas vezes veste a pele do cidadão respeitável. No entanto, em certas ocasiões sai da linha. Consegue ser fogo, embriaguez, vida. Mesmo quando está aparentemente em sossego como agora. E assim se faz o poema. Mesmo que não venha em verso. O poeta escreve calmamente. Mas sabe que a sua escrita queima. Contudo, agora é a paz que deseja. Com os gatos e os pássaros. O poeta escreve calmamente.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

PLENAMENTE ÚNICO

"Quem não for como toda a gente, quem não pensar como toda a gente, corre o risco de ser eliminado" (Ortega y Gasset, "A Rebelião das Massas") Desde a infância que temos de seguir o caminho da normalidade. Temos de nos integrar no grupo para sermos aceites. Temos de concordar com o grupo, com a maioria, com a "felicidade da maioria". Temos de arranjar um emprego, temos de assentar, de abandonar as "loucuras" da juventude, temos de ser cidadãos sérios e cumpridores. A TV leva-nos a pensar como toda a gente, a aceitar a existência de um governo, a ser o homem médio, das "meias-medidas". Ora, o homem é muito mais do que isso, é aquele que se constrói, aquele que procura. É também o poeta, mas não o versejador da corte, aquele que ama desesperadamente a dama, que segue o caminho que conduz a si mesmo, como diz Nietzsche, que procura o conhecimento, a arte e a glória. É aquele que desafia as convenções, o tem que ser, as linhas rectas. Por isso não suporta ser dominado pelo grupo, pela sociedade, pelos poderes, pelos polícias. Tem uma voz original, que se destaca das outras. Às vezes é louco, outras extremamente lúcido. Todas as castrações o perturbam, quer ser plenamente livre, plenamente vivo, plenamente único.

sábado, 12 de maio de 2012

O GRANDE LIVRO

Tenho a garra e a voz expressiva, segundo rezam as crónicas. Já aos 20/21 surpreendia no Tuaregue em Braga. Agora quero uma mulher mas quero também a glória. Preencho cadernos e cadernos. Não sei se se vão perder. O sr. Tiago cumprimenta-me. Compenso a preguiça de há pouco com o esgalhar da escrita. Há dias em que durmo horas e horas ou que simplesmente fico na cama, outros em que passo a noite acordado, é aquela vontade de não perder o instante, de agarrar a vida com todas as forças. Mesmo não sendo um realista, longe disso, sou realista, hiper-realista na escrita. Alguns investigam muito para escrever romances, eu investigo para o grande livro, que não sei quando virá. Escrevo para me manter vivo. Quando vou à cidade estabeleço diálogos com outros cidadãos. Política, literatura, arte, filosofia. O que é certo é que a extrema-esquerda vence na Grécia. O que é facto é que tenho a vida toda à minha frente. A vida é minha. O vosso bombardeamento já faz menos efeito, ó reis da máquina. A criança detém-se diante de mim. Quem virá a ser? Vem-se ao mundo e deixa-se marca num círculo muito restrito. Eu quero mais do que isso. Eu quero entrar nas mentes e nos corações. Tenho amigos e amigas. Não estou com eles todos os dias. Há dias, tardes, em que fico assim. Escrevo, leio, não paro de escrever. Porque raio não crio personagens?

