terça-feira, 21 de agosto de 2012
LOUCO DIVINO
Qualquer coisa de diferente. Qualquer coisa que nunca tenha sido escrito. Qualquer coisa de realmente maldito. Homem louco, louco divino, quem te pôs aqui? Porque falas no amor se estás em guerra? Na maior parte do teu tempo na Terra tens ouvido o óbvio, não aprendes nada. Defendes os pobres e os oprimidos? No fundo queres reinos e castelos, como outrora. E tudo te soa a banal. Há e...m ti a Criação de Blake, a embriaguez sem àlcool. Querias um outro mundo. Onde tudo fosse iluminação. No fundo, basta-te comer, beber e ir até Braga. O resto já está em ti, louco divino. Não precisas de deuses. Eles estão em ti. Ouves a música de outrora, da adolescência. Alguns procuram-te, vêm abraçar-te. Mas continuas muito tempo sozinho, louco divino. Eles desconhecem os teus poderes. Excepto quando vais à noite atirar-lhes palavras. Agora estás convencido que desvendaste o enigma da vida. Talvez o tenhas desvendado. Mas há dias em que pareces tão fraco. Tinhas razão, tiveste sempre razão, louco divino. Mesmo quando erraste. A poesia é mesmo a vida, não são floreados. Vives o que escreves, louco divino. E ainda tens uns anos à tua frente.
domingo, 19 de agosto de 2012
O INÍCIO DE UMA NOVA ERA
A verdadeira vida é poética. Rimbaud disse que no mundo da prosa, “a verdadeira vida está ausente”. O estado prosaico é utilitário e funcional e inclui, nas palavras de Edgar Morin, o sobreviver, o ganhar a vida, “o trabalho opressor, monótono, parcelar na ausência ou no recalcamento da afectividade”. É o mundo da economia, do acumular dinheiro, da exploração, dos mercados, do tédio. Em contrapartida, a poesia é celebração, comunhão, embriaguez, dança, canto, música, transe, êxtase, maravilhamento com o belo e, claro, amor. A revolução só pode estar do lado da poesia, do amor, da liberdade, como diziam os surrealistas. É aí que o homem renascido se realiza. Não no sacrifício, não na culpa, não no pecado. Não numa “vida” sem novidade, sem curiosidade, sem descoberta. Não faz sentido vir ao mundo para sofrer, para ser humilhado, para andar deprimido, para pensar constantemente no suicídio. Abracemos a dádiva da vida, construamos um mundo de amor e poesia. Não nos deixemos derrotar pelos cinzentos, pelos pregadores da morte, pelos destruidores da vida. Não trabalhemos mais para eles. Celebremos Dionisos e o homem livre. Quem disse que era impossível? Unamo-nos. O mundo é nosso. Eles não podem roubá-lo mais. Eles não podem destruí-lo mais. Este é o início de uma nova era. Este é o renascimento do homem. Este é o banquete permanente. O homem veio para se ultrapassar, não para andar atrás de migalhas, não para ser escravo de outros homens ou da máquina. O homem veio para se transcender, para abrir novas vias, novos reinos. Amamos profundamente a vida. Queremos gozá-la sem entraves. Eles não podem impedir-nos. Eles não podem roubar-nos a poesia, eles não podem roubar-nos a infância. Construamos um mundo de bondade e de dádiva.
quarta-feira, 15 de agosto de 2012
ARTISTA
Não sou, nunca fui, um operário, um trabalhador, daqueles que se esforçam o tempo todo. Sou antes um artista, aquele que pressente a hora de criar e é capaz de passar horas no café, por exemplo aqui no "Ceuta", onde já vinha aos 18 anos, antes de apanhar a camioneta para Braga. Verdadeiramente raramente me esforcei. Só no 12º ano é que estudei para Matemática. Na Faculdade só estudava às vezes. Só agora estudo verdadeiramente os livros. Só agora sigo o caminho da sabedoria. Talvez puxe um pouco mais pelos olhos. De resro, não me mato a trabalhar. No café, após tomar o café, sinto-me em casa. Isto apesar de, neste momento, não ter um grupo de intelectuais, uma tertúlia, para discutir as minhas ideias. Continuo a achar que as pessoas deveriam desatar a falar com desconhecidos, isso enriqueceria a humanidade.
