quarta-feira, 16 de março de 2011

NASCER, TRABALHAR, MORRER


NASCER, TRABALHAR, MORRER

"Nascer, Trabalhar, Morrer". O graffiti na rua de Ceuta. É, de facto, ao que muitos estão condenados e a que muitos desses muitos aceitam ser condenados. "Nascer, Trabalhar, Morrer". Vimos ao mundo, brincamos quatro ou cinco anos, temos quatro ou cinco anos livres, depois vamos para a escola, começamos a ser formatados, começamos a estudar para trabalhar, depois vamos trabalhar, se não o fizermos somos constantemente pressionados a fazê-lo, vivemos em função do trabalho, agora até querem aumentar a idade da reforma. Trabalhar sempre, trabalhar até aos 80 anos, trabalhar até à morte. É isto a "vida" que eles querem que vivamos, trabalhar até à morte, estudar em função do mercado de trabalho, ser competitivo, atinar, assentar, casar ou não, ter filhos, constituir família, ver televisão, ver futebol, envelhecer, sempre a prisão, a maldita prisão, sempre a vida programada, sempre o mesmo filme, mais nada, absolutamente mais nada. "Nascer, Trabalhar, Morrer". "Trabalhar, Obedecer, Morrer". É isto que queres? É esta a vida que queres? De vez em quando deixam-te dar umas curvas, entrar numas festas mas depois, no dia seguinte, tens de estar alinhadinho no emprego, na lei, na parada. Obedeces. Mesmo que refiles, passas a vida a obedecer, a sacrificar-te, a trabalhar para os outros, para o lucro, para a riqueza dos outros. Foi para isto que recebeste a bênção da vida?
Onde está o homem livre? Mostra-me o homem livre. Há poucos. Muito poucos. Muito poucos dançam com Dionisos e Zaratustra. Mas ainda estás a tempo. Desobedece. Não trabalhes. Não aceites migalhas. Vive. Canta. Dança. Goza. Volta aos teus cinco anos quando a vida era só brincadeira. Brinca. Joga. Corre sem direcção definida. Volta a ser aquele que nasce, volta a ser a criança. Sem obrigações nem imposições. Sem castrações. Dança com os deuses e com os palhaços, com as outras crianças. Não há muros. Não há fronteiras. Regressa a ti mesmo, não lhes dês ouvidos, não faças o que eles te dizem para fazer, não te deixes programar, não trabalhes, não morras. Dança.

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AGOSTINHO DA SILVA

Irene Novais 12 de Março de 2011 22:00

O Povo Culto

Os povos serão cultos na medida em que entre eles crescer o número dos que se negam a aceitar qualquer benefício dos que podem; dos que se mantêm sempre vigilantes em defesa dos oprimidos não porque tenham este ou aquele credo político, mas por isso mesmo, porque são oprimidos e neles se quebram as leis da Humanidade e da razão; dos que se levantam, sinceros e corajosos, ante as ordens injustas, não também porque saem de um dos campos em luta, mas por serem injustas; dos que acima de tudo defendem o direito de pensar e de ser digno.

Agostinho da Silva, in 'Diário de Alcestes'

sexta-feira, 11 de março de 2011

A POLÍCIA É UMA DELÍCIA

da "Geração à rasca"
PSP atenta às redes sociais e aos grupos de extrema-direita e extrema-esquerda
10.03.2011 - 19:03 Por Lusa

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« anteriorseguinte »A PSP está a monitorizar todos os movimentos das redes sociais e dos grupos de extrema-direita e esquerda, para acompanhar “a par e passo” o protesto “geração à rasca”, marcado para sábado em 11 cidades.
PSP promete estar atenta na manifestação de sábado ()

Fonte policial disse hoje à agência Lusa que os movimentos nas redes sociais, nomeadamente o Facebook, que se referem ao protesto, estão a ser vigiados, tendo motivado várias reuniões nos vários comandos nos últimos dias.

A fonte indicou que a Polícia de Segurança Pública (PSP) está a preparar-se para acompanhar a manifestação com o mesmo grau de rigor e prontidão que disponibilizou aquando da cimeira da Nato, que decorreu em Lisboa, no final de Novembro passado.

A PSP está com especial atenção ao evoluir da situação que envolve elementos de grupos de extrema-direita e de extrema-esquerda que já manifestaram intenção de se associar ao protesto.

A mesma fonte garantiu que a PSP está a preparar-se para esta manifestação como se de uma "black-bloc" se tratasse, nome dado a uma estratégia de manifestação e protesto anarquista, na qual grupos de afinidade mascarados e vestidos de negro se reúnem.

Entretanto, em resposta a uma pergunta da Lusa, a Direção Nacional da PSP disse que "irá montar um dispositivo que será o menos ostensivo possível e só se existir necessidade é que evolui para outro grau".

Para esta força policial, “o facto de ser uma manifestação ímpar no panorama nacional, cuja génese foram as redes sociais, não a torna diferente das outras manifestações públicas no que ao seu princípio diz respeito”, garantindo “o livre exercício do direito de manifestação a todos os cidadãos (...) como parte integrante da ordem e tranquilidade que se pretende manter”.

