sexta-feira, 25 de julho de 2014

O BLOCO EM CACOS E OS OPORTUNISTAS

O Bloco de Esquerda está em cacos. O aparecimento do Fórum Manifesto e do Livre e o regresso interno da UDP e de outras tendências dão a machadada final num projecto político que mobilizou muito boa gente e que, de início, se reclamava do anti-capitalismo. Mas não tenhamos ilusões. O Fórum Manifesto de Ana Drago e de Daniel Oliveira e o Livre de Rui Tavares são organizações reformistas cujo objectivo é chegar ao poder através de alianças com os burgueses do PS. O Fórum Manifesto e o Livre que dizem querer reformar a esquerda não põem em causa a ditadura dos mercados nem a selvajaria financeira. Adaptam-se ao capitalismo e à democracia burguesa, não trazendo novas respostas à barbárie que já está instalada. No fundo, não passam de um bando de oportunistas em busca do tacho. Quanto ao Bloco, perdeu-se em causas pretensamente fracturantes e em parlamentarismos e perdeu toda a pureza inicial.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

A MANADA

Odeio os "picas" do metro. Vêm antipáticos com aquele ar controleiro de lacaios do sistema exigir o cartão validado. No fundo, são eles os cães de fila do poder, da autoridade. São como os polícias que castram a tua liberdade, a tua autonomia, que te retiram a alegria de viver. Aproveitam-se do seu pequeno poder para se imporem aos outros, poder que está num pequeno bilhete que divide o cidadão cumpridor do marginal. Não, não gosto dessa gente. Nem de todos os homens pequenos que passam à frente, que empurram, que trepam. Não sou daí. Não nasci assim. Não pertenço à manada.

domingo, 20 de julho de 2014

O AMOR

Á excepção de Fante, Miller ou Bukowski, prefiro os livros de filosofia ou de sociologia aos romances. Gosto de sublinhar os livros, de tirar notas. Gosto de estudar os livros. Nem sei como pude publicar tanta coisa menor. Tenho a obrigação de escrever bem mediante as leituras que faço. Tenho a obrigação de ser um grande escritor, um grande poeta e talvez até um filósofo. A vida que tenho vivido dá-me motivos para escrever. Os filmes, as aventuras, as histórias de bares e de putas. Mas também os amores, o amor que sinto por ti. O amor que cresce. A tua ausência que me faz sofrer. A vontade de te ver, de te beijar, de te abraçar. O amor louco que me arrasta, que me prende a ti.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

O POETA MALDITO

Leio Dostoievski, "O Eterno Marido". Em Santo Tirso ainda se recordam do meu pai, antigo presidente da Assembleia Municipal. Não segui os passos do meu pai. Não sou o senhor engenheiro, respeitado, respeitável. Sou antes isto. Um poeta maldito, aquele que se revoltou, que fez umas asneiras, que se embriaga. Apesar de tudo, aqui em Vilar do Pinheiro, as pessoas respeitam-me. Sou o senhor que lê e escreve. Que passa as tardes nisto. Que vai conhecendo umas miúdas. Que fala com elas. Que, de vez em quando, as beija. Que está quase sempre teso. Que vai tendo umas namoradas mas que não pode assumir grandes compromissos. 
Vou construindo uma história. Tenho os meus livros. Os que leio e os que escrevo. Tenho os meus filmes. Não sou um cidadão comum. Não me adaptei à vidinha. Não segui a linha recta. Apanhei patadas. Já quando era puto era diferente dos outros. Pensava muito. Como agora. Dizem que tenho bom coração mas tenho também a raiva. Parto coisas. Rebelo-me contra Deus como Lúcifer. Consigo ser o mais louco dos homens. Na verdade, pouco ou nada tenho a perder. Tenho o meu lado aventureiro. Não embarco em rotinas. Aliás, a rotina mata-me, deprime-me. Não conseguiria levar a vida desta gente. Trabalho, praia, filhos, obrigações. Já andei com gajas completamente loucas, no bom e no mau sentido. Vivo os livros, vivo muito dos livros. John Fante, Dostoievski, Bukowski, Henry Miller. Se não fossem os livros já teria dado um tiro na cabeça. Não saberia como preencher o tempo, como combater a solidão. É claro que observo as pessoas, sempre de um lado para o outro, sempre apressadas, à procura não sei do quê. Não consigo entender esta gente. Vêm ao mundo trabalhar, cumprir tarefas. Não vivem como os poetas, como alguns poetas. Passam a vida a pensar no dinheiro, na sobrevivência. Não gozam a vida na sua plenitude. Como eu contigo em Santo Tirso na festa do santo. Beber até ser dia. Não, não sou como eles.