terça-feira, 7 de agosto de 2012
JOAQUIM CASTRO CALDAS
Foi o Joaquim Castro Caldas que me ensinou a dizer poesia. Foi o Joaquim Castro Caldas que me mostrou aquele jeito rebelde e sarcástico de lidar com as palavras. O Joaquim foi o mentor das noites de poesia no Pinguim quando uma multidão acorria àquele bar no Porto para, simplesmente, ouvir e dizer poesia. O Joaquim foi um dos maiores divulgadores da poesia neste país. E era, também, um excelente poeta. Quando escrevo estas linhas o Joaquim se não está morto deverá estar às portas da morte. Agora é fácil culpar o álcool, as úlceras, a vida que o Joaquim levava. Agora toda a gente vai procurar os escritos que o Joaquim deixou por aí espalhados. O Joaquim Castro Caldas tinha um feitio difícil. Por vezes, parecia arrogante. Mas por detrás dessa aparente arrogância havia uma grande generosidade. A generosidade de quem viu o inferno mas também o céu. A obra do Joaquim não teve o reconhecimento que merecia. Porque o Joaquim era um verdadeiro poeta. Levou uma vida de poeta. Andou pelos bares, procurou a loucura. Não foi um desses versejadores da corte, bem comportadinhos, sempre à cata do prémio. Olha, Joaquim, espero que te safes desta. Senão vai para o céu. Vai para o céu, porque o mereces. "
(António Pedro Ribeiro, 31/08/2008)
segunda-feira, 6 de agosto de 2012
A REVOLUÇÃO DO AMOR E DA POESIA
“O “homo faber” (definido pelo utensílio e pela técnica) é também “homo mythologicus”, ou seja, alimenta mitos e alimenta-se de mitos. O “homo economicus” (interesse, lucro) é também “homo ludens”, fruindo o jogo, os divertimentos, vivendo da estética e da poesia.
O “homo sapiens”, “faber”, “economicus” é um ser unicamente prosaico, cuja vida é toda dedicada ao trabalho, à utilidade e ao lucro. O “homo prosaicus” é, no entanto, também “homo poeticus”, aspirando à poesia da vida, que é intensidade na participação, na comunhão, no amor e que tende para o êxtase.”
(Edgar Morin, “O Método VI- Ética”)
É claro que podemos ir sempre pela via do amor e da poesia. “Viver na prosa é apenas sobreviver. Viver é viver poeticamente”, afirma Edgar Morin. A poesia é um “estado de participação, comunhão, fervor, festa, amizade, amor que abrasa e transfigura a vida”. Traz consigo a participação no mistério do mundo. A racionalidade integra-se numa sabedoria louca, que vem do amor e da poesia. Assim, unidos no amor e na poesia enfrentamos os gigantes da máquina. Porque o que temos entre nós é sagrado, vem de Buda e Jesus. Porque somos êxtase, celebração mas afastamo-nos da barbárie interior já que trabalhamos o “bem pensar”. Porque somos compreensivos. Porque construímos o homem e como diz Montaigne, “não há nada mais belo e mais legítimo do que fazer bem o homem e devidamente”.
É claro que podemos dizer que o amor é a solução. É claro que podemos seguir Ghandi, John Lennon, Nelson Mandela. É claro que podemos falar do amor que une a mãe à criança. É claro que podemos voltar aos 16 anos, aos tempos dos “hippies”, do “peace and love”, do “flower power”. Demos umas curvas mas voltámos ao ponto de partida. Celebremos, comunhemos, dancemos em redor da fogueira. Encantemo-nos com a eterna novidade do mundo. Afastemo-nos da vida prosaica. Amemo-nos. Celebremos o novo homem, poético, criador, altruísta. Façamos a revolução do amor e da poesia.
MANIFESTO POR UMA PÓVOA LIVRE
Quero fazer da Póvoa uma nova Atenas. Quero uma Póvoa de cidadãos livres a discutirem filosofia, política e literatura nas ruas. Quero uma Póvoa com teatro, poesia e outras artes nas ruas. Quero uma Póvoa de gente esclarecida, que não aceita o economicismo de Macedo Vieira e Aires Pereira. Quero uma Póvoa sem desemprego e sem pobreza. Quero uma Póvoa sem caciques locais, sem chicos-espertos a enganar o parceiro do lado. Quero uma Póvoa fraterna, com homens e mulheres livres, fora do controlo da máquina. Quero uma Póvoa cheia de amor e sem capitalismo. Quero uma nova Atenas.
sábado, 4 de agosto de 2012
O JOGO
Dizem que temos de nos adaptar, de ser competitivos, de usar a manha para ultrapassar os outros. Dizem que temos de "vencer na vida". Não estudamos para saber mas para "vencer na vida", para arranjar lugares, para nos encaixarmos no sistema. Somos macacos. Ou queremos mandar nos outros ou então sujeitamo-nos a ser dóceis, tementes a Deus, escravos, lambe-botas, ainda que alimentemos a intriga, a inveja, o boato, a maledicência. Somos mesmo macacos se continuarmos assim. Porque temos de nos sacrificar, de trabalhar tanto, porque corremos sofregamente, porque estamos em guerra permanente, porque pura e simplesmente não gozamos a vida?