Segundo o blogue geracaoenrascada.wordpress.com indica que o protesto vai decorrer em Lisboa, Porto, Braga, Castelo Branco, Coimbra, Faro, Funchal, Guimarães, Leiria, Ponta Delgada e Viseu, tendo uma das organizadoras dito à Lusa que já há mais de 45 mil pessoas prontas a participar.

Contudo, a principal preocupação da Polícia está centrada em Lisboa, onde se aguarda a concentração de milhares de pessoas, a partir das 15:00 de sábado, na Avenida da Liberdade.

Na página do Facebook da iniciativa, o apelo é lançado aos "desempregados, 'quinhentoseuristas' e outros mal remunerados, escravos disfarçados, subcontratados, contratados a prazo, falsos trabalhadores independentes, trabalhadores intermitentes, estagiários, bolseiros, trabalhadores-estudantes, estudantes, mães, pais e filhos”.

O protesto pretende “desencadear uma mudança qualitativa do país” e lutar contra a “situação precária”.

“Protestamos para que todos os responsáveis pela nossa actual situação de incerteza – políticos, empregadores e nós mesmos – actuem em conjunto para uma alteração rápida desta realidade, que se tornou insustentável”, lê-se no manifesto.

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OLHA QUE ESTA!


"A Luta É Alegria", a canção vencedora do Festival da Canção, pode não chegar a tocar na Eurovisão. Os regulamentos do concurso proíbem músicas com letra ou gestos políticos e, em 2009, a canção da Geórgia ficou à porta precisamente por causa disso. Neto, Falâncio e companhia poderão ter o mesmo destino, mas os Homens da Luta já têm solução.

Os regulamentos do Festival Eurovisão da Canção são bem claros. Dizem que não são permitidos "gestos, letras ou discursos de natureza política". Em declarações ao site da "Blitz", Jel afirma que não se trata, à partida, de uma letra política. - Se há uma mensagem política é que a nossa luta é alegria, é contra o desalento, o desânimo, o ressentimento, o conformismo.

A questão é agora saber se os responsáveis da Eurovisão vão partilhar da interpretação de Jel. A canção será avaliada, como todas as outras, na próxima semana. Daí sairá uma decisão. E se "A Luta É Alegria" for proibida de competir em Dusseldorf, na Alemanha, Jel já tem um plano. - Eu vou apanhar o avião e toco à porta. Mais nada, eu, o Falâncio e a malta levamos os tambores e o megafone e tocamos à porta, disse Jel à "Blitz".

quinta-feira, 10 de março de 2011

DANÇA


"Nascer, Trabalhar, Morrer". O graffiti na rua de Ceuta. É, de facto, ao que muitos estão condenados e a que muitos desses muitos aceitam ser condenados. "Nascer, Trabalhar, Morrer". Vimos ao mundo, brincamos quatro ou cinco anos, temos quatro ou cinco anos livres, depois vamos para a escola, começamos a ser formatados, começamos a estudar para trabalhar, depois vamos trabalhar, se não o fizermos somos constantemente pressionados a fazê-lo, vivemos em função do trabalho, agora até querem aumentar a idade da reforma. Trabalhar sempre, trabalhar até aos 80 anos, trabalhar até à morte. É isto a "vida" que eles querem que vivamos, trabalhar até à morte, estudar em função do mercado de trabalho, ser competitivo, atinar, assentar, casar ou não, ter filhos, constituir família, ver televisão, ver futebol, envelhecer, sempre a prisão, a maldita prisão, sempre a vida programada, sempre o mesmo filme, mais nada, absolutamente mais nada. "Nascer, Trabalhar, Morrer". "Trabalhar, Obedecer, Morrer". É isto que queres? É esta a vida que queres? De vez em quando deixam-te dar umas curvas, entrar numas festas mas depois, no dia seguinte, tens de estar alinhadinho no emprego, na lei, na parada. Obedeces. Mesmo que refiles, passas a vida a obedecer, a sacrificar-te, a trabalhar para os outros, para o lucro, para a riqueza dos outros. Foi para isto que recebeste a bênção da vida?
Onde está o homem livre? Mostra-me o homem livre. Há poucos. Muito poucos. Muito poucos dançam com Dionisos e Zaratustra. Mas ainda estás a tempo. Desobedece. Não trabalhes. Não aceites migalhas. Vive. Canta. Dança. Goza. Volta aos teus cinco anos quando a vida era só brincadeira. Brinca. Joga. Corre sem direcção definida. Volta a ser aquele que nasce, volta a ser a criança. Sem obrigações nem imposições. Sem castrações. Dança com os deuses e com os palhaços, com as outras crianças. Não há muros. Não há fronteiras. Regressa a ti mesmo, não lhes dês ouvidos, não faças o que eles te dizem para fazer, não te deixes programar, não trabalhes, não morras. Dança.

