sexta-feira, 10 de abril de 2009
NA BRASILEIRA- PARTE 3

A "Brasileira" remodelada. Faz 102 anos. Mais dois que o "Piolho". Os homens riem. Inclusivé o que teve a polémica comigo. Aqui o capitalismo também não chega tanto. Apesar de estar em todos os lados. E o velhote da república abandona a "Brasileira". Escrevo. Sou escritor. Poeta. é a minha missão. Não há volta a dar-lhe. E a Gotucha não vem. São quase 7. Não sinto o capitalismo aqui em Braga, embora saiba que ele está cá. Chegou o cavalheiro que cumprimenta toda a gente. E eu vou publicando uns livros que, à excepção de um, vão chegando a pouca gente. É como nas bandas. Também têm os seus "hits". Eu tenho o meu. Chama-se "Declaração de Amor ao Primeiro-Ministro". E está perfeitamente actual nos dias que correm. Tenho de continuar a dizê-lo. No "Púcaros" ou onde for. Estou-me a ver aí a pregar na praça pública. O que é que me iria acontecer? Não estamos no tempo dos pregadores embora, se calhar, até estejamos. O "Queimai o Dinheiro" é uma espécie de pregação. Sem Deus, contra o mercado e contra o dinheiro. As famílias agarram-se à família. Escrevo. O que é que isso diz aos restantes clintes deste café? Escrevo e a Gotucha nunca mais vem. A miúda lê. Deixou de ler. Chegou o companheiro. Também eu, quando a Gotucha chegar, deixarei de escrever. O velhote socialista abandona a "Brasileira". O cavalheiro amável, que cumprimenta toda a gente, devora a nata. Passa o Ângelo Vaz, o pintor, o oportunista. As horas passam. A Gotucha não vem. O meu pai fazia retratos, caricaturas. E fazia-o bem. Cada um tem os seus talentos. Os meus são escrever e dizer textos. Não tenho que ser igual ao Gilberto. Não tenho de atinar com os métodos do Gilberto. Passa na rua mais um personagem de outrora. O Jaime é que já não aparece. Foi-se o Jaime. Parece que ficou alguma literatura. E pronto, lá vem o capitalismo! Um gajo começa a falar de dinheiros, de impostos e de contratos. Odeio essas conversas! Sou visceralmente anti-capitalista e anti-mercantilista. Estou na mesa 107. A miúda está outra vez sozinha. Não, o gajo volta. Na "Brasileira" a tarde inteira. O poeta bebe. Sabe que é poeta. Independentemente do mundo. As cervejas vão-se bebendo. O Cãndido já foi embora. A Gotucha não vem. As horas passam. O puto brinca. Este é o reino. AQui e agora. Entra uma gaja sorridente. A Gotucha chega.
A SENHORA DA IGREJA

A senhora da Igreja deseja-me uma boa Páscoa
desconhece as minhas ideias religiosas
desconhece que andei a ler Nietzsche
e que acho que o cristianismo
é um apelo ao servilismo
no entanto, não deixo de respeitar a senhora
há qualquer coisa de autêntico no amor de Cristo
é claro que esse amor não pode ser ingénuo
não pode ser o dar a outra face
e acabar crucificado
o amor surge no meio do caos
como dizia Jim Morrison
se cantamos o amor temos de cantar também o caos
aquilo em que dá a sociedade do rebanho
as profecias dos economistas
um mundo de estatísticas, bolsas, bancos
um mundo de mercadorias e violências
a sociedade-espectáculo reduz-nos à condição
de espectadores que contemplam o espectáculo
impotentes, absorvemos a TV
a rádio passa Pink Floyd
foi com os Pink Floyd e com as letras do Roger Waters
que comecei a questionar a máquina
o rapaz com o bebé cumprimenta-me
ainda há alguma simpatia neste mundo
apesar de os macacos continuarem a trepar
ainda existe algum amor no meio do caos
e o amor poderá salvar o mundo.
"Motina", 10.4.2009
quinta-feira, 9 de abril de 2009
O HOMEM PEQUENO E O ESPÍRITO LIVRE

"Dou o nome de Estado ao lugar em que todos, bons e maus, gostam de veneno.
Vede, pois, esses que estão a mais! Estão sempre doentes, vomitam a sua bílis, e a isso chamam jornal. Devoram-se uns aos outros e nem sequer se podem digerir.