Quem manda em nós? Com que direito alguém manda em nós? Que lei é essa? Quem nos representa? Com que direito nos representa? Porque temos de ganhar a vida? De onde vêm essas leis? Onde estão escritas? Isto não passa de um jogo, de um imbecil de um jogo, como dizia Jim Morrison. Porque lhe damos tanta importância? Porque sofremos tanto? Que deus, que demónio, nos atormenta?
sexta-feira, 27 de julho de 2012
MRPP CONTRA MACEDO VIEIRA E AIRES PEREIRA
PCTP-MRPP acusa autarquia de não ajudar Varzim .
Sexta, 27 Julho 2012 17:22 0 Comentários .O PCTP/MRPP emitiu um comunicado em que acusa o presidente da Câmara, Macedo Vieira e o seu vice, Aires Pereira, de deixarem “cair o Varzim na segunda divisão, correndo mesmo o risco de descer aos distritais, completamente afogado em dívidas quando é sabido que a Câmara deve dinheiro ao clube”.
“Um clube histórico como o Varzim, com pergaminhos no futebol português, não se pode deixar afundar assim, sem o mínimo de sensibilidade”, lê-se no comunicado assinado por António Pedro Ribeiro, do PCTP/MRPP, que considera que Macedo Vieira e Aires Pereira “têm uma concepção mercantil e merceeira da política, à semelhança de Passos Coelho e dos patrões do PSD, não prestando apoio a associações com provas dadas na cultura da cidade (e não só...) como o Varazim Teatro”.
“A Câmara da Póvoa não tem uma política sustentável de desenvolvimento nem uma verdadeira política de intervenção cultural, estando ao serviço do lucro e dos grandes interesses económicos, ou seja, do capitalismo dos mercados que vai destruindo o homem e o planeta”, conclui o Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses.
RÁDIO ONDA VIVA
quinta-feira, 26 de julho de 2012
TANTAS VIDAS
TANTAS VIDAS
Porque é que um verso
há-de valer menos
do que um golo?
Porque é que eles
ganham milhões
e tu nada?
Quem te pôs aqui?
Quem te amaldiçoou?
Porque enfrentas as feras?
Porque os insultas na cara?
De que bênção, deque maldição
vens?
Que Zeus, que Jesus, que Maomet?
Porque os vês hoje,
porque te tornas neles,
que demónios tens dentro de ti?
És a hybris, a desmesura
o animal de palco
a puta do rock
Morrison ressuscitado
em Braga
Marlon Brando
no "Apocalipse Now"
horror, horror
tantas noites
tantas vidas...
quarta-feira, 25 de julho de 2012
DA REVOLUÇÃO
Como dizem Guy Debord e Adolfo Luxúria Canibal somos meros espectadores da sociedade-espectáculo. Não entramos no jogo, outros jogam por nós. Assistimos passivamente ao espectáculo dos media e o poder, afinal, aqui tão perto. Como na Grécia e em Espanha lutamos com a polícia para ocupar o parlamento. Eis a acção directa. Para lá da revolução dionisíaca há a acção directa. Não deixemos mais que eles nos espetem a cara na lama como dizia Jim Morrison. Não deixemos mais que eles falem por nós. Não deixemos mais que eles nos representem. Construamos a revolução. A liberdade só pode ser absoluta. Reclamemos as nossas vidas. Aumentemos as nossas vidas, como dizia Henry Miller. Não os deixemos mais fazer a nossa mente. Readquiramos a nossa alma. O melhor governo é não existir governo nenhum ou então que venha um governo de filósofos, de homens e mulheres virtuosos, sábios, íntegros. A democracia burguesa está em decadência, tal como a União Europeia. Derrotemos os pregadores da morte e os arautos da finança. Sejamos de novo homens nobres como Sócrates, Platão, Shakespeare, Nietzsche. Não sejamos mais os cegos governados por imbecis, nas palavras de Shakespeare. Somos homens, mulheres, porra! Não somos macacos. Não temos de passar a vida a obedecer. Revoltemo-nos. Ocupemos a rua. Cerquemos os parlamentos. Ocupemos a televisão. Dinamitemos a bolsa. Acabemos com os mercados e com os credores. Nada devemos a ninguém. Somos livres. Absolutamente livres. Este é o novo dia. O dia do homem destruidor e criador. Esta é a era do espírito. Irmãos, irmãs, cantemos. Não deixemos mais que eles nos imponham uma forma de vida, uma fórmula de vida, um modelo de comportamento. Acreditamos, como Rousseau, na bondade, no bem, no belo. Eles não podem mais destruir a nossa alma, o nosso pensamento, a nossa honra. Caminhemos como deuses sobre a Terra. A era do negócio vai chegar ao fim. Irmãs, estou a falar-vos do amor. Companheiros, companheiras, recuperemos Dionisos e a poesia, derrotemos os cinzentos, os financeiros, os burocratas. Não somos sequer da espécie deles. Tomemos a revolução nas nossas mãos. Rebentemos com os bancos. Queimemos o dinheiro.