quarta-feira, 9 de março de 2011

CAOS, OVAÇÃO


Eis o texto. Eis o texto sobre o homem livre que querias escrever. Divulga-o. Representa-o. Mostra-o ao mundo. Mostras-lhes que não és do relógio nem do trabalho. Mostras-lhes que só fazes sacrifícios em prol da revolução. Que aprendeste a lição de Nietzsche, Morrison, Miller e Rimbaud. És, de facto, o homem livre. Não temas o confronto. Não temas a praça pública. Começa, de facto, a chegar a tua hora. Para lá dos "Homens da Luta", dos Deolinda, da "Geração à Rasca", tu és mais livre, tu podes fazer melhor. Ouve a voz, o teu "gémeo". Começa a encher a Terra de filhos, de companheiros, de companheiras. Ouve o mundo. Lê o mundo como lês os teus livros. Faz-te ao mundo. Usa as conexões. Prega. Atira-te às feras. Sim, agora já te podes atirar às feras. Estás lúcido como nunca estiveste. Estás grávido de Luz e de Sabedoria. És capaz de dar à luz estrelas. Segue. Como ouvias os Pink Floyd aos 14 anos. Interpreta as letras. Segue. Podes derrubar o muro, o Faraó, o Cavaco. Não temas. Não tenhas mais medo. Estás na estrada larga, de Whitman. "We don't need no education".
Olha. Estás no deserto. Voltaste. Estás, de novo, só contigo mesmo. Dialogas contigo mesmo, como Miller aconselhava. O deserto é triste mas como é belo. Como és belo agora. Como voas sobre os homens. Como bebes a sabedoria. Como és aquele que brincava livremente. Segues a caminhada. Avistas os portões. Bates. Um mago abre-te a porta. É Morrison. REconhece-lo. Tocas-lhe os cabelos. Segues os seus passos. Sobes ao palco. És gozado, vaiado. Mas resistes. Gritas. Danças. Enfeitiças. És o xamã. Eles ficam parados. Olham-te. Começam a mexer-se, dançam ao teu ritmo. Recitas suavemente, em harmonia. Depois começas a contar as estórias da infância, da adolescência. Provocas-lhes a aceitação, o sorriso. Caos, harmonia. Caos, renascimento, harmonia. "Quando a música terminar, apaga as luzes/ porque a música é a tua amiga íntima/ dança sobre o fogo se ela te convidar". Estão em transe. Desfazes o transe. O espelho mágico. Caos, ovação.

terça-feira, 8 de março de 2011

EIS O ESTADO SOCIAL

Segurança Social deixou de pagar abono de família a mais de 460 mil pessoas
75 mil pessoas perderam o rendimento mínimo no último ano
08.03.2011 - 07:27 Por João d´Espiney

Em apenas um ano, os serviços da Segurança Social deixaram de pagar o Rendimento Social de Inserção (RSI) a quase 75 mil pessoas e a mais de 29 mil famílias.
Mais afectados: Porto e Lisboa

(Daniel Rocha/ arquivo)

Os dados ontem divulgados pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social revelam que em Janeiro deste ano havia 323.079 pessoas e 126.332 famílias a receber o RSI. Um ano antes, esta prestação social beneficiava 397.873 pessoas e 155.699 famílias.

As quebras ocorreram em todas as regiões, mas foi no Porto - que é o distrito com mais beneficiários desta prestação que sucedeu ao rendimento mínimo garantido - que se registaram as maiores reduções. No final de Janeiro, os serviços da Segurança Social neste distrito pagaram o RSI a 104.636 pessoas e a 44.455 famílias, o que traduz uma diminuição de, respectivamente 26.339 e 12.505 prestações. Os cortes em Lisboa (o segundo distrito em termos absolutos) surgem a larga distância. Em Janeiro, o RSI beneficiava 60.545 pessoas e 27.352 famílias no distrito da capital, ou seja, menos 9876 e 3502, respectivamente.

O valor médio da prestação ascendeu a 88,69 euros, por beneficiário, e a 231,75 euros por família. O valor médio de Janeiro de 2010 não foi divulgado. No primeiro caso, o RSI variou entre o máximo de 93,68 euros, em Beja, e um mínimo de 68,77 nos Açores. Por família, o RSI variou entre os 285,83 euros, em Beja, e os 198,59, em Viana do Castelo.

Os dados ontem divulgados pelo Ministério do Trabalho revelam ainda que em apenas um ano quase meio milhão de portugueses deixou de receber o abono de família. Os números indicam que havia 1.254.461 pessoas a receber esta prestação social no final de Janeiro deste ano, o que representa menos 460.296 abonos do que em igual período de 2010, mês em que a Segurança Social pagou a 1.714.757 beneficiários.

A maior quebra ocorreu em Lisboa, que registou uma redução de quase um terço. Em Janeiro de 2011, o centro distrital da capital processou 255.352 abonos, menos 118.479 do que 12 meses antes. Nos distritos do Porto e de Braga, os cortes atingiram os 88.708 (para 240.299) e os 36.808 (para 124.690) abonos, respectivamente. Em termos mensais, regista-se um decréscimo de 124.615 abonos face a Dezembro do ano passado.