Vede, pois, esses que estão a mais! Adquirem riquezas e só conseguem tornar-se mais pobres. Esses impotentes querem o poder e, antes de tudo o resto, a alavanca do poder, ou seja, muito dinheiro!
Vede-os trepar, esses àgeis macacos! Sobem uns por cima dos outros e empurram-se para a lama e para o abismo."
(Nietzsche, "Assim Falava Zaratustra")
Eis a que se resume o Estado, o poder e a competição na sociedade capitalista. Nietzsche descreve-o magistralmente há mais de 100 anos. Macacos que "sobem uns para cima dos outros" e se empurram para a lama e para o abismo. Acontece na política. Acontece na sociedade. Luta-se por um lugar, por um emprego, por uma carreira, por um cargo. O deus-dinheiro, o mercado e a economia comandam todas as relações. Os que perdem são empurrados para o fracasso, para o desemprego, para a miséria, para a lama. É a lei do mercado e do homem pequeno. A vida faz-se de intriga, de ganância, de contas de mercearia. É a sociedade da gentalha e da canalha. E essa gentalha odeia o espírito livre, "aquele que não presta adoração e vive no meio das florestas, livre da felicidade dos servos e dos deuses", portador de uma vontade "intrépida e terrível, grande e solitária". Essa gentalha goza da felicidade da maioria e é servil para com os seus "superiores" porque está hierarquizada, levando uma vidinha de tédio, rotinas e obrigações. À lei das massas e da maioria, à democracia burguesa opõe-se o indivíduo soberano, o espírito livre de Nietzsche. Ao deus-dinheiro opõe-se a liberdade absoluta dos surrealistas. A gentalha, o homem pequeno, preocupa-se essencialmente com a sua comodidade e sustento, não procura o conhecimento. É um homem de meias-medidas, não se preocupa com o que é grande e inteiro como o espírito livre. "Vede, pois, como estes mesmos povos imitam agora os merceeiros: para juntar as mais pequenas vantagens, dão volta a todas as sujidades!". A sua "felicidade" é uma felicidade falsa que não sabe dançar: "E que por nós seja considerado perdido o dia em que não dançamos!" O espírito livre, o criador ou vive segundo a sua vontade ou não vive. O homem pequeno não tem vontade própria, age de acordo com o poder ou com a maioria. Segundo Michel Onfray, "contra o soberano que deseja o grupo, o número e uma quantidade, ele (libertário/ espírito livre) realiza a sua própria soberania e autoriza uma palavra susceptível de dizer "eu" e trata de possibilitar o mesmo exercício para cada um".
IRMANDADE
NA BRASILEIRA- PARTE II

Bebo cerveja às 5 da tarde em Braga. E daqui não quero sair. Só quero prosseguir. Sem úlceras nem cirroses. e continuo sem ver ninguém conhecido. Mas não há dúvida que estaria bem se vivesse aqui. Cerveja após cerveja. A Gotucha no sindicato a tratar da vida ou da vidinha. E eu aqui sem pressas nem pressões. A cagar no Gilberto. Na prosa moralista do Gilberto. E a patroa boazona manda. E a Gotucha nunca mais vem.