sexta-feira, 11 de maio de 2012

A NOVA ESPERANÇA

Edição 78, 11 Maio 2012 A NOVA ESPERANÇA O resultado histórico da coligação de esquerda radical (Syriza) nas eleições legislativas na Grécia e as descidas vertiginosas da Nova Democracia (direita) e do PASOK (socialistas) significam a derrota das medidas de Berlim e da troika, bem como das receitas de austeridade. Há uma nova força, a que se juntam outros partidos de esquerda e de extrema-esquerda, que não aceita uma Europa que se reduz à finança, uma pretensa democracia ao serviço dos banqueiros, dos especuladores, dos tecnocratas, um pensamento único que tanto agrada aos comentadores do regime que começam a meter os pés pelas mãos. Da Grécia vem uma nova esperança, que já era visível nas manifestações de Atenas, que não aceita que a vida se resuma a uma fórmula única e irreversível. Começamos a ficar realmente fartos dos homens do centro e da direita, dos homens do negócio e do pacto orçamental, do homem das meias-medidas, do meio-homem. A revolução está próxima. ---- OS MEIOS-HOMENS E O HOMEM INTEIRO De que falam as pessoas? Porque vivem? Não faz sentido viver para trabalhar. Não faz sentido viver para andar atrás do dinheiro. Porque não ser pleno? Porque não criar, transmitir a criação e depois descansar? A maior parte das conversas nada me dizem. A maior parte das conversas nada acrescenta de novo, nada tem de criativo, de poético. O que faz aqui o homem? Porque tem de trabalhar, de andar atrás do dinheiro? Porque é que o dinheiro há-de ser mais de uns do que de outros? Porque é que há ricos e pobres, opressores e oprimidos? Porque hei-de aceitar isso como uma fatalidade? Porque não hei-de estar no princípio do mundo? Porque não hei-de nascer outra vez? Que forças me impedem? Porque não hei-de escrever como Shakespeare ou Nietzsche? Que forças me impedem de ser pleno, aqui nesta cidade (Braga) que me adoptou, que me mostrou a noite e a vida? Porque não me hei-de interrogar como Hamlet? Foi para nos andarmos a enganar-nos uns aos outros, a guerrear-nos uns aos outros que viemos? Para que viemos? Porque é que os nossos pais nos trataram com amor e carinho? Que maldição se abate sobre nós a partir do momento em que nos encaminham para o mercado de trabalho, para a máquina? Porque é que só às vezes nos é permitido sermos autênticos, livres, felizes? Porque é que não podemos beber sempre da taça? O que é que nos impede de brindar agora? O que é que nos obriga a fazer o que o governo ou outro patrão qualquer nos manda? Porque é que alguém há-de mandar? Porque é que existe um Estado ou um chefe? Porque não havemos de celebrar a vida noite e dia? Quem nos obriga a trabalhar e a ganhar dinheiro? Que estamos a fazer aqui? Rimo-nos às vezes, quando nos rimos, vendem-nos umas beldades inacessíveis na televisão, vá lá que a nós, criadores, nos roubam menos o tempo. Estão sempre a roubar o tempo à esmagadora maioria dos homens. É isso que fazem. Não, não percorremos as ruas de Atenas com Sócrates e Platão. Não temos o vagar de dialogar livremente, de procurar a virtude e a sabedoria. Estão sempre a roubar-nos o tempo, a afastar-nos. E depois muitos contentam-se com as vitórias do futebol. Mas, no dia seguinte, acaba. Regressamos ao tédio e ao trabalho. Vivemos a vida a prestações. E depois tudo parece tranquilo, boas maneiras, euromilhões. É a felicidade de plástico. Somos meios-homens, meias-mulheres, o homem das meias-medidas de que falava Nietzsche. Porque não somos inteiros? Porque não o banquete permanente? Porque nos vêm pregar o sacrifício e a morte em vida? Quem são eles para pregar seja o que for? Pelo contrário, são eles que perseguem os verdadeiros profetas, o super-homem, são eles que os crucificam. Mas a culpa também é dos que os colocam lá, dos que, no último instante de soberania que lhes é permitido, os elegem. Também eles crucificam os profetas e os super-homens. Também esses os abandonam no palco ou na praça pública, também esses os deixam sem trocos, sem abrigo, sem nada. Como se escrever ou pregar não fossem actividades que exigem um esforço, dedicação, como se não fossem actividades superiores. Porque raio temos de aceitar estes juízes que nos impõem? Porque raio tanta gente os aceita e apoia? É o medo. Vivemos no medo de perder o emprego, de perder o dinheiro, da morte, da doença. A máquina de propaganda do capitalismo contribui, e de que maneira, para nos meter esses medos na cabeça. Não, assim nunca seremos livres. Assim nunca nos sentaremos à mesa do banquete. Contentamo-nos com umas migalhas que nos vão dando, com umas saídas à noite, com umas idas ao cinema, com uns copos aqui e ali, com umas sessões de poesia. Só a espaços somos plenos, completos, inteiros. Depois vem sempre o trabalhinho, a obrigação, o sacrifício. Estamos longe da festa, do banquete, da embriaguez permanente. Inventamos sempre juízes, deuses, o deus único, os governos que nos vêm punir se nos portamos mal como as criancinhas. O medo. Sempre o medo. O relógio maldito. O tempo que nos roubam, a vida que nos roubam.