Os dados apontam para a segunda maior quebra verificada nos últimos meses: a primeira grande quebra de 2010 registou-se em Novembro, mês em que perto de 385 mil beneficiários perderam esta regalia social, com a eliminação dos dois últimos escalões da prestação e do pagamento adicional de 25 por cento a famílias com rendimentos mais baixos.

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segunda-feira, 7 de março de 2011

ALGO DE NOVO POR ESTE REINO


A vitória dos "Homens da Luta" no Festival RTP da Canção, a juntar a fenómenos como a canção dos Deolinda, a manifestação de 12 de Março ou os resultados de José Manuel Coelho nas eleições presidenciais provam que, de facto, algo está a mudar também em Portugal. Há um grito novo, satírico, de revolta, se bem que ainda confuso, ainda não totalmente oposto ao capitalismo dos mercados. De qualquer forma, são sinais que não se podem confundir com o mero folclore. Os "Homens da Luta" têm consciência do que estão a fazer. Há muita gente farta do cinzentismo de Sócrates e de Cavaco, de quase toda a classe política, das ordens de Merkel e dos mercados, de uma vida entediante, sem perspectivas, sem emprego, sem dinheiro, precária. Mas há algo mais. É a dignidade do ser humano que está em causa, a própria liberdade. Não podemos ser escravos do trabalho, do chefe, do banco, de coisa nenhuma. Não podemos aceitar ser reduzidos à condição de mercadorias que se compram e vendem no mercado global. Daí as revoluções do Egipto e da Tunísia, as revoltas na Líbia, na Grécia, no Médio Oriente, no Norte de África. O homem, o homem livre, o homem nobre, não pode contentar-se com ser o macaco que mercadeja, na esteira de Nietzsche. A utilização da Internet e do Facebook veio trazer uma proximidade, uma cumplicidade que não existiam entre as pessoas. Há muitas que começam a ficar fartos de "tantos rodeios", das patranhas da competividade e da economia. Há, de facto, algo de novo por este reino.

DIONISOS E O NOVO HOMEM


DIONISOS E O NOVO HOMEM

António Pedro Ribeiro

Pelo mundo inteiro há uma juventude que já não aceita passivamente a redução da vida a uma fórmula única e irreversível. As palavras de Jim Morrison, desaparecido há 40 anos, voltam a fazer sentido perante uma revolta sem líderes, sem hierarquias, não dirigida, convocada pelo Facebook. "We Want the World and We Want it Now!" de "When The Music's Over" é o grito daqueles que já nada têm a perder, daqueles que reclamam o mundo e a vida que lhes têm sido roubados pelos banqueiros, pelos mercados e pelos políticos ao serviço destes e daqueles. No Cairo, em Atenas, mesmo em Lisboa, no Porto ou em Braga, está a nascer um novo homem. Um homem ainda em fase embrionária, o "homo sapiens-demens" de Edgar Morin que volta aos tempos bíblicos, aos ensinamentos dos mestres antigos, de Jesus, de Buda, de Platão, de Sócrates (mesmo não os lendo) mas que, ao mesmo tempo, se serve da Internet, do Facebook, para comunicar e para fazer a revolta. Como diz, Carlos Coelho (Jornal "I", 7/3/2011), curiosamente criador de marcas, "hoje, pela primeira vez na História, existe uma consciência planetária, supraterritorial, supracultural, suprarreligiosa, supra-económica e suprapolítica. Uma gigantesticamente invisível bomba nuclear, constituída pela energia atómica de cada um de nós e que nenhuma arma de guerra convencional conseguirá parar". Há uma consciência que afirma, na esteira de Nietzsche, Morrison e Henry Miller, a própria vida, a vida em si mesma, como valor fulcral- e ao afirmar a vida, afirma também a defesa da natureza, do planeta ameaçado. Um novo homem que se recusa a ser o macaco que mercadeja e rasteja, que está farto do paleio da economia e da competividade, que ama o conhecimento e a beleza. Um homem que não aceita mais esmolas e migalhas- se muitos pedem esmola é porque outros lhes roubaram e roubam o que é seu de direito, a sua própria vida. Um novo homem que sabe que é único e irrepetível, abençoado pela graça do nascimento que não tem preço e, por isso, próximo de Deus ou de ser, ele próprio, um deus. Um homem que está a nascer de novo, que está a tornar-se naquele que é, na criança sábia de Nietzsche. Um homem que é sobretudo Arte, a quem foi confiada a Criação, a quem compete afastar as Trevas dos mercados, do tédio e da ganância e trazer ao mundo o Amor da mulher pela criança. Um novo homem que é também dança, canto, celebração, que não aceita ser escravo de coisa nenhuma, que quer viver, gozar a vida na sua plenitude e não ter a felicidade controlada pelos media ou pelas agências de "rating". Um novo homem, Dionisos talvez.

