segunda-feira, 5 de novembro de 2012

DA VIDA

Não se tem de andar constantemente de pistola na mão a apelar à revolta e à revolução. Contudo, penso que, nos tempos que correm (e em todos os tempos...), não faz sentido que o poeta, o escritor e o intelectual não se pronunciem de forma crítica sobre a sociedade em que vivem. Temos de denunciar que a vida assim não é vida. Que há forças que se escondem por detrás das medidas fascizantes dos governantes. Que há essa entidade a que chamam os mercados, a quem todos obedecem. Que há os "credores", os especuladores, a bolsa, os banqueiros, os economistas, os grandes empresários, essa gente altamente recomendável. É preciso dizer que todos eles nos chulam, nos roubam, nos vão dando cabo da vida. E a vida é o que realmente interessa, como dizia Henry Miller. A vida é respirar, é estar vivo, é estar aqui mas é também gozar o instante, construir o presente, amar o próximo e o longínquo, mexer os dedos e a caneta, andar à solta sem imposições, sem castrações, sem culpas. A vida é certamente a liberdade livre de Sade e dos surrealistas, não o trabalho, não o sacrifício, não o que nos obrigam a fazer. A vida é certamente acordar contigo, ouvir as fontes e os pássaros, dançar em redor da fogueira, como cantava Morrison. A vida é certamente tirar todos esses imbecis do poder, caciques locais de Câmara e de Junta incluídos. A vida é ajudar esta gente a sair da cegueira, como fazia Sócrates, como fazia Shakespeare. Café São Cristóvão, Braga, 2.11.2012

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

O ABRAÇO FRATERNO DO CARLOS PINTO

O mundo do dinheiro e da economia é absurdo. Afasta-nos da nossa essência, do amor, da alma. Destrói a maravilha e o mistério da vida. Empurra-nos para o trabalho imposto, para o sacrifício, para a máquina cega. A nossa experiência perde a luminosidade, o prazer da descoberta, a aventura do eu é castrada. A viagem interior, xamãnica só está ao alcance de alguns. Só alguns contactam com os espírito s, atravessam para o outro lado. No resto, o dinheiro e a economia destroem o belo e a poesia. Já rareia a espontaneidade, o abraço fraterno como o do Carlos Pinto no Púcaros, o diálogo aberto. O reino do dinheiro, da ganância e da economia produz homens e mulheres sem coração que se vão safando, trepando uns para cima dos outros como macacos, como dizia Nietzsche. Só alguns de nós, com sofrimento, nos conseguimos manter puros, imunes ao grande mercado, vivendo a luz e o espírito. Por isso, ainda amamos incondicionalmente, sem hipocrisias. Por isso desafiamos os poderes, provocando-os, insultando-os. Por isso tentamos fazer da vida uma experiência permanente, por isso nos abrimos e damos, por isso somos diferentes.

domingo, 21 de outubro de 2012

DIVINOS

"Somos constituídos por partículas formadas desde os primeiros segundos do universo, átomos forjados num sol anterior ao nosso, moléculas que se reuniram na Terra." (Edgar Morin) Vimos do início, dos primeiros segundos do universo. Somos divinos, estamos muito para lá do homem prosaico, das suas preocupações mesquinhas, do dinheiro ao fim do mês. Somos fundamentalmente alma, amor, poesia. Somos ... capazes de grandes obras. Estamos para lá de Deus. Somos caminheiros dos céus, como dizia Henry Miller. Somos grandes. Somos do tamanho do universo mas somos frágeis. Por isso precisamos de amor, amizade, fraternidade. E precisamos de criar, de celebrar a vida, o milagre da vida. Podemos estar aqui à mesa da confeitaria a escutar conversas banais mas somos divinos. Hoje tomamos consciência. Somos divinos. Como Shakespeare, como Nietzsche. Somos meninos e bailarinos. Jogamos com a vida. Descobrimos o mistério. Vimos de um sol anterior ao nosso. Dancemos. Brindemos ao mundo e à vida. Chegámos onde queríamos chegar. Somos loucos divinos. Poetas-bailarinos. Celebremos.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

EU ACUSO!

Todo o percurso que fiz até aqui. O rapaz que era. A timidez. A dificuldade de me relaciionar com as raparigas. Os versos que então escrevia. Já então pensava muito. Depois veio a noite, os copos, os concertos. Descobria a liberdade no Tuaregue, no Deslize, em Braga, na Rua Nova de Santa Cruz. Tornei-me então outro, aquele que sobressaía, que provocava, que dançava. Mas as grandes depressões travaram a minha caminhada. Fiquei inerte, insoluvelmente melancólico, incomunicável. Passavam-se os meses dolorosamente e, aos poucos, readquiria a vida. Fui para o palco, cantei, recitei, fiz a festa. Agora estou aqui, aos 44 anos, mais sábio, mais virtuoso, mas ainda desejoso de passar para o outro lado. Ainda morrisoniano, nietzscheano, consciente de que a vida não se resume a uma fórmula única e irreversível. Consciente de que os medíocres que nos governam e querem controlar não passam de uns imbecis sem alma nem coração, sem inteligência. Consciente de que posso chegar ao palco e dizê-lo. Consciente de que nada há a perder, de que fiz o meu percurso e de que não devo nada a ninguém. Posso estar aqui sozinho na confeitaria com os meus livros mas acuso esses medíocres do poder de destruírem a vida, de matarem de fome, tédio e depressão, de darem cabo de tudo quanto é arte, belo, exuberância, de assassinarem a juventude e a infância, de amputarem a liberdade e o amor. Acuso-os de não fazerem parte da humanidade nem da vida.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