terça-feira, 8 de maio de 2012

A IMENSA SOLIDÃO

Estranha alegria sinto eu hoje. Uma estranha comunhão com o mundo. Apesar da máquina, da propaganda, do capitalismo, as pessoas sorriem para mim, tratam-me bem. Apesar de eu ser o poeta do caos há uma harmonia no ar, como se a guerra entre os homens estivesse distante. Apesar de se continuar a falar de contas e de trabalho, hoje sinto um certo estado de graça como se tudo me fosse dado de graça, como se estivesse a nascer outra vez. Que relação tem a minha mente com a da mulher em frente (terá a minha idade) com a criança? Talvez o amor, o carinho. De resto, seguimos caminhos completamente diferentes. Aparentemente fui muito bem até ao 12º ano. Aparentemente, pois era muito tímido, pensava muito, só tinha dois amigos: o Jorge e o Rui. Depois os Doors e o Jim Morrison deram-me a volta à cabeça, comecei a ler, lia muito. Então fui para o Porto, para a Faculdade de Economia, sentia-me só, muito só, deslocado, comecei a entrar em ruptura com a economia e com a finança. Saía à noite em Braga, conheci a noite e os concertos em Braga. Braga acolheu-me. Nunca o esquecerei. Tornei-me um rebelde, mesmo que ficasse meses paralisado com as longas depressões. Não assentei. Não casei. Não tive filhos. Abracei causas políticas, revolucionárias. Publiquei livros. Fiz performances, cantei em bandas, disse poemas. Fiz rádio, publiquei em jornais e revistas, fui funcionário e dirigente do Jornal Universitário do Porto, fui jornalista. Integrei e fundei movimentos anti-praxe. Não segui realmente a via da normalidade, do assentar, do trabalho certo, do relógio. Esta gente, a maioria clara, seguiu essa via. Muitos deles e delas contentam-se com primarismos intelectuais, com futilidades, com músicas pimba. Muitos deles, muitas delas não têm pura e simplesmente capacidade de raciocínio e têm a imaginação castrada. Por culpa da máquina mas também por culpa própria. Daí que tenham seguido sempre dentro dos trilhos, em linha recta. Se houve momentos em que questionaram a máquina depressa se deixaram levar pelo canto desta. Por isso fui diferente. Houve pessoas, livros, discos, filmes, peças de teatro que me fizeram divergir, sair dos trilhos. E é assim que cheguei aqui hoje vivo, apesar das depressões, apesar dos fracassos, apesar da imensa solidão. Imensa solidão que também me fez descobrir o caminho que conduz a mim mesmo, imensa solidão que também me ajudou a afastar-me da máquina.

A NOVA ESPERANÇA

O resultado histórico da coligação de esquerda radical (Syriza) nas eleições legislativas na Grécia e as descidas vertiginosas da Nova Democracia (direita) e do PASOK (socialistas) significam a derrota das medidas de Berlim e da troika, bem como das receitas de austeridade. Há uma nova força, a que se juntam outros partidos de esquerda e de extrema-esquerda, que não aceita uma Europa que se reduz à finança, uma pretensa democracia ao serviço dos banqueiros, dos especuladores, dos tecnocratas, um pensamento único que tanto agrada aos comentadores do regime que começam a meter os pés pelas mãos. Da Grécia vem uma nova esperança, que já era visível nas manifestações de Atenas, que não aceita que a vida se resuma a uma fórmula única e irreversível. Começamos a ficar realmente fartos dos homens do centro e da direita, dos homens do negócio e do pacto orçamental, do homem das meias-medidas, do meio-homem. A revolução está próxima.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Sou o poeta do Piolho tenho o meu livro "Café Paraíso" exposto no Piolho ouço a conversa da mesa do lado o Carlos Pinto já se foi o Joaquim Castro Caldas já se foi o João Ulisses já se foi O Rui Costa já se foi eu continuo aqui talvez vá muita gente ao meu funeral mas chega de lamúrias o que é facto é que continuo aqui vivo venho á cidade e encontro este e aquela sou um poeta isso sei que sou isso ninguém me tira não gosto de governos nem de gajos a mandar se alguém me dirigir a palavra eu respondo aos 18/19 anos em Braga toda a gente falava com toda a gente o pessoal abraçava-se ao som dos Doors isso perdeu-se as pessoas fecham-se em grupos não há aquela espontaneidade aquela liberdade anda tudo muito controlado mesmo que não pareça eu continuo aqui vivo sem culpas nem obrigações não segui a via do economista nem do merceeiro por isso me sinto livre mesmo que olhe para o relógio o governo não vem dar-me palmadas de vez em quando subo ao palco gosto de lá estar é outra dimensão comecei cedo depois fiz umas paragens agora aqui estou o poeta do Piolho o poeta no Piolho acredito que posso ir mais longe chegar onde nunca cheguei sigo pela estrada larga sou aquele que sou. Porto, Piolho, 30.4.2012