ROGER WATERS E ISRAEL


Carta aberta de Roger Waters



Em 1980, uma canção que escrevi, "Another Brick in the Wall Part 2", foi proibida pelo governo da África do Sul porque estava a ser usada por crianças negras sul-africanas para reivindicar o seu direito a uma educação igual. Esse governo de apartheid impôs um bloqueio cultural, por assim dizer, sobre algumas canções, incluindo a minha.

Vinte e cinco anos mais tarde, em 2005, crianças palestinianas que participavam num festival na Cisjordânia usaram a canção para protestar contra o muro do apartheid israelita. Elas cantavam: “Não precisamos da ocupação! Não precisamos do muro racista!” Nessa altura, eu não tinha ainda visto com os meus olhos aquilo sobre o que elas estavam a cantar.

Um ano mais tarde, em 2006, fui contratado para actuar em Telavive.

Palestinianos do movimento de boicote académico e cultural a Israel exortaram-me a reconsiderar. Eu já me tinha manifestado contra o muro, mas não tinha a certeza de que um boicote cultural fosse a via certa. Os defensores palestinianos de um boicote pediram-me que visitasse o território palestiniano ocupado para ver o muro com os meus olhos antes de tomar uma decisão. Eu concordei.

Sob a protecção das Nações Unidas, visitei Jerusalém e Belém. Nada podia ter-me preparado para aquilo que vi nesse dia. O muro é um edifício revoltante. Ele é policiado por jovens soldados israelitas que me trataram, observador casual de um outro mundo, com uma agressão cheia de desprezo. Se foi assim comigo, um estrangeiro, imaginem o que deve ser com os palestinianos, com os subproletários, com os portadores de autorizações. Soube então que a minha consciência não me permitiria afastar-me desse muro, do destino dos palestinianos que conheci, pessoas cujas vidas são esmagadas diariamente de mil e uma maneiras pela ocupação de Israel. Em solidariedade, e de alguma forma por impotência, escrevi no muro, naquele dia: “Não precisamos do controlo das ideias”.

Realizando nesse momento que a minha presença num palco de Telavive iria legitimar involuntariamente a opressão que eu estava a testemunhar, cancelei o meu concerto no estádio de futebol de Telavive e mudei-o para Neve Shalom, uma comunidade agrícola dedicada a criar pintainhos e também, admiravelmente, à cooperação entre pessoas de crenças diferentes, onde muçulmanos, cristãos e judeus vivem e trabalham lado a lado em harmonia.

Contra todas as expectativas, ele tornou-se no maior evento musical da curta história de Israel. 60.000 fãs lutaram contra engarrafamentos de trânsito para assistir. Foi extraordinariamente comovente para mim e para a minha banda e, no fim do concerto, fui levado a exortar os jovens que ali estavam agrupados a exigirem ao seu governo que tentasse chegar à paz com os seus vizinhos e que respeitasse os direitos civis dos palestinianos que vivem em Israel.

Infelizmente, nos anos que se seguiram, o governo israelita não fez nenhuma tentativa para implementar legislação que garanta aos árabes israelitas direitos civis iguais aos que têm os judeus israelitas, e o muro cresceu, inexoravelmente, anexando cada vez mais da faixa ocidental.

Aprendi nesse dia de 2006 em Belém alguma coisa do que significa viver sob ocupação, encarcerado por trás de um muro. Significa que um agricultor palestiniano tem de ver oliveiras centenárias ser arrancadas. Significa que um estudante palestiniano não pode ir para a escola porque o checkpoint está fechado. Significa que uma mulher pode dar à luz num carro, porque o soldado não a deixará passar até ao hospital que está a dez minutos de estrada. Significa que um artista palestiniano não pode viajar ao estrangeiro para exibir o seu trabalho ou para mostrar um filme num festival internacional.

Para a população de Gaza, fechada numa prisão virtual por trás do muro do bloqueio ilegal de Israel, significa outra série de injustiças. Significa que as crianças vão para a cama com fome, muitas delas malnutridas cronicamente. Significa que pais e mães, impedidos de trabalhar numa economia dizimada, não têm meios de sustentar as suas famílias. Significa que estudantes universitários com bolsas para estudar no estrangeiro têm de ver uma oportunidade escapar porque não são autorizados a viajar.

Na minha opinião, o controlo repugnante e draconiano que Israel exerce sobre os palestinianos de Gaza cercados e os palestinianos da Cisjordânia ocupada (incluindo Jerusalém oriental), assim como a sua negação dos direitos dos refugiados de regressar às suas casas em Israel, exige que as pessoas com sentido de justiça em todo o mundo apoiem os palestinianos na sua resistência civil, não violenta.

Onde os governos se recusam a actuar, as pessoas devem fazê-lo, com os meios pacíficos que tiverem à sua disposição. Para alguns, isto significou juntar-se à Marcha da Liberdade de Gaza; para outros, isto significou juntar-se à flotilha humanitária que tentou levar até Gaza a muito necessitada ajuda humanitária.