terça-feira, 17 de julho de 2012
DERROTEMOS A MÁQUINA
Por muito que aqui na confeitaria se continuem a servir cafés, por muito que haja uma aparente serenidade, o caos e a barbárie estão à porta. O amor perde-se, o amor louco de Breton já quase não existe, já quase não há paixões como as de Ulisses e Penélope, de Romeu e Julieta, o amor é cronometrado, mercantilizado, controlado pelos relógios e pelo trabalho, o amor é aprisionado, escravizado. As relações entre as pessoas são movidas pelo interesse, luta-se por um emprego, por um lugar, por uma promoção, por um tacho. As próprias conversas primam pela falta de imaginação, pela vulgaridade, pela rotina. Fala-se de futebol 24 horas por dia, sete dias por semana. Mexerica-se. E depois "está tudo bem", está sempre tudo bem, sempre a mesma vidinha, o mesmo trabalhinho (quando o há), sempre o recolher a casa, o olhar para a TV, o injectar telejornais, concursos, telenovelas.
Onde está o sol? Onde está o céu? Onde está a beleza dos pássaros? Onde está o homem livre? Certamente que não aqui, Sócrates, tu que pregavas o conhecimento e a virtude. Este é o homem destroçado. Este é o homem que permanece na caverna. Que já nem as sombras discute. Este é o homem morto. Este é o homem que precisa acordar. Regressemos aos xamãs e a Dionisos. Busquemos a alma perdida. Falemos como no princípio do mundo. Homem e mulher. Sozinhos no mundo. Dêmos as mãos. Amemo-nos. Falemos do que vem do espírito. Chamemos as musas. Regressemos ao uno primordial, à poesia. Dancemos em redor da fogueira. Celebremos o novo começo. Celebremos o caos e a revolução. Mas também o amor. A alma que entra em contacto com a beleza. Desliguemo-nos do dinheiro e do capitalismo. Passemos para o outro lado. Sejamos totais. Derrotemos a máquina.
domingo, 15 de julho de 2012
O ÚNICO
O que vêm as pessoas fazer ao mundo? Trabalhar, falar sempre do mesmo, comer, beber, viver no medo do papão que pode ser o chefe, o governo, os mercados. Só as crianças ainda divergem, correm sem uma direcção definida, brincam. De resto, aparte as aparências, anda tudo muito ordenado. Alguns, como Jim Morrison, foram contra a corrente: "ó grão criador dos seres/ concede-nos uma hora mais/ para representarmos as nossas artes/ e completarmos as nossas vidas". De facto, se estamos na vida devemos dignificá-la, devemos completá-la. No fundo, continuamos a ser crianças, agora amigas da sabedoria, da música, da poesia. A rir soberanamente do direitinho, do ordenadinho. A rir na cara dos deuses do capitalismo.
Andar à solta, gozar com o instituído. Ser um ser de luz, um iluminado. Sair dos trilhos. Ser um louco divino como Morrison, como Blake, como Whitman. Ser um actor, não se deixar levar pela televisão nem pela máquina. Ser único, não ser apenas mais um. Ser autêntico, puro, como no nascimento.
sábado, 14 de julho de 2012
O BANQUETE
Segundo Sócrates, trazem-se as crianças ao mundo no sentido de elas alcançarem a sabedoria e a verdade e aperfeiçoarem a sua alma. Ora, a maioria dos pais transmitem aos filhos o valor do sucesso material com uns resquícios de cristianismo. O passar por cima dos outros, o empurrar, o ser "o melhor" à custa dos outro, dissimulados pela moral burguesa, são inculcados na família, na esco...la, no trabalho, nos media. Ao convertermos as crianças às leis do capitalismo vamos destruindo a vida e o sentido da vida, o estar aqui, a eterna curiosidade, o prazer da descoberta. As crianças, salvo as excepções que sempre aparecem, tornam-se adultos competitivos, invejosos, intriguistas, medrosos, quase sem alma. Em suma, vêm ao mundo fazer número, levando uma existência ignorante, entediante, sem novidade, sem amor, sem verdadeira paixão. Quando, no fundo, deveriam vir para se constuirem, para construirem o homem, para partilharem a sabedoria mas também para rirem, para estarem à mesa do grande banquete.