As pessoas entram e saem na "Brasileira". Os personagens de outrora ou não aparecem ou estão na esplanada. E eu bebo. Continuo a beber. Celebro o dia. Alguém conhecido cumprimenta-me. Vou escrevendo. Eis o que me resta. Não que esteja mal. Dois homens conversam acerca do sec. XIV. Foi preciso vir a Braga para assistir a isto. Dois polícias rolam no pavimento. Fanáticos da História. Querem lápides. Os velhotes falam de socialismo. Corre a anedota sobre o Sócrates que consulta a vidente. Isto sim são conversas a sério. Não é como na aldeia. Aqui fala-se de política pura e dura. Mas a culpa da crise do capitalismo é do próprio capitalismo. É dos bancos, das bolsas, das grandes empresas, dos governos. É preciso derrubar o capitalismo. Não aqui neo-liberalismos, é o capitalismo na sua essência. E tu cala-te, ó Rocha! E cala-te tu também, ó Gilberto! Não tenho de estar de bem com tudo e com todos. Não há Obama nem meio Obama. Esse até mandou mais tropas para o Afeganistão! Era esse o vosso messias? E a gaja boa volta para o lado de lá do balcão. Deve ser a patroa. Finalmente chegou um personagem de outrora! Mas logo saiu. A última vez que o vi foi na passagem de ano e estava bêbado. Ele e não eu. Eu fiquei eufórico no dia seguinte. Bebo. Sou um poeta. Os poetas bebem, salvo alguns abstémios. Faz parte da lenda. As famílias agarram-se à família. Eu não, sou um homem do mundo. SEnto-me na "Brasileira", escrevo e está tudo dito. A caneta vai correndo. A banca dos "hippies" lá fora. Os bebés que passam. A taxa de natalidade deve estar a subir pela amostra. A Gotucha que não vem. Flores lá fora à venda. Esta é a cidade. Aqui e agora. Oxalá o meu pai estivesse vivo. O gajo das performances não diz mais nada. E eu parado, sentado à mesa a escrever. Mais bebés que entram. Bebés e mais bebés. Até parece que o mundo é um bom sítio para se estar. Pelo menos aqui há gente simpática e educada que respeita o poeta, aquele que nada faz a não ser escrever, escrever, escrever. Até parece que o poeta não tem problemas de dinheiro. As depressões, essas, estão ultrapassadas. E as horas passam. É deixá-las passar. Enquanto estiver aqui estou a reinar. Até está ali um cavalheiro que já entrou em polémica comigo no jornal. Paz e sossego nas minhas hostes. Fogo fora delas. E a Gotucha nunca mais vem. Estou a escrever um tratado. Não sei quantos a ele terão acesso. Não sei o quanto ele vai ser divulgado. E as pessoas continuam a passar lá fora. Os velhotes debatem a república. E eu bebo o que me resta. Poeta na "Brasileira". Poeta da "Brasileira". Aqui recomeço. E agora vou mijar. Regresso. As luzes acesas. Os personagens de outrora lá fora. Um figurão à porta. Uma tarde inteira na "Brasileira". A eternizar-me. Peço mais uma. Que se foda! É para a desgraça! Embora esteja em estado de graça. Escrevo. É o que faço. Não me maço. Peço mais uma. E o empregado não estranha. Respeita o criador. O homem que cria. E não se enche de tédio. O que vale é que o cacau vai rolando. Mais um bebé. é a vida, a criação. E vou na quinta. Estou nas minhas quintas. Mesmo que a Gotucha não venha. Sou de Braga. É aqui que quero estar.
terça-feira, 7 de abril de 2009
NA BRASILEIRA- PARTE 1

A "Brasileira" foi remodelada. Até o Cãndido anda de gala. "O melhor café é o d' A Brasileira", diz a chávena. E o café é mesmo bom. Sabe bem estar aqui em Braga. Gosto da nova "Brasileira" como gostava da velha. Aqui é que deveria fazer uma sessão com poemas dedicados à "Brasileira". As pessoas passam lá fora. A Gotucha foi tratar do concurso. Esperemos que as coisas corram bem àquela menina. Na mesa em frente passam-se anedotas sobre o primeiro-ministro. As conversas multiplicam-se. O homem das cautelas. O Cãndido de bandeja. Salvo seja. Ninguém conhecido à vista. Vou pedir uma cerveja. Aqui, ao menos, há dinheiro. Não tenho que andar a contar a merda dos trocos. Viva a vida! E amanhã vou queimar a nota. Cerveja. Matéria-prima do poema. E que se fodam os psiquiatras! Escrevi eu há uns anos. E com razão. A cerveja empurra a escrita. Fá-la dançar. E o poeta bebe. Sacia-se. Chega o velhote da república. Senta-se a um canto. Abre o cardápio. Gostava de morar aqui. Vir aqui para a "Brasileira" passar as horas. As pessoas agarram-se aos filhos, à descendência. E depois os filhos dão no que dão. Podem seguir vias completamente diferentes. Como é o meu caso. Aparentemente