Para mim, isso significa declarar a minha intenção de me manter solidário, não só com o povo da Palestina, mas também com os muitos milhares de israelitas que discordam das políticas racistas e coloniais dos seus governos, juntando-me à campanha de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) contra Israel, até que este satisfaça três direitos humanos básicos exigidos na lei internacional.

1. Pondo fim à ocupação e à colonização de todas as terras árabes [ocupadas desde 1967] e desmantelando o muro;

2. Reconhecendo os direitos fundamentais dos cidadãos árabo-palestinianos de Israel em plena igualdade; e

3. Respeitando, protegendo e promovendo os direitos dos refugiados palestinianos de regressar às suas casas e propriedades como estipulado na resolução 194 das NU.

A minha convicção nasceu da ideia de que todas as pessoas merecem direitos humanos básicos. A minha posição não é antisemita. Isto não é um ataque ao povo de Israel. Isto é, no entanto, um apelo aos meus colegas da indústria da música e também a artistas de outras áreas para que se juntem ao boicote cultural.

Os artistas tiveram razão de recusar-se a actuar na estação de Sun City na África do Sul até que o apartheid caísse e que brancos e negros gozassem dos mesmos direitos. E nós temos razão de recusar actuar em Israel até que venha o dia – e esse dia virá seguramente – em que o muro da ocupação caia e os palestinianos vivam ao lado dos israelitas em paz, liberdade, justiça e dignidade, que todos eles merecem.

AI, OS MERCADOS!

A margem de erro é nula
Portugal está sob ameaça dos mercados e enfrenta semana de todos os riscos
07.03.2011 - 07:17 Por Sérgio Aníbal

1 de 11 notícias em Economia
seguinte »Desde que, no início de 2010, começou a crise da dívida soberana do euro, o Governo português não tem tido semanas fáceis. Mas a que agora começa promete ser particularmente difícil.
José Sócrates com Angela Merkel em Berlim, no dia 2 de Março

(John MacDougall/AFP)

Nos últimos meses, descidas de rating, contágio de outros países, sinais de abrandamento da economia, indecisões dos líderes políticos europeus, tudo tem contribuído para que se mantenha, praticamente sem tempo para descanso, a pressão constante dos mercados sobre Portugal e a sua dívida pública. O problema é que todos estes ingredientes poderão estar presentes, em simultâneo, durante os próximos dias, fazendo desta semana, uma autêntica semana de todos os riscos.

A começar, logo em primeiro lugar, pelo que aconteceu no final da semana passada, ou seja, o pré-anúncio de uma subida de taxas na zona euro feito na passada quinta-feira por Jean-Claude Trichet, o presidente do BCE. Na sexta-feira, os mercados já reagiram a esta notícia - que pode tornar ainda mais difícil aos países periféricos da Europa escaparem a uma recessão - com uma subida das taxas de juro das obrigações. Durante a semana que agora começa, este fantasma deverá continuar a estar presente na mente dos investidores. David Owen, um analista na firma de investimento da Citi, Jefferies International, afirmava sexta-feira à Bloomberg que um cenário de subida das taxas de juro do BCE tornava quase certa a necessidade de Portugal ter de vir a recorrer ao fundo de emergência europeu.

Depois, a partir de quarta-feira, logo a seguir ao Carnaval, tem início uma série de acontecimentos que podem, em maior ou menor grau, ser motivo de preocupação dos investidores, provocando por isso mais instabilidade nos mercados.

Logo nesse dia, o Estado português realiza mais uma emissão de dívida pública a médio prazo. Serão colocadas obrigações de Tesouro com amortização agendada para daqui a dois anos e meio, num valor que o Instituto de Gestão da Tesouraria e do crédito Público pretende que esteja situado entre 750 e 1000 milhões de euros. Será mais um teste à capacidade de Portugal para conseguir angariar investidores que queiram emprestar-lhe dinheiro, principalmente a prazos mais longos.

Até agora, o país tem conseguido encontrar procura para as suas emissões de dívida, mas à custa de taxas de juro progressivamente mais altas. Vários analistas questionam a sustentabilidade de uma estratégia orçamental que tem de suportar custos de financiamento tão elevados.

Política, em casa e na UE

Também quarta-feira, Cavaco Silva toma posse, um momento para relembrar que a estabilidade política em Portugal está longe de estar assegurada. Esse momento, em combinação com uma moção de censura ao Governo condenada ao fracasso no dia seguinte, deverá ser seguido com atenção por aqueles que temem que, a uma crise orçamental e económica, Portugal possa ainda juntar uma grave crise política. Em particular, todos os sinais dados pelo presidente da República e pelo maior partido da oposição vão estar, durante estas semana, sob os radares dos mercados.

