quinta-feira, 30 de junho de 2005

Poesia no Pátio-II

Hoje há poesia com música no Pátio, em Vila do Conde, às 22,30 horas. Lá estaremos.

Do Fontes Novas

Com as devidas desculpas pelo atraso ao Fontes Novas, aqui ficam mais dois da sua lavra:

mentiram-nos


quando nos dói
a despesa
por sempre pagar
a pobreza
muito pouco
quase nada
só revolta
que nunca chega
para tirar o cravo
à espingarda





guadiana

era um rio virgem
alqueva
que grande foda
decepada a virgindade
de um milhão de árvores
resta a impotência
de um povo.


José Fontes Novas.

Duas Pérolas de Péret

Disse o nosso general
com o dedo no buraco do cu
- O inimigo
é pr' ali marchar!-
Era pela pátria
partimos
com o dedo no buraco do cu.
(Benjamim Péret, "Monument aux Morts de la Guerre")


Cardeal Mercier a cavalo num polícia
vi-te no outro dia semelhante a uma lixeira
transbordante de hóstias
Cardeal Mercier tu fedes a Deus como o estábulo
a estrume e como o estrume a Jesus.
(Benjamim Péret, "Le Cardinal Mercier Est Mort")

Regresso

Após um interregno forçado, "Trip na Arcada" regressa com:

MANIFESTO DOS 37

Aos 37 anos, José Mário Branco escreveu o "FMI". Aos 37 anos, apetece-me dizer com os situacionistas que "nada queremos de um mundo no qual a garantia de não morrer de fome se troca pelo risco de morrer de tédio"(1). Apetece-me dizer com André Breton que "a ideia de revolução é a melhor e mais eficaz salvaguarda do individuo"(2).
Apetece-me estar com a subversão. Com a crítica radical à ditadura do consumível, da mercadoria, do quantitativo, do défice.
Apetece-me estar do lado da liberdade, da liberdade absoluta contra a ilusão da liberdade de compra e venda, da sobrevivência, da "sobrevida" que substitui a vida, do quotidiano insuportável, do tédio.
Apetece-me estar com os poetas malditos. Com Rimbaud, com Baudelaire, com Nietzsche, com Sade, com Lautréamont a infernizar tudo quanto é direitinho, conforme às normas, castração.
Apetece-me estar contra todas as formas de autoridade, opressão e dominação. Apetece-me estar do lado da rebelião.
Apetece-me dizer que já pouco acredito nos partidos, mesmo nos de esquerda. Que lutar por lugares dentro da democracia burguesa é aceitar como irreversível a democracia burguesa e, portanto, afastar totalmente do horizonte a revolução, mesmo que se continue a falar na construção da sociedade socialista. E não há transições pacíficas para o socialismo. Como escreve António José Forte (3):"Que diálogo pode haver entre o condenado à morte e o carrasco que o conduz ao patíbulo?".
Apetece-me dizer que acredito na poesia e no amor como formas subversivas. Que acredito em actos provocatórios, em agitações espontâneas que ridicularizem o instituído, no terrorismo poético. Que a criatividade é o último reduto da rebelião.

António Pedro Ribeiro, Frente Nietzscheana Revolucionária.

(1)- Raoul Vaneigem, "A Arte de Viver para a Geração Nova".
(2)- "La Révolution Surrealiste, nº4".
(3)- António José Forte, "Uma Faca nos Dentes".

segunda-feira, 13 de junho de 2005

Álvaro Cunhal

Álvaro Cunhal dedicou toda a sua vida à construção do socialismo. Mesmo que discordemos da via que Cunhal preconizava para o socialismo, devemos render homenagem ao grande resistente antifascista, à sua coragem, ao seu empenho na luta. Apesar de discordamos com a linha do PCP, pensamos que Álvaro Cunhal é um exemplo para todos aqueles que combatem o capitalismo.