domingo, 13 de julho de 2014

LEONOR

Em Braga. De novo n' "A Brasileira". Há já alguns meses que não passo vários dias seguidos aqui. A Leonor está triste, doente, deprimida. Não há outra menina como ela. Há 21 anos que nos conhecemos. Muita coisa se passou entretanto. Ela tornou-se professora, eu um poeta vadio que já fez alguns disparates, uma "avis rara" que alguns querem entrevistar. Sinto-me bem aqui em Braga. As pessoas parecem amáveis. As donas d' "A Brasileira" são bonitas. Sinto-me em casa, na minha cidade. Posso não ter a fama de outros, posso não ter a técnica mas sei que sou capaz do melhor. Sei que consigo escrever bem. Boa literatura. Mesmo que já tenha publicado coisas sofríveis, mesmo que não seja reconhecido por alguns. Ainda assim tenho os meus fãs, as minhas fãs. Vou deixar um legado, como alguém disse. Vou deixar uma obra. E não vou ficar por aqui. Ainda tenho muito a dizer, a escrever. Ainda tenho muitas cervejas a beber. Sei que me repito. Mas há coisas a denunciar. Há a Leonor. Sofro por ela. Revolto-me contra este mundo de injustiça, de manha, de rapina. Apesar de existirem mulheres bonitas, pessoas bonitas. No entanto, a maioria tem medo de viver, de explodir, de se extasiar. A maioria agarra-se ao trabalhinho, ao dinheirinho. Leva uma existência quadrada, vazia. Não valoriza o conhecimento, a luz, compete entre si. Contudo, apesar de tudo, ainda acreditamos em algumas pessoas. Ainda acreditamos no diálogo, na descoberta, nas conversas até às tantas. Na ausência de pressas, de pressões. No homem livre, sem obrigações. Acreditamos que somos capazes. Não vamos atrás da felicidade da maioria.

quarta-feira, 9 de julho de 2014

HISTÓRIAS DE BARES E DE PUTAS

Tenho tantas histórias. De copos, de noitadas, de putas. Estive nos bares até ser dia. Tive grandes discussões políticas, armei confusão, fui expulso, apanhei porrada. Também parti os vidros dos carros e da Junta de Freguesia. Fui a tribunal. Fui apanhado pela polícia. Esta gente que me vê nem imagina o quão arruaceiro já fui. Fui às putas do Marquês, da Trindade, da rua da Alegria. Apaixonei-me por uma. Ela pagava-me o pequeno-almoço no café Pereira. Elas muitas vezes gostavam de mim, contavam-me a vida. Havia o "Big Ben", onde elas iam com os travestis. Eu falava com elas, bebia, escrevia. De facto não sou um cidadão exemplar. Meti-me em alhadas. Se tiver dinheiro bebo até ao fim. Não, miúdas, não sou apenas o gajo que escreve e lê. Não sou nenhum santo. Tenho esse lado maldito. Ocupei um hipermercado, deitei uma estátua abaixo. Ás vezes ainda ameaço. E tenho matéria para escrever um romance.