CAFÉ

O café é a droga que faz o meu cérebro funcionar sem café não conseguiria ler nem escrever nem estudar sem café não estaria aqui á mesa a divagar sem café não conseguiria passar as ideias para o papel por isso tenho de tomar, pelo menos, dois cafés por dia por isso venho ao café tomar café.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

OS BÁRBAROS DO "PINGO DOCE"

A barbárie já chegou a Portugal. No 1º de Maio, Dia do Trabalhador, uma massa de gente agrediu-se e atropelou-se a troco de uns descontos no “Pingo Doce”. Bárbara é a atitude do dono do “Pingo Doce” que põe os trabalhadores a trabalhar no 1º de Maio em condições miseráveis. Bárbaro é o seu oportunismo financeiro. Mas bárbaros são também aqueles que, sem qualquer ponta ...de dignidade, invadem os supermercados no 1º de Maio e se batem por um naco de carne. Passos Coelho e o Alexandre do “Pingo Doce” conseguiram levar o país até à barbárie. Afinal, o respeitinho, os brandos costumes e as boas maneiras são só de fachada. Bastaram umas promoções para virem ao de cima, além da pobreza e da miséria, os instintos básicos do salve-se quem puder, do egoísmo, do fechamento na família, do primitivismo intelectual, da inveja, da falta de humanidade. E isto ainda está no princípio…

segunda-feira, 30 de abril de 2012

AMOR, LIBERDADE, POESIA

Amor, liberdade, poesia. Eis o que nos permite combater a sociedade do medo, do controlo, do mercado. “O amor brotou de uma incrível força de vida, que transfigura a vida. Liga-nos ao outro, ao mesmo tempo que nos restitui a nós mesmos. (…) O amor suscita uma quase divinização para um ser de carne, sangue e alma”, afirma o sociólogo Edgar Morin. É essa força de vida que no...s faz viver para viver, ou seja, poeticamente, que nos aproxima do divino ou que até nos faz atingi-lo. Se formos afecto, se formos capazes de criar arte ou valores, se nos libertarmos das imposições da máquina do cálculo e dos mercados seremos seres integrais, plenos. Temos de ser capazes de comunicar, de dialogar com o outro que ainda está receptivo, curioso, temos de ser capazes de dar ideias e amor, de fugir a tudo o que nos castra, que nos inibe, que nos impede de expressar livremente. Temos também de ser capazes de fazer crescer o nosso eu interior, de o alimentar de amor, conhecimento, poesia. Temos de ser contrários a tudo o que o capitalismo impõe: a inveja, o culto do ganho, a usura, a competição. Temos de nos descobrir a nós mesmos, de desenvolver ao máximo as nossas potencialidades, de viver plenamente, mesmo que eles não queiram, mesmo que eles tudo façam para nos diminuir, para nos deprimir, para nos inibir, para nos reprimir.

