sábado, 28 de julho de 2007

CARLOS PACHECO

a grande interrogação




2.

o mundo não pode ser assim
um lugar inóspito
onde os ricos se perdem na sua riqueza
e a maior parte da população sobrevive alienada
onde impera a injustiça, a sobrevivência

deus não existe
isso é seguro - sei com tranquilidade

o que fazer com a minha vida?
o que fazer com o tempo que me resta?

/ não sei




3.

tenho 39 anos
e sou um colaboracionista

/ o grande colaboracionista

os novos instrumentos de libertação
afinal transformam-se em grilhetas
de maior injustiça

auto-estradas da informação
auto-estradas da desigualdade

para que sirvo?
/ um condutor de homens exímio
numa estrada sem sentido

libertação pelo conhecimento?




5.

onde está o movimento livre?
qual o gesto útil?

castelos de areia, mês após mês
soldado do capital
absolutamente perene
/ sem significado

o que é real?




Carlos César Pacheco
27 de Julho de 2007
18:00

segunda-feira, 23 de julho de 2007

BENJAMIN PÉRET


Disse o nosso general
com o dedo no buraco do cu
O inimigo
é pr’ali marchar
Era pela pátria
Partimos
com o dedo no buraco do cu
A pátria encontrámo-la nós
com o dedo no buraco do cu
Disse-nos a marafona
com o dedo no buraco do cu
Morram ou
salvem-me
com o dedo no buraco do cu

Em seguida encontrámos o kaiser
com o dedo no buraco do cu
Hindenburgo Reischffen Bismark
com o dedo no buraco do cu
o grã-duque X Abdul-Amid Sarajevo
com o dedo no buraco do cu
mãos cortadas
com o dedo no buraco do cu
Deram-nos cabo das canelas
com o dedo no buraco do cu
devoraram-nos o estômago
com o dedo no buraco do cu
furaram-nos os colhões com fósforos
com o dedo no buraco do cu
e depois muito docemente
morremos
com o dedo no buraco do cu
Rezai por nós
com o dedo no buraco do cu

Tradução de Mário Cesariny.


Benjamin Péret nasceu na França em 1899. Aderiu ao surrealismo na década de 20, após breve militância no movimento Dada, ao mesmo tempo que se associava ao Partido Comunista com o qual veio a romper mais tarde. Em 1924 dirigiu, com Pierre Naville, La Revolución Surrealiste e publicou os poemas D’Immortale Maladie. Viajou para o Brasil em 1929, militando no grupo trotskista local. Casado com a cantora brasileira Elsie Houston, foi deportado do Brasil em 1931. Data dessa época a destruição, pela polícia getulista, do livro O Almirante Negro. Entre 1936 e 1937 lutou em Espanha contra o franquismo, vindo posteriormente a refugiar-se no México. Já na década de 50, regressou ao Brasil. Escreveu sobre culturas indígenas e produziu uma obra poética e ensaística singular, reunida em vários volumes após a sua morte em 1959.

sábado, 21 de julho de 2007

FRÁGIL

Espero que venhas, meu amigo,
agora que estou frágil
em frente à cerveja e às azeitonas
espero que venhas, meu amigo,
agora que estou vencido
perante a espuma dos dias
espero que venhas, meu amigo,
agora que estou despalavrado
no café deserto
onde a TV se liga à ficha
espero que venhas, meu amigo,
agora que estou sem nada
exceptuando as minhas derrotas
espero que venhas, meu amigo,
agora que me apetece partir tudo
mas as forças falham
espero que venhas, meu amigo,
agora que estás morto
e não me resta nada
nem cavaleiro nem rei
sucumbo à última dentada.

quinta-feira, 19 de julho de 2007

AS CONVERSAS DO MUNDO

O poeta, à mesa,
ouve as conversas do mundo
se não fosse poeta
também as ouviria
mas não lhes daria
a mesma importância
porque as conversas do mundo
mesmo quando fúteis e ridículas
são a sua matéria-prima
e o poeta vive delas.

sábado, 14 de julho de 2007

A ARTE E A VIDA

MANIFESTO DOS 39

António Pedro Ribeiro

"Desejar a arte como uma Helena a que se tivesse direito". "Para poderem viver, os gregos criaram os deuses. O mesmo instinto que exige arte para a vida, que exige a arte que é o encanto que nos impele a continuar a viver", escreveu o poeta e filósofo Nietzsche ("O Crepúsculo dos Ídolos").
É a arte que justifica a vida, mas não a arte ao serviço do poder, das OPAS do Berardo, não a arte transformada em mercadoria. Falamos da arte enquanto criação, do artista enquanto mago, enquanto visionário, enquanto poeta. "A música é a tua amiga única", cantou Jim Morrison. A arte implica uma ruptura com o capitalismo, com o mercantilismo, com o racionalismo. "Só é poeta o homem que possui a faculdade de ver os seres espirituais que vivem e brincam em torno dele", acrescenta Nietzsche. O artista-criador tem visões, iluminações. Como vive na sociedade capitalista tem a tarefa dolorosa de ir contra a parede, de afastar a ideologia dominante que nos impinge as leis do mercado, do tédio, do governo, dos partidos, do poder, do salve-se quem puder. O artista tem de andar à deriva, de caminhar sem direcção determinada, como dizem os situacionistas. Esse caminho tem um preço: a solidão. Mas como escreveu Nietzsche, "os grandes homens estão condenados à solidão". E Léo Ferré acrescenta: "o artista aprende a sua profissão no inferno".
A linguagem do poeta-mago nada pode ter a ver com a eficácia, com a com a competição, com a competividade mas sim com a liberdade absoluta, com a "liberdade cor de homem", de que falam os surrealistas. Viver é criar.