domingo, 12 de junho de 2005

Um Não ou o Poema da Negação

Um NÃO absoluto ao capitalismo, eis a postura fundamental.
Um NÃO ao mercado global que tudo estrangula, que tudo sufoca, que tudo mata. Um NÃO ao capitalismo global que nos faz passivos, subservientes, desempregados e nos traz a fome e a miséria. Um NÃO ao lucro e ao culto do lucro. Um NÃO rotundo do tamanho do mundo.
Um NÃO aos barões da finança, aos banqueiros, aos que enchem a pança. Um NÃO aos governos joguetes do capital, aos mandaretes locais, aos senhores feudais. Um NÃO à economia de guerra, ao imperialismo, à felicidade fabricada. Um NÃO rotundo do tamanho do mundo.
Um NÃO às multinacionais, ao homem feito mercadoria, à exploração do homem pelo homem. Um NÃO ao culto da competição. Um NÃO às panelinhas, às capelinhas e às outras inhas que aí vão. Um NÃO que incomoda. Um NÃO ao detergente da moda. Um NÃO rotundo do tamanho do mundo.
Um NÃO sem meias tintas, sem mediações internacionais. Um NÃO sem negociações sindicais, sem institucionalizações partidárias, sem comités centrais. Um NÃO imenso de revolta. Um NÃO rotundo do tamanho do mundo.

FRENTE GUEVARISTA LIBERTÁRIA/ LIGA NIETZSCHEANA REVOLUCIONÁRIA

sexta-feira, 10 de junho de 2005

Poema do défice-2

Dado o sucesso alcançado e dado o amor que nos liga a José Sócrates, repetimos a dose do "Poema do Défice":

Um défice a caminho dos 7% mostra um país. Um défice de 7% mostra um país a caminho. Um défice em cada caminho do país. Um défice na caminha com o país.
Os políticos têm pensado que atribuir culpas aos outros e maquilhar os défices é preferível a corrigi-los. Os défices maquilhados atribuem culpas aos políticos. Os políticos maquilhados engatam o défice. O país maquilhado ainda caminha. O país, o défice e os políticos maquilharam-se em Caminha.
Não é normal que os políticos continuem a debater eternamente o valor do défice. Os políticos normais batem ternamente uma punheta enquanto debatem o défice. Os défices anormais não batem.
Apesar de Sócrates, a vida pública permanece deficitária. Apesar do défice, Sócrates existe. Apesar de Sócrates, a vida existe.

A. Pedro Ribeiro, in "Contas em Dia".

Ramalho

Há poetas e poetas. Há poetas de sucesso e há poetas que vivem como poetas, de bar em bar, de café em café, de rua em rua. Armando Ramalho é um desses poetas. Autor do livro "Dói Ver Ser Essa Palavra" e de inúmeras compilações poéticas, Ramalho é uma figura de Vila do Conde. "Porque Pessoa Opioniou" é uma das suas últimas criações:

Pessoa Ó!Pente fabrico
Pessoa orgão opiania
Papoula Pessoa ourives nádega navegou
Papoula cega cabra borboleta pirilampo
Leite de rochas
Finlândia Herz
Nova neva pergunto- porquê Portugal?
Vida e tempo.
Opiáceo- anterior cantiga! Tejo- que ao firmamento
Tejo que ao filho das àguas
Tejo que areal de início junkie
Rio Tejo a margem estrela de Banguecoque
Imigrantes clandestinos em barcos piratas
Ópio de gelo- gelo cristal quebrado
Elevador dos sapatinhos da Glória
Neve e opinião comum pública privada judicial
Neve de brancura doirada e cinzenta de ódio
Ódio do meu transtejo veleiro de uma ruína ode
Ode aos opiácios cocain eros caos
Mater window stupid cocain business
Noir seule blanche cocain Durruti bar violão
Porque neve de brancura , frio da noite. Loba oriunda
Raiva visão centimétrica Pessoa opioniou coca Postiga.