sábado, 28 de abril de 2012

O ÚLTIMO HOMEM

Edição 77, 13 Abril 2012 CULPADOS Aumentam os sem-abrigo na cidade do Porto, aumentam os casos de depressão e suicídio, muita gente está a ficar endividada e sem dinheiro. Eis a Europa de Merkel, eis os seus empregados portugueses, eis a terra prometida de Obama e dos mercados. Os seres humanos são tratados abaixo de cão, são abandonados a um canto, nas ruas da cidade ou então sofrem sozinhos perante um mundo cão que não lhes dá amor, apoio, liberdade, dignidade. Passos Coelho, Merkel e a troika são mesmo culpados da morte, da solidão e da infelicidade de milhões de portugueses. Entretidos a fazer o jogo dos especuladores e dos banqueiros são incapazes de um gesto de humanidade. Só há poder e negócios dentro daquelas mentes. Não merecem sequer que lhes chamemos seres humanos, são sub-homens, sub-mulheres. Eles e todos os seus criados e todos os que os seguem. Não são sequer dignos que lhes dirijamos a palavra. Merecem cair. ---- O ÚLTIMO HOMEM Segundo Allan Bloom ("Gigantes e Anões"), para Nietzsche, a democracia liberal é o lar do "Último Homem", um ser sem coração e sem convicções, uma marioneta dedicada à preservação e ao conforto. Eu vejo esse "Último Homem" aqui no café. Apenas sente amor pela família e aproxima-se dos outros homens graças ao medo da morte e da solidão. De resto, nada de elevado, de nobre, as conversas são perfeitamente banais e superficiais. O último homem, o homem burguês deixa-se levar por cançonetistas pimba, por programas que exploram os sentimentos primários, por "reality-shows", por notícias manipuladas. Não há convicções, tanto se vota no PSD como no PS. O último homem fala do sustento, do conforto, das doenças, do dinheiro ao fim do mês. Em suma, uma tremenda vulgaridade, um bocejo permanente. Deseja-se que as crianças sigam a linha dos pais e que venham a ganhar muito dinheiro, porque isso corresponde á felicidade. Daí que as crianças estejam limitadas à partida, apesar dos beijos e dos carinhos, a menos que se venham a revoltar contra a máquina. No fundo, estamos perante um sub-homem, incapaz de criar, que se limita a reproduzir o sistema e a imitar, por medo, o parceiro do lado. Não há qualquer enriquecimento ou engrandecimento do eu nem criação de valores. Estamos muito longe do homem superior de Nietzsche. www.jornalfraternizar.pt.vu

sexta-feira, 13 de abril de 2012

ÀS PORTAS DO NOVO MUNDO


Ao longo destes anos, não obstante as minhas aparições públicas, tenho sido o homem da solidão. A solidão permite-me pensar, observar o mundo, tirar conclusões. Como diz o dr. Jorge Marques, ganhei uma ocupação. Apesar de nos últimos 20 anos ter estado sobretudo com a Gotucha, tenho sido o homem da solidão e da escrita. Haverá poucos como eu no mundo. Bem sei que há escritores profissionais mas estou certo que poucos vivem a escrita como eu. Eu vivo aquilo que escrevo. Escrevo ao ritmo do coração. Combato a depressão. Falo com a D. Rosa de coisas aparentemente triviais. Tomo três cafés, bebo cerveja. Realmente debruço-me sobre o mundo. E o entusiasmo e a vontade voltam. Aparentemente pouco se passa. Os carros passam lá fora. A televisão passa mulheres boas. A empregada da confeitaria recolhe as chávenas. Um homem fala ao telemóvel. Outro homem, que é escritor, escreve. O talho em frente. A revolução não é aqui nem é hoje. Por isso, o homem questiona os próprios revolucionários. Pensa que a maior parte deles ainda não compreendeu a dimensão do problema. É o próprio homem que está a ser destruído. O capitalismo dos mercados altera o homem, retira-lhe a dimensão do êxtase, do amor, da poesia. É certo que há homens que nunca tiveram essa dimensão mas os jovens, as crianças poderiam atingi-la. Esta máquina se não os atira para o conformismo, para o niilismo, atira-os para o caos, para a barbárie. E os revolucionários andam demasiado ocupados com a economia, com os bolsos dos trabalhadores e esquecem a alma. Precisamos de homens de alma, nobres, só os homens de alma serão capazes de se libertar da influência da máquina, de a pôr em causa, de se unirem contra a máquina. Será realmente necessária uma revolução no pensamento, uma verdadeira emancipação dos homens. Como já vem acontecendo em Atenas e Barcelona. A palavra de ordem é mesmo desmontar a máquina que nos atiram todos os dias à cara via TV, via outros media. Não podemos ficar à espera de maiorias. Só uma grande minoria tomará consciência da situação. Digamos que uns 20% serão suficientes. Não deixemos que os banqueiros, os especuladores e os economistas assassinem o homem. Ergamos a espada do amor, da fraternidade, da criação, da poesia, do pensamento, da filosofia. Só assim lá chegaremos. Pensemos realmente no que se está a passar, no que nos estão a tirar. Pensemos realmente que eles são os inimigos da vida. Pensemos realmente que isto não pode cair na barbárie ou na ditadura. Pensemos que está tudo nas nossas mãos e nas nossas cabeças. Matemos o capitalismo dentro das nossas cabeças. Entreguemo-nos ao amor, à arte, à poesia. Derrotemos os nossos inimigos internos e externos. Pensemos. Pensemos realmente no que está em jogo. Sejamos lúcidos mas não deixemos que eles nos roubem também a nossa loucura. Estamos às portas do novo mundo. Não o esqueçamos. Ele está nos nossos corações e nas nossas mentes, nas nossas almas. Acreditemos. Espalhemos a Boa Nova.

