quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Não escrevo poesia como escrevia. Tornei-me muito prosaico. É claro que esta prosa poderia vir em forma de poema. É claro que posso cantar a miúda da "Padeirinha". Poderia talvez fazer um estudo sistemático de alguns livros que leio. Como este "Gigantes e Anões" de Allan Bloom. Poderia escrever ensaios. Posso ainda escrever muita coisa. Em princípio, ainda cá estarei mais uns anos. E, sinceramente, não me julgo um escritor menor. Há algum tipo de poesia que já me irrita, que não me diz nada. Continuo a achar que tenho textos menores mas também sou capaz do melhor.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

NOTA DE 20

Se eu tivesse uma nota de 20
ia até ao Porto
e apanhava uma bebedeira.

POESIA "VERSUS" PROSA


Ultimamente, nos dois últimos anos, é-me mais fácil escrever em prosa do que em poesia. Penso até que os meus últimos textos em prosa são superiores aos poemas. A própria poesia é prosaica. A poesia exige um ritmo, uma cadência, às vezes basta uma palavra ou um verso para alterar tudo. Dá-me mais trabalho. A prosa sai mais fluída. Começo a ser mais o escritor do que o poeta. Mesmo que não escreva romances nem coisa que se pareça.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

DOS GRANDES LIVROS

Nem todos os livros me entusiasmam como o "Assim Falava Zaratustra" de Nietzsche, que li pela sexta vez, ou o "Siddhartha" de Hermann Hesse. Esses livros e outros geram a fome de leitura e de conhecimento. Cada página que lemos é uma nova aventura. O leitor torna-se também um criador, julga-se capaz de alterar o curso da vida. A própria vida circundante torna-se mais viva. Tudo é curiosidade, vontade, descoberta. O homem é livre, nobre, sem tesoureiros nem contabilistas.

ESCREVER E SER QUEM SOU





Escrever qualquer coisa para me tornar uma estrela. Escrever para a fama, para a glória. Mesmo continuando a ser maldito. Mesmo continuando a ser "Persona Non Grata". Escrever com objectivos, com sede de conquista. Escrever para que o público me ouça. Escrever sobre tudo e mais alguma coisa. Escrever para aparecer nas revistas cor-de-rosa, nos programas da tarde e dizer frases incendiárias. Escrever que vem aí a barbárie e que se vão desfazer os laços que ainda existem entre as pessoas. Escrever para rebentar com isto tudo e ser, ao mesmo tempo, o poeta da moda. Escrever contra a moeda e receber moeda. Oferecer uns textos ás gajas e desencaminhá-las. Escrever e ser o maior, autor de dez livros, performer provocador. Escrever e continuar a ser quem sou. Escrever e aparecer nos colóquios, nas conferências, mandar umas bocas, partir a loiça toda. Escrever e enfrentar o poder, maldizer a populaça. Escrever e conquistar o mundo. Escrever e ser quem sou.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

A VIDA LIVRE


Espetam-nos com a publicidade
com a felicidade fabricada
tentam fazer-nos a mente
com programas imbecis
e notícias manipuladas
e um homem resiste
tem que resistir
mesmo que esteja só à mesa
sobretudo se está só á mesa
sem amigos, sem amigas
só com a sua criação
sim, ainda é capaz de criar
de arrancar palavras
de as espetar na folha
não cede à Júlia Pinheiro
mas a propaganda insiste
mais e mais

tem ido pouca gente
á Poesia de Choque
mas o poeta sabe
que esta é a sua hora
que mais tarde ou mais cedo
hão-de bater à sua porta
porque é um não-alinhado
mas os gritos continuam
a vir da televisão
é uma tortura
o poeta nem sempre
consegue estar acima
das vozes irritantes
mas hoje é diferente
o poeta supera-se
vai buscar-se
é espírito e coração
está muito para lá
do ruído
constrói-se
constrói em si
o homem
sem preconceitos
apetece-lhe berrar
desafiar a castração

paz e harmonia,
dizem eles
tratam-nos como atrasados mentais
destroem as possibilidades de criação
filhos da puta!
Ide-vos embora
da minha mente
sei bem o que quereis
quereis-me domesticado,
deprimido
mas eu hoje
sou mais forte
não embarco nas vossas conversas
ide-vos!
Conheço-vos, ó psicólogas,
quereis-me num trabalhinho,
adaptado,
de volta à máquina
incapaz de incendiar
de ser esse
que descobri aos 17 anos