SENHORES SEM ESCRAVOS
Porque não somos espontâneos como quando éramos crianças? Impuseram-nos regras, as necessárias e as não necessárias, começaram a adaptar-nos ao mercado, ao ganhar a vida, estrtagaram o que nós éramos. Alguns de nós, a dada altura, revoltamo-nos. Ouvimos certos discos, lemos certos livros, vimos certos filmes, conhecemos certas pessoas e chegámos à conclusão que a lógica disto está errada. Que o nosso pensamento, que o nosso espírito ultrapassa a prisão imposta pela economia. Claro que depois pagámos um preço. Dificilmente nos adaptaremos a determinado emprego. Dificilmente seremos aceites em determinados círculos. Mas, em contrapartida, somos livres. Quanto aos outros, cumprem a vida. Nascem, trabalham, morrem. Mesmo os seus lazeres são controlados. Não, de facto, não viemos para isto. Viemos para a celebração, para o amor, para a dádiva. Bebemos dos grandes. Vivemos poeticamente mesmo que estejamos deprimidos, tristes, abatidos. Amamos a vida, não a morte em vida. Escrevemos, pintamos, subimos ao palco. Não, não nos atireis a sociedade-espectáculo, não nos enganais com as imagens televisivas, com aqueles que supostamente vivem por nós a nossa vida. Nós estamos para lá. Nós abandonámos o vosso jogo, atirámos a bola fora. Por isso, resistimos. Por isso, seguimos a nossa via. Outros o fizeram no passado. Chamaram-lhes loucos, infames, malditos. Mas nós continuamos aqui. Vivemos o instante. Não aceitamos que nos imponham uma forma de vida. Não aceitamos pagar a vida. Não aceitamos que nos digam o que fazer. Não somos como vós. Não viemos para ser como vós. Somos senhores sem escravos. Renegámos os vossos deuses.
quinta-feira, 12 de julho de 2012
A DÁDIVA E O GANHO
Textos de António Pedro Ribeiro
-----------------------------------------------------
Edição 80, 13 Julho 2012
A DÁDIVA E O GANHO
O pão com queijo que a nossa mãe nos dava na infância, era dado, não ganho. Havia um mundo de descobertas, "um mundo dominado pela magia", como diz Henry Miller. A vida da infância parecia "um universo ilimitado", enquanto que a vida de adulto parece "um reino a diminuir constantemente". Obter o pão passa a ser mais importante do que comê-lo. Perde-se o valor da dádiva, tudo se torna calculado e com um preço. O capitalismo apodera-se das nossas mentes na escola, nos media. "Ninguém dá nada a ninguém", diz-se. Seres humanos passam fome nas ruas. É um mundo cão, com pouca generosidade, com pouca bondade. E a situação tende a agravar-se. Porque é que a vida não é dada como na infância? Porque nos impõem a luta pelo ganho, pela sobrevivência? Porque temos de seguir sempre a mesma via?
----
O MEDO DO MERCEEIRO
Como diz o filósofo José Gil, a poupança, a economia, o apelo ao sacrifício corresponde à "redução do espaço de expansão dos corpos, de investimento afectivo, de liberdade corporal, de espontaneidade do desejo", ao "controlo permanente, à autodisciplina mutiladora da vontade de vida (e da vida da vontade)". Por isso, o capitalismo dos mercados e o discurso e a prática do governo são em si mesmos castradores. Geram cidadãos obedientes, pequenos, cumpridores, sem uma ponta de criatividade ou de excesso. A máquina de propaganda, o "Big Brother" está sempre aí a formatar, a encarreirar os carneiros, com cada vez menos opiniões próprias sobre a coisa pública, limitando-se à vidinha e à contemplação de imagens televisivas. Eis o merceeiro, o homem do medo, do calculismo e das pequenas vantagens. Não foi para isto certamente que nascemos, que a vida nos foi dada, não foi para isto que brincávamos na infância. Não é esta a vontade de vida, a vontade soberana.
www.jornalfraternizar.pt.vu
Subscrever:
Mensagens (Atom)