comporto-me em consonância com a sociedade, mas na prática não. Na prática estou no contra, no lado subversivo, no lado da revolta. Tremo. Continuo a não avistar ninguém conhecido. Ainda é cedo. Os casais trazem os rebentos. A mão treme. Quase deixa cair a cerveja. Não sei o que é. O Cãndido continua o mesmo Cândido. E o poema não sai. Espera por melhores dias. O poeta escreve. Não sabe para quem. Talvez amanhã apareça nos jornais. Talvez continue na mesma e venda uns livros. As pessoas continuam a fazer bebés. Para que mundo? Daqui a pouco peço outra cerveja. "O melhor café é o d'A Brasileira". E eu vou bebendo. Talvez isto soe bem no "Púcaros". Ontem não estive lá. Precisava de uma pausa. Desde Agosto que não falhava. Sou o que sou. Nada a fazer. Mamas à vista. Bem diz o Carlos que, se tiver a hipótese de continuar a beber, eu não páro. Minha mesa de café. És minha. Aqui prossigo viagem. Aqui permaneço quer queiram, quer não. Aqui nasce o poema. Sabe bem estar aqui em Braga. No dia 22 de Maio cá estarei na "Centésima Página" para apresentar o livro. Aqui já ninguém me conhece. A não ser o Cândido. E não vou votar no Bloco de Esquerda. Desta vez não. O Bloco tem vários blocos. TEm desde trotskistas, leninistas, ex-maoístas a social-democratas como Ana Drago ou Miguel Portas. O Bloco não fala da revolução. O Bloco não fala na transição para o socialismo. O Bloco não se assume como anti-capitalista só para satisfazer os interesses dos sociais-democratas. O Bloco limita-se a fazer, bem, o discurso da situação. Neste tempo de crise do capitalismo é necessário assumir o discurso da ruptura, não o discurso da reforma, da melhoria do capitalismo ou da democracia burguesa. Por isso não voto no Bloco. Só vejo bebés. Bebés por todo o lado. Façam-se bebés! Leitinho em vez de cerveja. E a "Brasileira" está mais cara. E o braço continua a tremer. E a Gotucha continua no sindicato. Na "Brasileira" a tarde inteira. Na "Brasileira" a vê-las passar. Na "Brasileira" sou o maior. E chega o Marques. E o Carvalho. Agora vamos todos para o caralho. O poeta ri. Há cacau nos bolsos. E que se foda o Rocha! Que fique com a "playstation" e as suas futebolices! Não preciso de ti, ó Rocha! Estou para lá. Dispenso as tuas análises!
Não tenho a linguagem das contas. Não entro nos negócios do senso comum. As palavras "investimento" e "empresário" metem-me nojo. Não sou merceeiro, nem executivo, nem empresário!
HOMEM LIVRE

Homem livre
tu amas as alturas
detestas a linguagem empresarial
dos mercadores
fazes-te ao palco
amas a palavra
homem livre,
tu queres criar
foges ao rebanho
odeias a multidão
não suportas a mesquinhez
do homem pequeno
homem livre,
nada queres com o mercado
não usas o dinheiro
andas na corda-bamba
de um lado para o outro
homem livre,
tu amas a solidão
é nela que te encontras
não suportas que te peguem na mão
homem livre,
não nasceste para a vidinha
detestas a intriga
não vieste para a competição
homem livre,
a Terra é tua
constrói o teu reino
manda foder o rebanho!
"Motina", 31.3.2009
QUEIMAI O DINHEIRO

"Queimai o Dinheiro" é uma mescla de prosas e poesias que aborda a sociedade do rebanho, a sociedade onde o dinheiro se eleva à condição de deus, onde o mercado e a economia tudo condicionam. É contra o discurso dos economistas e dos contabilistas (daí o "Manifesto Contra os Economistas") que o livro se levanta, denunciando esse discurso feito de bolsas, défices, orçamentos, percentagens. É a crise mundial que está em causa. Governos, políticos, banqueiros, empresários, executivos são apontados a dedo. À sociedade do servilismo, da competição, da vidinha opõe-se um mundo onde o amor, a liberdade, a poesia e a revolução se insurgem com carácter de urgência. E há ainda o sexo que espreita, o prazer, o apelo à mulher como bacante dionisíaca ("Manifesto ás Gajas"), como salvação do poeta. Depois vem ainda as deambulações nocturnas, a viagem hedonista pelos cafés e bares, o percurso místico ("The Black Swan"). "Queimai o Dinheiro" é o sujeito desprezível que fura no sistema, o macaco que trepa por cima dos outros macacos em busca da banana, ou seja, do dinheiro, daí o "Manifesto Anti-Teles". "Queimai o Dinheiro" é queimar o deus que nos sufoca, o deus que está por todo o lado porque o Deus de Nietzsche está morto ou, pelo menos, gravemente doente. É queimar o deus que se opõe à vida, ás paixões e ao amor.