sois mesmo execráveis
com as vossas falinhas mansas,
ó barbies televisivas
não me levais
mesmo que esteja
só contra o mundo
como agora
falas demais, ó coquete,
irritas-me

sou um homem
penso,
sonho,
invento
não dareis cabo de mim
tenho em mim a liberdade
não aceito o modelo único
no fundo,
a partir de certa altura,
desconfiei de vós,
ó macacos e macacas,
não tenho de ser igual a vós
afastai-vos
eu amo a vida
não a vossa vida
mas a vida livre

sois pequenos
sois das meias-medidas
não sou vosso
sou de uma nova espécie
venho de uma estrela diferente
bebo dos grandes
sois tão pequenos
tão dóceis, tão obedientes
tão da máquina
não vos amo
nem sequer invejo
certos poetas, certos escritores
que ganham prémios
e vão aos colóquios
são aliados dos economistas
e da felicidade da maioria
não, não me arrependo
do meu percurso
dos meus filmes
da minha loucura
afrontei os poderes
algumas vezes
não me arrependo
não me comprais
com os vossos prémios
não me atireis
as vossas bonecas
posso estar só
mas estou mais lúcido
do que nunca
as palavras vão surgindo
cavalgam na minha mente
como te compreendo, Gotucha
como odeio os que te maltratam
eu não segui a via do suicídio,
caro Rui Costa,
porque ainda acredito na vida
numa outra vida aqui
numa vida plena
de curiosidade e sabedoria
passo os dias a ler
enriqueço-me
afastai de mim
os gráficos e as percentagens!
Falo uma linguagem diferente
da dos economistas
não sou apenas eu, claro,
há Eduardo Lourenço, há Manuel António Pina

este é mais um daqueles épicos
que nunca mais acabam
lá vêm eles
com as notícias
lá tentam eles uma vez mais
não me levais
sou da vida livre.


Vilar do Pinheiro, "Sonhos de Verão", 24.2.2012

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

NOBRE


Que tenho sido
depois dos 17, 18 anos?
Li Platão, Marx, Nietzsche,
os anarquistas
conheci alguns homens brilhantes
outros vulgares
conheci gente de coração
e gente sem alma
que deixo ao mundo?
Dez livros
umas performances poéticas
outras políticas
hoje, aos 43 anos,
sinto-me um senhor
contribuo para a evolução da espécie
sei perfeitamente o que não quero
apesar de, a espaços,
me deixar levar pelos media
pela ilusão do estrelato
desenvolvi as minhas potencialidades
sou capaz de as passar para o papel
tenho a minha loucura
e ainda bem que a tenho
sinto-me atraído por algumas mulheres
desejo-as
já passei a fase dos preconceitos
sei com quem quero estar
e onde quero estar
cometi erros
tive de cometê-los
andei em busca
durante anos, décadas
encontrei alguns paraísos
sou diferente daquele que era
não sou um bárbaro
mas sinto-me atraído pelo caos
isso distingue-me de outros poetas
estaria bem na Grécia antiga
apesar de tudo,
acredito na verdade e na virtude
não suporto os economistas
construí-me
sou este que sou
conheço o amor
mas sou capaz do ódio
embora hoje não esteja
para aí virado
passeio-me entre os homens
como entre os animais
sei ser cínico
como Diógenes
falo com a vida
discuto o sentido dela
sou um homem nobre.

Vilar do Pinheiro, "Pinha Doce", 19.2.2012

AS PROFUNDEZAS DO EU







As grandes questões, de onde vimos, para onde vamos, porque estamos aqui, qual o sentido da vida, são aquelas que verdadeiramente me preocupam. Não as questões menores, o lixo televisivo, os futebóis, a economia. Acredito sinceramente que tenho uma alma que me faz aproximar do amor, do belo, da liberdade, da sabedoria. É isso que me faz procurar, é a busca do Santo Graal, do sagrado perdido, da idade do ouro, da iluminação. Acredito que o homem, alguns homens, podem ser santos, criadores, espíritos livres. Seria ridículo que fossem mercado e economia. O homem nobre quer libertar-se de tudo isso. Quer ir até às profundezas do eu.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