Político

espécie de ave que rapina
predador inconsolável
TGV tudo devagar
enriquece a alta velocidade
se tem partido
volta sempre
entra pela esquerda
sai pela direita
ou vice-versa
quando perde
ganha sempre mais
o dever é comprido
já vai nos 7%
a 10 de junho
tapa o outro olho ao Camões
pendura o chocalho na lapela
e o ceguinho emociona-se
com tanto rigor patriótico
do presidente
para tão poucos portugueses.

José Fontes Novas

domingo, 5 de junho de 2005

Teses Sobre a Visita do Papa

1. Ó Estado, mais uma vez podes limpar as mãos à parede do cu do papa, ficarás com as mãos mais brancas para os teus crimes. Ó partidos, da esquerda e da direita, mais uma vez podeis beijar os pés ao papa, ficareis com a boca abençoada para mentir melhor. Explorados, escolhei o crime, escolhei a mentira. Sois livres. Tu poeta, range os dentes e indigna-te.
2. Que o Estado venere a Deus na figura do papa, que os partidos venerem o Estado na figura do papa; que os explorados venerem a Deus, o Estado, o Partido- a trindade omnipresente. Enfim, o poder temporal subordinado ao poder sobrenatural. Nem Deus nem senhor? Maldita incurável doença infantil do comunismo. Explorado, escolhe o explorador.
3. O Estado que te submete é republicano e reverencia a Igreja, o Partido em que militas é marxista e felicita o papa, o Sindicato onde estás inscrito é revolucionário e saúda a reacção. A greve geral é uma arma que não deve ferir o papa. Nada contra o obscurantismo. Paz ao inimigo. Quem disse que a religião é o ópio do povo? Explorados, que escolheis?
4. Sobretudo, nada de escândalo. Uma pedra branca sobre o crime, uma pedra negra sobre a crítica. Ecrasez l' infâme, dizia Voltaire. O silêncio dos ateus é o ouro do Vaticano. Explorado, escolhe a pedra para a tua cabeça.
5. Conquistar a liberdade de expressão para não usar a liberdade de expressão. Não denunciar o opressor, não ousar atirar-lhe à cara a revolta, sequer na forma de um cravo. Ver, ouvir, receber o papa com o medo do 24 de Abril. Explorado, porque não vomitas?
6. Explorado, sê manso e obedece. Pode ser que entres no reino dos céus, de camelo ou às costas de um rico. Obedece. Pode ser que vás para a cama com a pátria. Obedece. Pode ser que o teu cadáver ainda venha a ser estandarte glorioso do Partido. Nunca percas a esperança, explorado, jamais.
7. Abaixo a união livre. Viva a coexistência pacífica. O casamento do capital e do trabalho vai ser o grande casamento do século. Não haverá oposição dos pais nem da polícia. Sobretudo, tudo menos a erotização do proletariado. Felicidades, explorado.
8. Ouvi falar da luta de classes e da revolução e do mundo que o proletariado tem a ganhar e nada a perder. Ouvi falar das armas da crítica e da crítica pelas armas. Ouvi falar em transformar o mundo e mudar a vida. Ouvi falar de que enquanto um homem, um só que seja, e ainda que seja o último, existir desfigurado, não haverá figura humana sobre a terra. Nunca tinha ouvido uma sereia assim. Ouviste, explorado?
9. O diálogo? Que diálogo pode haver entre o condenado à morte e o carrasco que o conduz ao patíbulo? O diálogo é entre amantes, entre amigos, entre camaradas. Fora disso não há diálogo. Tens a palavra, explorado.

ANTÓNIO JOSÉ FORTE (1931-1988), in "Uma Faca nos Dentes", Revista Utopia nº 19/2005. http://www.utopia.pt

Só Pró Povinho/IVA

O sem paio fedeu-nos
quer mais espírito patriótico
duas bandeiras na varanda
não chega
os chineses agradecem
com os castelos
em formato das caldas.

José Fontes Novas


IVA

Um cão peão
foi atropelado na passadeira
o Seguro criticou o desgoverno
da companhia Sócrates
por fugir às responsabilidades
o rendimento volta a ser mínimo
e as reformas antecipadas
são só para os políticos
no activo
José Mário Branco
é que tinha razão
isto é tudo a mesma carneirada.