AQUI NO CAFÉ

Aqui no café o capitalismo não é tão forte
apesar de estar sujeito a relações de compra e venda
conto com a simpatia dos empregados
e posso passar a tarde toda a ler ou a escrever
sem que ninguém me chateie
o homem da concórdia discorre
sobre a bondade humana
e o caos não é tão nítido
mas ainda há dias a Gotucha
sentiu o capitalismo entrar-lhe pela escola dentro
aquela menina não aguenta
pede copos de água
começa a chorar
que mundo cruel tem sido este com a Gotucha
homem da concórdia,
é impossível fazer as pazes
com aqueles que nos atiram a crise para cima
não que eu não sinta um certo gozo
com esta merda da crise
talvez isto fique tão mal, tão mal
que rebente de vez
quanto pior, melhor
já dizia a velha máxima
e nós não temos nada a perder
de certo modo estamos fora da engrenagem
nem sequer sabemos funcionar dentro dela
mal apareça o foco
nós estaremos lá
estamos preparados para o caos
para pilhar os bancos
e incendiar automóveis
entretanto vamos passando a mensagem
sabemos que há quem não esteja interessado nela
sabemos que há quem seja hostil
mas também sabemos que há quem nos ouve
mesmo que não concorde com tudo o que dizemos
e nós dizemos:
merda, isto está tudo errado!
E eis que aparece o Amaral no semáforo
com o filho
adeus, ó Amaral!
E eu volto a pensar que aqui no café o capitalismo
não é tão forte
e que a gaja boa continua no quiosque
e que o empregado varre o chão
e que as horas avançam
tanto escrevi hoje
que nem peguei na "Viagem do Elefante" do Saramago
que me tem entusiasmado
e o outro empregado conta o cacau
que eu tenho vindo a queimar
ou que, pelo menos, tenho apelado a isso
na sexta tenho a apresentação do livro
espero que esteja gente
sou capaz de incendiar as hostes
apelar à rebelião
talvez comece a ficar mesmo na moda
estou farto de médias
de meias-tintas
ou, ou
mas há uma parte de mim
que está a caminho do céu.
"Orfeuzinho", 30.3.2009
AMOR, LIBERDADE, REVOLUÇÃO, POESIA

Um "dragão" invade o café e cospe fogo. O gajo ao meu lado lê o "Jornal de Negócios". Bebidas alcoólicas só depois das 12 horas. Nada de bebedeiras matinais. Aqui no "Orfeuzinho" reina o bom senso. E ainda não chegou o homem da concórdia. O "dragão" saiu. O autocarro visa o Viso. Na TV discute-se o Sócrates. O primeiro-ministro vigarista já deveria ter caído. Além de vigarista, tem tiques ditatoriais. Desta vez ainda vou votar por causa do Sócrates. Vou fazer campanha contra ele em vez de apelar à abstenção. Vou dizer muitas vezes a "Declaração de Amor ao Primeiro-Ministro". É importante que Sócrates caia. Mas o povo continua a discutir futebol. Volta, Rocha, estás perdoado! O futebol é o ponto de encontro entre clientes e empregados. E a gaja mostra a tatuagem nas costas. Estou só mas sinto-me bem. Ontem estive em Famalicão com a Claudinha. A Gotucha vem na quarta. Chega o figurão do boné. Certamente também vai opinar acerca da situação futebolística nacional. O Rocha, se estivesse cá, também o faria. O empregado saúda o doutor. O Zé do Boné senta-se. Chegou o homem da concórdia. Certamente irá discorrer sobre a fraternidade e a paz universal. Certamente irá apelar aos bons sentimentos. Eu, pelo contrário, como dizia Nietzsche, só vejo macacos a trepar uns para cima dos outros em busca da banana. É a competição em todos os sectores da sociedade. Esta é a sociedade do homem pequeno e do homem rejeitado que fica à margem, a dormir nas ruas. Esta é a sociedade dos danados. O Estado já não se lembra deles. Resta apenas a caridade. Mas a dignidade do homem não se restitui com umas sopas. Esta é a sociedade da luta diária nos empregos pelo lugar, pela promoção, pela obediência ao chefe. Esta é a sociedade capitalista. A sociedade onde os macacos se agarram à maioria, à maioria da massa imbecil. A maioria transmite-lhes segurança mas as coisas começam a mudar. Há manifestações anti-capitalistas em Londres, Paris, Berlim, Atenas. Não são só aumentos salariais que estão em causa. Está em causa o Homem, está em causa a Vida. A vida que não pode ser a vida dos economistas, do mercado, do dinheiro. A vida que não pode ser servilismo a nenhum deus. Daí o papel do amor como forma de resistência. O amor dos amantes, o amor louco, a fraternidade. Amor, liberdade, revolução e poesia. Eis as palavras de ordem dos surrealistas.