FANTASMAS



Estou a ouvir fantasmas. Estarei em delírio como Hamlet?

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Acabarei como tu, Jaime,
acabarei como tu, Alba,
é essa a minha sina
definitivamente não fui
feito para o mundo da troca,
das OPAS, do salva-se quem puder

Acabarei sem rendimentos
à mercê da boa vontade
de alguns amigos e amigas
amaldiçoado pelo status quo
porque já nada tenho a temer
acabarei como tu,Jaime,
acabarei como tu, Alba,
o rock não rola
e a fama já deu
o que tinha a dar.

domingo, 8 de julho de 2007

CAOS

Atravesse no fim do caos. Obrigado.

terça-feira, 3 de julho de 2007

POETA


Chove lá fora

e eu sou poeta

o mundo agita-se lá fora

e eu sou poeta

serei sempre poeta

aconteça o que acontecer

dilúvios tempestades tsunamis

haja ou não dinheiro

serei sempre poeta

e escreverei para o mundo

para a menina ao telefone

chove lá fora

e canto o céu

o inferno o purgatório

chove lá fora

e serei sempre poeta.


A. Pedro Ribeiro.

sábado, 30 de junho de 2007

FERNANDO PESSOA



P OEMA PIAL
Casa Branca - Barreiro a Moita(Silêncio ou estação, à escolha do freguês)
Toda a gente que tem as mãos friasDeve metê-las dentro das pias
Pia número UMPara quem mexe as orelhas em jejum.

Pia número DOIS,
Para quem bebe bifes de bois.


Pia número TRÊS,Para quem espirra só meia vez.

Pia número QUATRO,Para quem manda as ventas ao teatro.

Pia número CINCO,Para quem come a chave do trinco.

Pia número SEIS,Para quem se penteia com bolos-reis

Pia número SETE,Para quem canta até que o telhado se derrete.

Pia número OITO,Para quem parte nozes quando é afoito.

Pia número NOVE,Para quem se parece com uma couve.

Pia número DEZ,Para quem cola selos nas unhas dos pés.

E, como as mãos já não estão frias,Tampa nas pias!

Fernando Pessoa

sexta-feira, 29 de junho de 2007

Tenho três bons livros publicados. O meu nome já apareceu várias vezes nos "media". Por razões políticas, enquanto diseur, performer ou cantor, enquanto poeta. Supostamente já atingi determinados objectivos mas continuo teso. As mulheres só me querem quando subo ao palco. Eis a minha tragédia. TEnho o dom da palavra mas nem sempre o consigo expressar. Que vai ser de mim? Já disseram que eu era o último dos poetas românticos. Provavelmente sou. Mas de que me vale isso?

terça-feira, 26 de junho de 2007

LIBERDADE


Não existe para a liberdade inimigo mais provocante e fundamental do que as instituições liberais.

(Nietzsche, "O Crepúsculo dos Ídolos")

segunda-feira, 25 de junho de 2007

O POETA VEM

O poeta vem à pastelaria
o poeta vem para junto da mulheres
dos ditos das mulheres
dos mexericos das mulheres
do universo das mulheres

o poeta vem à pastelaria
lê e escreve
sobre as mulheres
deixa-se levar na corrente
das palavras rápidas das mulheres

o poeta vem à pastelaria
em busca do amor
em busca da dama de porcelana

o poeta lê e escreve
é um poeta
é isso que esperam dele

o poeta lê, escreve e caminha...

A. Pedro Ribeiro.

sábado, 23 de junho de 2007

Nietzsche


A arte é o grande estímulo da vida.

(Nietzsche, "Crepúsculo dos ídolos")

quarta-feira, 20 de junho de 2007

A VIDINHA



A VIDINHA

António Pedro Ribeiro

Não, não nasci para a vidinha pequeno-burguesa. Tenho asco aos moralismos das coisas coisas certinhas, às horas pré-determinadas. Não, não nasci para os horários das 9 às 5. Venho de reis malditos, de poetas visionários. Só a espaços sou feliz aqui. A rotina mata-me. Só o Amor e a Liberdade me guiam. Ás vezes basta uma palavra, uma palavra de ternura de uma mulher para nos elevar, para nos convencer de que estamos vivos e a verdadeira felicidade só pode estar aqui. Porquê tantas fronteiras?
Ouço a música que ouvia aos 15 anos. Mas já não tenho 15 anos. Sou um poeta maldito. Os meus admiradores e detractores esperam isso de mim. Tenho a vantagem de poder ter comportamentos excêntricos, de escrever textos marados e até há quem os publique.