José Fontes Novas.


quinta-feira, 2 de junho de 2005

Coisas da Arcada e do Astória-II

A Marta do "Astória". Voltei a vê-la hoje na estação da CP de Braga. Não me viu. E eu passei ao lado. Timidez. Estava acompanhada. E tudo isto no dia em que o Amaral me publicou a apologia de Braga e do "Astória" no blogue. A Marta. Tão querida, a voz doce, as pernas, as coxas, a minissaia. E eu, sentado à mesa vidrado, a escrever poemas. "Chegar e Beber", "Filme", "Trip na Arcada". Ofereci-lhe e dediquei-lhe alguns.
Também tivemos as nossas trips. Uma vez expulsou-me do "Astória". Estava alcoólico. Agora não bebo por causa dos intestinos. A Marta do "Astória".

Coisas da Arcada e do Astória-I

Hoje à noite diz-se poesia no "Pinguim" no Porto. Não estaremos mas apoiamos. Entretanto fica mais um da saga de Braga, da Arcada e do "Astória".

CHEGAR E BEBER

Chegar e beber
pela empregada de mesa
por filmes passados
por destroços de amor

e ela vem
e acende-me
a deusa
a grande puta

(anda um gajo a escrever estas merdas para depois ser publicado na última página de um pasquim de terceira ou numa revista pretensamente vanguardista a que tem acesso meia-dúzia de caramelos armados em literatos)

chegar e comer
banquete à tua mesa
xadrez semi-rápido
mate à terceira rodada
à terceira facada

venha ela
loirinha, ruiva- que importa?
busto firme
minissaia ajustada

coquete televisiva
sai do ecrã
salta para a mesa
dança para mim

basta uma palavra
e vens
uma palavra
só isso
por um euro
cerveja por sexo
sexo na cerveja
sexo de bandeja
ao litro
em tragos

...esta cidade ainda tem qualquer coisa...

Braga, Astória, 15. Set. 1999

quarta-feira, 1 de junho de 2005

Poesia no Púcaros

Hoje há poesia no Bar Púcaros no Porto às 23,30 horas. Lá estaremos.

Globalização Democrática

lá se foi o menino
na bruma das areias calcinadas
pelo amigo fogo dos abusos
e dos obuses
há no horizonte um grito
abafado pela intolerância
dos novos princípios
uma nova desordem
proclamada por velhas ganâncias
demagogias de novos impérios
que lançam na fogueira
todos os fantasmas
em carne viva
a democracia dos ditadores
semeia no golfo
os tentáculos da loucura
os novos garimpeiros do ouro negro
querem reconstruir o ódio
em diálogos balísticos
e esquecem que o silêncio torturado de um povo
sobrevive a todos os atentados
e é por isso que a liberdade
conhece todas as páginas
da humilhação.

José Fontes Novas.

Sócrates

Abaixo o Governo Sócrates e todos os governos!

O Cretinismo Parlamentar

A ilusão segundo a qual o parlamento é o eixo central da vida social, a força motriz da história universal, é uma ilusão que é possível não só explicar historicamente mas que é necessária para a burguesia em luta pelo poder e ainda mais para a burguesia que o detém. O fruto natural duma tal concepção é o famoso "cretinismo parlamentar" que, perante a verborreia satisfeita de algumas centenas de deputados numa câmara legislativa burguesa, fica cego perante as forças gigantescas da história mundial que agem no seu exterior, no fluxo da evolução social e que nenhum caso fazem dos fazedores de lei parlamentares.
Rosa Luxemburgo, "O Estado Burguês e a Revolução".
Em palco. A recitar o "Poema do défice". A subir com Brecht e Jim Morrison.
Em transe. Sem limites. A palavra a cortar. Olhos vidrados em mim. O aplauso. A cascata.
Morte e ressurreição em palco.