Mas é na sexta-feira que chega o momento mais decisivo, a realização da cimeira extraordinária de chefes de Estado da zona euro em Bruxelas. O encontro destina-se a que a Europa encontre uma solução institucional que garanta que os países em dificuldades consigam, com menos problemas, recorrer às fontes de financiamento necessárias até ultrapassarem a crise. O problema é que o entendimento ainda não está alcançado. E uma coisa é certa, qualquer sinal - no dia da cimeira ou em dias anteriores - de que uma solução poderá não ser encontrada será motivo para os mercados penalizarem fortemente os países que são considerados como aqueles que mais precisam de ajuda. Nesse aspecto, Portugal continua na linha da frente.

Em ocasiões anteriores, as indecisões de política europeia foram motivo para reacções bruscas dos mercados. Em Maio de 2010, nas vésperas de um encontro de líderes europeus destinado a acertar o pacote de ajuda para a Grécia, os rumores de desentendimento levaram as taxas de juros da dívida pública portuguesa, irlandesa e espanhola a dispararem, forçando a UE a tomar decisões sob pressão.

Sócrates e Teixeira dos Santos têm repetido nos últimos dias a ideia de que é preciso uma solução europeia para que a pressão sobre Portugal se reduza, parecendo temer que algo de semelhante ao que aconteceu na cimeira de Maio aconteça agora.

Desconfiança permanece

Para tentar sobreviver a esta semana de todos os riscos, o Governo não está a poupar esforços para tentar dar todas as boas notícias que pode aos mercados e aos seus parceiros europeus. Logo nos primeiros dias deste mês, deu a conhecer números preliminares da execução orçamental de Fevereiro que apontam para uma redução da despesa face ao ano anterior. Sócrates levou estes números a Berlim como forma de tentar convencer Angela Merkel de que os esforços de consolidação estão a dar resultado.

De igual modo, no final da semana passada, o Governo decidiu pedir a sindicatos e patrões que assinassem um documento em que se comprometem a continuar as negociações destinadas a promover reformas no mercado de trabalho, uma das exigências mais repetidas pelos seus parceiros europeus. O compromisso dos parceiros sociais será levado por Sócrates a Bruxelas.

Para já, este tipo de boas notícias não tem sido suficiente para eliminar as desconfianças. As taxas de juro das obrigações de tesouro começam a semana coladas aos máximos. As agências de rating continuam a ameaçar com novos cortes na classificação atribuída a Portugal (avisando mesmo que este acontecerá quer não haja acordo na UE, quer haja um acordo que não satisfaça os investidores). E os próprios responsáveis europeus continuam a ter dúvidas em relação a Portugal. Ontem, Klaus Regling, o presidente do fundo de resgate europeu, disse que não esperava ter que dar mais ajuda a nenhum outro país da zona euro. Mas logo a seguir fez uma distinção entre Espanha e Portugal. "Já não vejo qualquer necessidade de ajudar a Espanha", disse, acrescentando que "Portugal ainda tem que fazer algum trabalho". Todas estas desconfianças fazem com que, para Portugal, não haja espaço de manobra para que, numa semana com tantos riscos, alguma coisa corra mal.

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domingo, 6 de março de 2011

ALGO ESTÁ MESMO A MUDAR TAMBÉM NESTE PAÍS


Votos do “povo” dão vitória aos Homens da Luta no Festival RTP da Canção
06.03.2011 - 12:42 Por Hugo Torres

Os Homens da Luta vão a Düsseldorf, na Alemanha, cantar “contra a reacção”. O “povo” que assistiu de casa ao Festival RTP da Canção escolheu Luta é alegria para representar Portugal na primeira semifinal do Festival da Eurovisão, a 10 de Maio. Os votos por telefone contrariaram o júri e quem estava no Teatro Camões.
Homens da Luta vão cantar à Alemanha “contra a reacção” (Foto: João Cortesão/nFactos/arquivo)

São os barcos de Lisboa, canção de Carlos Massa interpretada por Nuno Norte, seria a vencedora da noite, se a decisão coubesse apenas aos jurados dos 18 distritos do país, e ainda dos Açores e da Madeira. No entanto, o peso da opinião dos telespectadores na escolha final (metade) foi fundamental para a vitória da dupla de humoristas.

Os Homens da Luta foram os preferidos de 26 por cento dos votantes por telefone, muito à frente de Rui Andrade, o segundo mais votado, que obteve 12 por cento. “Quero agradecer a todo o povo que votou em nós, pá. Gastou 60 cêntimos mais IVA para dar a taça aos Homens da Luta. Camaradas! A taça é do povo, pá”, atirou Jel, antes da actuação que fechou a emissão, contra as vaias da plateia.

A escolha desagradou ao público que marcou presença no Teatro Camões, em Lisboa, ontem à noite. Metade da plateia esvaziou mal os Homens da Luta foram anunciados como os representantes portugueses no Festival da Eurovisão deste ano. Os que ficaram encheram a sala com apupos, abafando as parcas palmas que se ouviram.

“Camaradas, pá, a todos aqueles que gostam muito obrigado, a todos aqueles que não gostam mais obrigado ainda, camaradas, pá! A luta é alegria, pá! É alegria, camaradas, pá! E nós vamos à Alemanha mostrar isso, que Portugal não é só fado, pá”, reagiu Jel, que dá voz aos Homens da Luta encarnando uma personagem, Neto.