A VIDA DO BURGUÊS


Esta é a sociedade do burguês, da gentinha, do homem pequeno, do "ser diminuído e materialista, sem grandeza ou beleza de alma", do homem do cálculo e do interesse, como escreve Allan Bloom em "A Cultura Inculta". O burguês preocupa-se apenas com a sua conservação e o seu conforto, não tem ideais nem grandes paixões, "vive" no mercado sem explosões, sem gestos de loucura, sem arte, sem nada de edificante ou inspirador. Quando muito foi criativo na infância ou na juventude mas depressa as perdeu por força da máquina de propaganda ou da ideologia dominante que o empurram para o trabalho duro, para a castração do desejo, para a normalidade. A sua "vida" é feita de tédio, de rotinas, do sentar-se em frente à TV a beber programas imbecis ou de propaganda ao capitalismo. Ou seja, a partir de certa altura, é uma vivência de acomodação ao lar familiar, do voto nos partidos do sistema, sem qualquer intervenção na vida pública, sem um rasgo, sem uma elevação, sem uma conversa superior, sem poesia. Em suma, uma grande seca.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

A FOME DE CONHECIMENTO E A FALTA DE ALMA




A fome de leitura, a fome de conhecimento e aprendizagem, o pensamento em movimento. Assemelham-se ao desejo sexual, dão-nos o entusiasmo, a paixão pela vida, conduzem-nos ao conhecimento de nós mesmos e do mundo. Daí o homem nobre, criador, oposto à democracia burguesa e à felicidade da maioria, ao homem do tédio, dos fins vulgares e comuns. Nota-se nas conversas do homem comum: futebol, mexericos, banalidades e preconceitos. Nada de profundo, nada que questione a vida e o sentido da vida. Macacos que competem uns com os outros em busca da banana, do lugar, do dinheiro. Nada de elevado, nada de criativo, só carneiros que obedecem à máquina, que não se distinguem uns dos outros. Nenhuma curiosidade pelo diferente, nenhum sentido da descoberta, uma vidinha de rotina, sem novidades, sem criação, sem romantismo. Nunca o gesto ousado de dar a flor, de dar o poema, do amor incondicional, absoluto, nunca o belo, nunca o bem, nunca a verdade. "O seu eros imperfeito não pode dar-lhe à alma imagens de beleza e continuará a ser fraco e grosseiro", escreve Allan Bloom em "A Cultura Inculta". Em suma, falta-lhes alma, o espírito livre de quem "faz da vida um contínuo experimentar-se de si próprio", nas palavras de Nietzsche.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

A MANIPULAÇÃO DIÁRIA


MANIPULAÇÃO DIÁRIA

Eles manipulam continuamente. A ordem das notícias do telejornal não é neutra. Os crimes, o futebol várias vezes abrem os noticiários, misturam-se propositadamente com os grandes problemas do mundo e do país, de forma a que a nossa atenção se disperse. Infantiliza-se o espectador. Os comentadores do regime educam-nos. Nada é por acaso. Tudo para nos fazer a cabeça, para nos impingir o medo, para legitimar o capitalismo e a própria máquina de propaganda. Para nos manter apáticos, conformistas, obedientes. É uma batalha diária que temos de travar. Não nos deixemos adormecer.

O NOVO TEMPO


Atenas arde. Os partidos de esquerda e de extrema-esquerda podem ganhar as eleições na Grécia. As imposições do imperialismo alemão, da União Europeia e do FMI podem cair por terra. A liberdade está a passar por aqui. A revolução também. Tremem os estrategas da máquina e dos mercados, tremem os comentaristas do regime na televisão. O vosso capitalismo começa a desmoronar-se. Tremei, vociferai, esbracejai, ó guardiães da ordem estabelecida. Este é o nosso tempo. O vosso está a chegar ao fim.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

DA COMPETIÇÃO


A competição, eis a questão. Temos de ser competitivos, dizem. Temos de nos guerrear, de lutar uns com os outros para conseguir um emprego, um cargo, uma posição de poder. Temos de trepar uns para cima dos outros como macacos para nos safarmos na vida. Ora, no fundo, tudo isso é ridículo, tudo isso é capitalismo. No fundo, nunca alinhei nessa engrenagem. Participar em concursos para derrotar o meu semelhante. Não, não sou daí. Vim ao mundo para desenvolver a minha personalidade livremente, vim ao mundo para me tornar naquele que sou.

QUEREMOS OUTRO MUNDO!


QUEREMOS OUTRO MUNDO!