VIVER PLENAMENTE




O homem e a mulher comuns preocupam-se essencialmente com a sua auto-preservação e com o enriquecimento material. Vivem no medo e no medo da morte e da doença. Não conhecem nem procuram os grandes livros e as grandes obras de arte. Por isso, só a espaços alguns deles são tocados pela beleza ou pelo divino. Além do mais, são permanentemente bombardeados pela máquina de propaganda do capitalismo dos mercados e deixam-se levar por ela. Já o poeta e o filósofo amam o conhecimento, a criação, a virtude. Não podem viver em função da sobrevivência, procuram o que não tem preço, procuram viver plenamente a vida.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

SAPIENS-DEMENS




O poeta é publicado nos jornais. Escreve crónicas que, às vezes, não são bem crónicas. São estados de alma. O poeta deveria continuar a trabalhar, a investigar. Mas faz uma pausa para criar ou, pelo menos, para acrescentar algo ao mundo. Acredita que isto tanto pode desembocar no caos como no novo homem. Olha as crianças. Quem virão a ser elas? Porque as estragam? As mulheres dão-lhes estes mimos todos mas depois elas crescem, passam a servir a máquina, o mercado, a ideologia dominante. Cedo deixam de questionar os mistérios do mundo. Tornam-se seres limitados, finitos. O seu espírito não evolui. Não se passa para o outro lado nem volta. O poeta é diferente. Vai e volta. Não tem aquela destreza nos trabalhos manuais. Não é o "homo faber". É mesmo o "sapiens-demens". O próprio espírito, a alma. Em volta disso gira a sua vida.

O POETA

Agora sei que estou certo. Sei que devo combater a economia, o homem burguês, o sentido prático. Sei que devo seguir o espírito, o pensamento, a liberdade. Com Edgar Morin sei que a alternativa à globalização técnico-financeira é a globalização das ideias, do amor, da poesia, da criatividade. Nesse sentido devo criar, criar para o novo homem, para o novo mundo. Essa é a minha tarefa aqui na Terra. Já em miúdo me interrogava sobre o porquê das coisas, já em miúdo questionava o homem. Sou mesmo uma espécie de profeta, de rei de outras eras. Tenho em mim Jesus e Zaratustra. Há dias, noites em que vejo a luz. Desde a infância que sou diferente. Há dias, noites, em que me deixo levar pelo álcool, em que procuro companheiros e companheiras para celebrar mas poucos, quase nenhuns me compreendem. Sempre soube que queria algo mais que a realidade rotineira. A partir de certa altura soube que estava na estrada do excesso. Não há volta a dar-lhe. Não vim para as tarefas domésticas, não vim para o ganhar dinheiro. Sou um homem do pensamento. Sei que as alternativas ao novo mundo são a tirania, que já vai existindo, e a barbárie. Cabe ao homem de pensamento construir um novo homem dentro e fora de si. Com os seus demónios, os seus deuses, os seus fantasmas. É um combate que se trava dentro de si mesmo. Poucos são realmente capazes de o compreender. Mas ele sabe que está a construir algo de real, algo de profundo. Que desde os 18/19 anos, desde a revolta contra a economia e a finança, que tem razão. Sabe-o através dos grandes poetas, sabe-o através dos filósofos. Tem razão mesmo que, muitas vezes, saia da razão. Sabe. É ele o poeta. É ele Hamlet, Artur, Quixote. É ele que duvida, é ele que se interroga, que reconhece a superioridade da filosofia. É ele que faz a poesia.