Vasco Duarte, que de guitarra em punho responde pelo nome de Falâncio, também respondeu à plateia descontente com a reviravolta no resultado: “O que nos interessa sempre, camaradas, é o voto do público. E povo sabe que os Homens da Luta estão sempre com ele. Viva o povo! Vivam os Homens da Luta! Viva a luta em Portugal, camaradas!”

Os Homens da Luta exploram a música como espaço de intervenção, mas também como forma de caricaturar um anacronismo que reconhecem nessa forma de reivindicação. Atiram para os dois lados. Mas Vasco Duarte, que escreveu a letra desta canção, fez cara séria para a dedicatória: “A música dos Homens da Luta é dedicada ao povo. E àqueles que estão desempregados e passam mal no nosso país.”

Luta é alegria estava a concurso com mais 11 canções. Na Alemanha estará entre 19, na primeira noite da edição deste ano da Eurovisão. É mais uma etapa que os Homens da Luta terão de passar, se quiserem estar na final de Düsseldorf, a 14 de Maio. A segunda semifinal acontecerá a 12 do mesmo mês.

sexta-feira, 4 de março de 2011

ESCREVER

Escrever. Escrever por escrever. Escrever por ser um esctitor. Escrever para ser considerado escritor. Admirado pelos media e pelo público. Ou então, pura e simplesmente escrever. Escrever para a gaveta ou para o blogue que 4 ou 5 lêem. Permanecer no anonimato. Pura e simplesmente, escrever à mesa do café. Ser o homem à mesa. Matar o tempo com a escrita. As pessoas em redor. Os carros em frente. Escrever e estar ausente. Não ter profissão remunerada que se conheça. Escrever, simplesmente escrever. Como nos sonhos dos 16 anos. Agora melhor. Escrever pelo mundo, pela vida. Os amigos que nos falam ao telemóvel. Que ainda se lembram de nós. Escrever o livro que pensamos que responde aos enigmas do homem, que ainda está por escrever. Escrever contra os mercados e contra a bolsa. Escrever e estar aqui. Lembrar-me de ti que permaneces na escola. Escrever e fazer a hora, o agora que é estar aqui. Escrever e deixar filhos, sementes espalhadas no papel, no mundo. Escrever e ir atrás da loucura. Os amigos que fazem falta. As conversas sobre literatura. O destino do homem. Escrever e andar à solta. Percorrer os dias, vencer a amargura. Escrever e ser o sangue da Terra. Andar em guerra. Ser o escritor da demanda. Escrever e ser aquele que anda.

quinta-feira, 3 de março de 2011

NO BANCO DO JARDIM (SEM UM TOSTÃO NO BOLSO)

Andar pela cidade
sem um tostão no bolso
escrever nos bancos de jardim
como o Alba
vadiar como o Lousa
ouvir os pássaros
os velhos
permanecer na Avenida
as mulheres que passam
as crianças
de regresso da escola
a vida que todos levam
sempre ordenada
com horários
e contratos
e eu aqui
diferente do mundo
até podia pedir esmola
se não estivesse
em casa da Gotucha
mas como diz o padre Mário
não devemos pedir esmola
ela tem-nos sido roubada
tudo a que temos direito
nos tem sido roubado
pelos mercadores
pelos predadores da vida

são 5,30
e eu permaneço sentado
no banco da Avenida
uma pomba vem ter comigo
ainda me é permitido
ficar aqui
sou poeta e vadio
como Agostinho da Silva
o Teixeira Moita
que me telefona
a Isabel
que me adiciona
e eu aqui sentado
no banco da Avenida
como o Alba
como o Lousa
à espera que caim notas
do céu
para gastar em livros
e em cerveja
a "Centésima Página" em frente
está lá o "Saloon"
mas poucos o compram
ainda não sou uma estrela
mas hoje vim até à Avenida
sem um tostão no bolso
sentei-me no banco de jardim
e comecei a escrever
não estou a perturbar
a oredem pública
isso vai ser
no dia 26
nos Aliados
se houver gente
os meus pais,
sobretudo a minha mãe,
não esperava
que eu saísse assim
como o Joaquim
como o Alba
como o Lousa
nada a fazer,
minha rica,
o menino é assim
deu-lhe para a escrita
é pensamento
e passa-o para o papel
não consegue deixar de pensar
a tropa dos caloiros
e dos doutores
passa à sua frente
as crianças brincam
livres
o sino toca
o sol ainda
e eu
sem um tostão no bolso
no banco da Avenida.

Braga, 2.3.2011

quarta-feira, 2 de março de 2011

GRAÇA

Dar à luz o poema
como as mães
parem os filhos
ser eu próprio Deus
a Criação, a alegria
acordar de madrugada
andar pela cidade
celebrar o dia
voltar à criança
à terra
a Zaratustra
dançar na abundância
no sol
no coração
na ternura

eterno retorno
graça
sabedoria.


Braga, 2.3.2011