domingo, 5 de abril de 2009
A. DASILVA O.
Money Fucks
A. Dasilva O. no passado dia 3 de Abril 2009
Na livraria Clube Literário apresentando o novo livro A. Pedro Ribeiro
« Queimai o dinheiro» ed. Corpos
O dinheiro não imagina
Não fala
Mas suja e conspurca
Com este livro o poeta reúne-se numa zona de protesto
Apelando à acção
Através de um discurso de superfície
Fazendo prova desde a noite
Dos tempos da sua tarefa
Roubar ao sagrado
A matéria celeste
Para poder ser real
Trágico
Apela à desordem
A poesia não tem razão
Se se refugia no deve e haver
Do estado poético
Como mercado e entretenimento
De um jogo floral
De emoções
O poeta hoje
Assassinado
E ressuscitado
Nessa zona de protesto
Embebeda-se de mitos,
Signos entre a raiva impotente
E a revolta absurda
Disparando em todas as direcções
Ora diurno
Ora nocturno
À superfície
Ou no subsolo
No salão nobre
Ou na cagadeira
Pontapeando
A sua época
A sociedade
Para a lucidez
Na utopia
Essa terra de ninguém
Dançando
Mal fodido
Entre
«os que actuarão e quererão chegar muito alto
E os que ficarão em silêncio à espera das transformações
Os históricos e os profundos
Os criminosos
E os monges» G.Benn (1949)
Queimai o dinheiro
A. Dasilva O. no passado dia 3 de Abril 2009
Na livraria Clube Literário apresentando o novo livro A. Pedro Ribeiro
« Queimai o dinheiro» ed. Corpos
O dinheiro não imagina
Não fala
Mas suja e conspurca
Com este livro o poeta reúne-se numa zona de protesto
Apelando à acção
Através de um discurso de superfície
Fazendo prova desde a noite
Dos tempos da sua tarefa
Roubar ao sagrado
A matéria celeste
Para poder ser real
Trágico
Apela à desordem
A poesia não tem razão
Se se refugia no deve e haver
Do estado poético
Como mercado e entretenimento
De um jogo floral
De emoções
O poeta hoje
Assassinado
E ressuscitado
Nessa zona de protesto
Embebeda-se de mitos,
Signos entre a raiva impotente
E a revolta absurda
Disparando em todas as direcções
Ora diurno
Ora nocturno
À superfície
Ou no subsolo
No salão nobre
Ou na cagadeira
Pontapeando
A sua época
A sociedade
Para a lucidez
Na utopia
Essa terra de ninguém
Dançando
Mal fodido
Entre
«os que actuarão e quererão chegar muito alto
E os que ficarão em silêncio à espera das transformações
Os históricos e os profundos
Os criminosos
E os monges» G.Benn (1949)
Queimai o dinheiro
sábado, 4 de abril de 2009
RESISTIR A VALER

Actualização - confrontos marcam últimas horas da cimeira
NATO: manifestantes incendeiam hotel de Estrasburgo
04.04.2009 - 14h20 Agências
Um grupo de manifestantes incendiou, ao início da tarde, um hotel de Estrasburgo e outros edifícios situados junto às margens do rio Reno, naqueles que foram os incidentes mais graves dos protestos realizados à margem da cimeira da NATO. Se do lado alemão da fronteira, as manifestações decorreram de forma pacífica, em território francês há registo de vários confrontos entre activistas e polícias, de que terão resultado pelo menos 50 feridos.
Encapuzados e armados com barras de ferro, cerca de uma centena de jovens partiram montras, pilharam e incendiaram um antigo posto fronteiriço, já desactivado, um hotel, uma capela, uma farmácia e um posto de turismo situado junto à ponte Europa, que liga Estrasburgo à cidade alemã de Kehl.