Aumentam os transportes, vão-se os subsídios, o desemprego dispara. Aumentam também as situações de pobreza e miséria. Grande parte da classe média está proletarizada. É esta a política de Passos Coelho e da troika. Para além disso, esses senhores que servem os mercados vendem-nos uma "vida" desinteressante, entediante, repetitiva, onde as relações entre as pessoas obedecem às leis do ganho, do interesse, da economia. A macacos trepadores, como diz Nietzsche, a macacos que trepam uns por cima dos outros em busca do dinheiro, do lugar, do poder, eis ao que os governantes e os pregadores da morte nos querem reduzir. Aumentam igualmente os casos de depressão e de suicídio. O gozo, a alegria são muitas vezes artificiais, passageiros. Que mundo nos trouxe o triunfo da tecnologia? O mundo da máquina, da repressão do desejo, da castração, da felicidade fabricada. O mundo assim não presta. Queremos outro!

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VIVO



Escrevo para me manter vivo. Outros vivem da família, do trabalho. Eu vivo da escrita. Cada nova frase é um sopro de vida. Um triunfo contra a morte e a depressão. Sim, meus amigos, aqui na confeitaria travo batalhas épicas. Tomo dois cafés, gasto a caneta vermelha. Estou vivo, porra! Ainda não é desta que me derrotais, ó arautos da propaganda. A tinta vermelha no papel faz-me renascer.
Levanto a cabeça. A D. Rosa lê. A menina da confeitaria arruma a loiça. As famílias trazem as crianças. Sou, de novo, capaz de cometer loucuras. Estou vivo, porra! Afastai-vos de mim, ó demónios! Sou espírito e corpo. Penso. Há bondade na D. Rosa, nas gentes simples. Simplesmente segui outra via. Às vezes a mente bloqueia. O raciocínio não flui. Mas depois volta. Cavalga. Abre portas.

www.jornalfraternizar.pt.vu

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

O NOVO HOMEM




Olhai, meus irmãos, eis a grande mercearia dos homens pequenos. Não vos deixeis contaminar. Não escuteis os profetas do grande cansaço que dizem: "tudo é igual, o mundo não tem sentido, o saber sufoca". Não escuteis aqueles que pregam a resignação e o sacrifício. Todos eles fazem parte da tribo dos macacos que trepam uns por cima dos outros em busca do poder, do dinheiro, da influência. Olhai como todos eles são sujos, como enterram a cara na lama. Zaratustra vem anunciar o novo homem, o super-homem que reinará sobre a Terra, aquele que cria, dança e ri. Meus irmãos, a era da mercearia e dos mercados está a chegar ao fim. O homem novo libertar-se-á de todas as correntes. O homem novo vai derrubar a máquina. Escutai a voz dele nas ruas de Atenas.

SOLITÁRIO
















Solitário,
Zaratustra acompanha-te
no caminho
que conduz a ti mesmo
solitário,
com Zaratustra
aprendes a sabedoria louca
percorres
os demónios e os desertos
crias e amas
solitário,
em Zaratustra
encontras-te
e readquires a vida
solitário,
agora procuras a mulher
e queres fecundá-la
solitário,
em Zaratustra
afastas a morte
celebras
e danças.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

QUEREMOS OUTRO MUNDO!


Aumentam os transportes, vão-se os subsídios, o desemprego dispara. Aumentam também as situações de pobreza e miséria. Grande parte da classe média está proletarizada. É esta a política de Passos Coelho e da troika. Para além disso, esses senhores que servem os mercados vendem-nos uma "vida" desinteressante, entediante, repetitiva, onde as relações entre as pessoas obedecem às leis do ganho, do interesse, da economia. A macacos trepadores, como diz Nietzsche, a macacos que trepam uns por cima dos outros em busca do dinheiro, do lugar, do poder, eis ao que os governantes e os pregadores da morte nos querem reduzir. Aumentam igualmente os casos de depressão e de suicídio. O gozo, a alegria são muitas vezes artificiais, passageiros. Que mundo nos trouxe o triunfo da tecnologia? O mundo da máquina, da repressão do desejo, da castração, da felicidade fabricada. O mundo assim não presta. Queremos outro!

ZARATUSTRA















Releio "Zaratustra"
procuro em Nietzsche
a alma gémea
o fogo criador
reaprendo o grande desprezo
por tudo quanto é pequeno
pelo macaco que trepa
combato os demónios
que me arrastam
para a depressão
para a grande queda
na minha solidão
agarro-me à vontade
e à terra
volto a ser maldito
provocador
amante da festa.

GRANDE ABRAÇO, JOÃO ULISSES

Um grande abraço ao João Ulisses, o poeta que vendia poemas nos cafés.