terça-feira, 8 de julho de 2014

O HOMEM QUE NASCE E RESSUSCITA

Ouço alguns jovens. Também eles são críticos em relação ao sistema neo-liberal capitalista. Também eles acreditam num mundo novo, sem competição, sem intriga. Falam-me do conhecimento, da leitura. O padre Mário de Oliveira diz que somos seres humanos ainda em vias de criação. Precisamos de nos unir, de nos reunir, como os gregos na ágora. Precisamos de criar, de ir buscar o amor ao fundo de nós mesmos, não de pactuar com os bancos, com os impérios financeiros que destroem o humano. Precisamos de romper com um sistema que nos afasta, que nos isola, que nos aliena, que nos escraviza. Não nascemos para isto. Éramos crianças livres, adolescentes com sonhos, desejamos o paraíso na Terra, não nos céus. Mas fizeram de nós, de muitos de nós, máquinas de produzir e de consumir, sem tempo para o encontro, para a descoberta. Ainda temos em nós, em alguns de nós, capacidades prodigiosas. A capacidade de produzir a ideia, a capacidade de inventar, a capacidade de dar. Sim, deveriamo-nos sentar à mesa fraternalmente a discutir o homem, a literatura, a filosofia. Deveriamo-nos abraçar e anunciar o novo homem. Não este mundo de interesses, de negócios, de manha. Não estes políticos imbecis, incapazes de uma ideia. Não estes seres televisivos que nos tomam o ser e passam. Não estes animais que acumulam. Não a injustiça. Não o desamor. Não a destruição do homem pelo homem. Não a pressa. Mas o encontro, a curiosidade, a dádiva. O homem pleno, autêntico, cheio de vida. O homem que nasce e ressuscita.

sexta-feira, 4 de julho de 2014

O OUTRO MUNDO

Não vim, de facto, para este mundo. Do dinheiro, do lucro, da manha, do lixar o parceiro para subir. Sempre acreditei em algo mais. Num mundo de irmãos, de dádiva, de partilha. Odeio os poderosos, os chefes, os que fazem jogos, os que manipulam. Por isso detesto a linguagem da economia, do ganho, do comércio, do sacrifício. Imagino um mundo onde os homens se dedicam ao conhecimento, onde os homens se relacionam sem a intenção de enriquecer ou de tirar proveito. Imagino um mundo onde os homens discutem livremente sem hierarquias. Um mundo onde os homens desenvolvem ao máximo as suas potencialidades sem prejudicar ninguém. Um mundo onde os homens vivem em paz com os animais e com a natureza. Um mundo de iguais, apesar das diferenças próprias de cada um. Um mundo sem governos e sem poderes. Um mundo plenamente humano de comunhão, de verdade, de descoberta.

quinta-feira, 3 de julho de 2014

HOMENS-DEUSES

Não tenho multidões a pedir para autografar os meus livros. Não tenho milhares de leitores. No entanto, sei que exerço uma certa influência. Sei que provoco a discussão. Porque eu não segui a via das multidões. Haverá outros mais cultos e mais inteligentes do que eu, haverá outros mais eloquentes, mas eu sei que tenho a minha originalidade. Sigo os mestres. Sigo a palavra. Não estou armado. Admito a violência como último recurso mas não ando armado. Bebo do cálice. Sou verdade, sou vida. Mesmo que tenha a minha doença. E que, por vezes, caia. Na verdade, desde miúdo que me afasto do rebanho. Inventava personagens. Depois compreendi, aos 16 anos, que este mundo não servia. Era o Peter Owne, seguia os "hippies". A paz e o amor. Agora já me sinto ligeiramente embriagado. A dada altura defendi a embriaguez permanente. Não me arrependo. Não tenho que ser anjo de Deus nem militante disciplinado. Foi nos bares que me descobri. Não devo nada a ninguém. Não tenho obrigações nem compromissos. Não tenho de estar em casa a horas certas. Sou o homem da liberdade, como dizia Jim Morrison. A timidez foi-se. Sou o senhor da aldeia. Cantei em bandas. Não resultou. Tento influenciar as pessoas. Dizer-lhes que há outro mundo, outra vida. Que o homem não é escravo do capitalismo nem da tecnologia. Vejo o dinheiro a ir e vir, a ir parar às mãos dos especuladores, dos mercadores, dos políticos. Vejo o homem esfomeado. Não é justo. Nascemos para viver, não para sermos escravos. Nascemos para desenvolver as nossas potencialidades. Para criarmos. Para sermos homens-deuses. Nada nos parará.