Depois de inicialmente forçados a recuar, pelo forte assalto lançado pelos manifestantes, os agentes da polícia conseguiram reassumir o controlo da zona, com a ajuda de canhões de água e granadas de gás lacrimogéneo.
quarta-feira, 1 de abril de 2009
A MENSAGEM

A verdade é que não nasci para esta sociedade do rebanho e das contas. Faz-me confusão esta merda do dinheiro, a submissão ao dinheiro, a ultradependência perante o deus. Nem sequer sei lidar com o dinheiro. Estou sempre a queimá-lo. Como dizia Nietzsche, é necessário quebrar estas correntes que conduzem ao servilismo, à ausência de paixão, à morte. A minha vida é aqui e não é. A minha vida vem de dentro. Nada tem a ver com a vidinha do consumível, do negócio, da troca. A vida é o além que está aqui. Não suporto a mesquinhez da conta, do cálculo, do lucro, da bolsa, da percentagem, dos economistas. Tenho uma missão aqui na Terra. Essa missão não passa por trabalhar normalmente, em empregos das 9 às 5. Essa missão não passa por qualquer pacto com o governo, com qualquer governo e com os políticos. Os políticos e os economistas falam uma linguagem diferente da nossa. Nós cantamos o caos no meio da derrocada económica e financeira. Nós cantamos e dançamos no meio do fogo. Dance on fire if it intends, como canta Jim Morrison. Mas nós não temos de nos andar sempre a exibir. Só quando subimos ao palco. Também temos necessidade de ser espectadores, de observar o mundo. A nossa loucura não é camuflada, a nossa loucura é real. Celebramos o xamã, celebramos Dionisos. Amamos as nossas bacantes. Usamos palavras simples, textos directos, não suportamos escritas herméticas. Apelamos ao amor no meio do caos. Mas não o amor dos cristãos ou, pelo menos, não o dos cristãos actuais. Como disse Nietzsche, só houve um cristão e esse morreu na cruz. Não queremos morrer na cruz! Nem queremos a vida eterna. Queremos a eternidade do instante. A eternidade da palavra. É essa a eternidade que nós amamos. A eternidade aqui e agora. Como disse Nietzsche, este ainda é o tempo do homem pequeno. Do homem da intriga, da mercearia, do hipermercado, da prisão, do rebanho. Nós visamos o homem livre. O homem que segue o seu caminho, que diz não aos ídolos, que diz não ás cadeias, que se opõe ao racionalismo mercantilista, que admira os grandes homens, que é, ele próprio, um espírito livre, que quer construir o Super-Homem. Amamos a Vida, a vida plena, do prazer, das paixões, do sangue na guelra. Amamos as mulheres porque elas nos dão à luz e nos dão a luz. Sim, não estamos cá para agradar à maioria nem para obedecer ás leis da maioria. Por isso não suportamos governos, presidentes, parlamentos. Por isso, rejeitamos a democracia burguesa. A maioria é sempre uma massa imbecil. Os espíritos livres estão fora da maioria. Admitimos, sim, servimo-nos das eleições burguesas como forma de propagandear a nossa mensagem.
O Deus dos cristãos está morto ou, pelo menos, gravemente doente. É o deus-dinheiro que importa matar. Houve um tempo em que o Deus dos cristãos era mais poderoso que o dinheiro. Houve um tempo em que o Deus dos cristãos inspirava o medo e o terror. Esse tempo acabou. Tudo gira em função da economia, do mercado, do deus-dinheiro. A vida que o deus-dinheiro nos dá (ou nos vende) é uma vida de merda, controlada por relógios, trabalhos, hierarquias, contas, percentagens, bancos, trocas. É a essa vida de merda que é preciso dizer não. É preciso dizer não aos bancos e às bolsas. Àqueles que provocaram a crise. Para isso não basta votar no partido x ou no partido y, isso de nada adianta. É necessário que os espíritos se tornem livres. É necessária uma revolução dionisíaca. Com fogo, vidros partidos, ocupações, destruição. Destruir para construir. Destruir para criar. Demos caos ao caos. E depois falaremos do amor no fim, como falou Jim Morrison. É esta a mensagem que queríamos passar. É esta a mensagem que os Telejornais não passam. É esta a mensagem que não nos querem deixar passar. É esta a mensagem que queremos passar. É esta a mensagem. É esta a mensagem.
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