A SEDE DO LUCRO

Terrível mundo este onde "a sede do lucro sufoca todo o restante impulso humano", nas palavras de Ernst Bloch. Terrível mundo este onde podemos vir ao café estudar ou conversar mas onde as conversas são formatadas, dominadas pelo preconceito ou pelo medo, controladas pelas modas e pelo "big brother" televisivo. Verdadeiramente poucos de nós conseguimos ser autenticamente plenos e ainda assim estam...os sujeitos ao tédio, à depressão, à ameaça da pobreza, à máquina que bombardeia. Conhecemos homens livres que morreram na miséria. De resto, há a sede do lucro, do passar por cima do parceiro, a luta pela existência. Raramente somos plenos, raramente conversamos sábios e libertos, raramente nos expressamos ou criamos no máximo das nossas potencialidades. Há sempre algo que nos diminui o espírito e a inteligência. Há sempre algo que nos condiciona. Mesmo que tomemos mais um café e que nos sintamos mais concentrados, mais sabedores. Mesmo que as pessoas venham aparentemente livremente ao café não deixam de ser escravas- da ignorância, da barbárie, de Mámon, o deus-dinheiro.

CAPITALISMO

o capitalismo é, realmente, uma religião, e a mais feroz, implacável e irracional religião que jamais existiu, porque não conhece nem redenção nem trégua. Ela celebra um culto ininterrupto cuja liturgia é o trabalho e cujo objeto é o dinheiro. Deus não morreu, tornou-se Dinheiro. (Giorgio Agamben)

domingo, 7 de outubro de 2012

A BARBÁRIE

Em 1845, em “A Essência do Dinheiro”, Moses Hess afirma que o capitalismo traduz a dominação exercida pelo deus-dinheiro sobre os homens, constituindo um sistema que coloca à venda a liberdade humana. O dinheiro é a essência e traz um mundo pior do que o da escravatura antiga porque “não é natural nem humano que alguém se venda a si próprio voluntariamente”. A tarefa do comunismo é, as...sim, abolir o dinheiro. Para Gustav Landauer essa tarefa não é aperfeiçoar o sistema industrial-capitalista mas ajudar os homens a redescobrirem a cultura, o espírito, a liberdade, a comunidade. Para outros, o capitalismo é traficar a alma, o espírito, o pensamento. Para Marx, exige-se “a revolta contra um mundo que transformou cada coisa numa mercadoria e degradou o homem, reduzindo-o ao estatuto de objecto”. Sim, temos o direito de exigir o homem integral. O poder do dinheiro pode destruir todas as qualidades humanas e naturais, reduzindo-as ao quantitativo. A troca de afectos é substituída pela troca do dinheiro por uma mercadoria. Não existe nada de mais abjecto do que o capitalismo e os seus mercadores e economistas. Reduzem tudo ao cálculo, ao deve e haver, ao orçamento. Cortam na vida das pessoas como se tratassem com objectos. A sensibilidade é substituída pela posse. Como dizem Michael Lowy e Robert Sayre em “Revolta e Melancolia”, “o ser, a livre expressão da riqueza da vida por actividades sociais e culturais, é cada vez mais sacrificado ao ter, à acumulação do dinheiro, das mercadorias e do capital”. O homem está fortemente condicionado na sua capacidade criativa pelas drogas que nos atiram todos os dias via media e por um mercado implacável. Segundo Lukács, “tudo deixou de ser avaliado por si próprio, pelo seu valor intrínseco- artístico ou ético- e apenas tem valor enquanto mercadoria vendível ou comprável no mercado”. É a barbárie, a selvajaria. Nem sabemos como ainda pode haver algum amor, algum diálogo, alguma filosofia. Eles estão a destruir o que de mais genuíno há no homem, esses merceeiros, esses moedeiros. Isto não é apenas a crise económica, isto não é apenas o irem-nos aos bolsos, isto é irem-nos à alma, destruírem os verdadeiros progressos da humanidade. Isto é destruir a vida. Não podemos mais aceitá-lo. Somos homens e mulheres. Não somos objectos, não somos notas e moedas.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

O ESTAR AQUI

Vir ao mundo, receber a graça de vir ao mundo. Depois brincar, ser livre. Ir à escola, aprender mas também ser moldado pela máquina, pelo mercado. Começar a questionar as coisas, guardá-las para si ou debatê-las com os melhores amigos. Fazer o liceu, ir para a Faculdade. Sair à noite, celebrar a noite, experimentar a liberdade. Mas depois voltar à máquina, ao mercado, à competição. Ler uns livros que contrariam isso. Depois vem novamente o ganhar a vida, o safar-se, o lutar pela existência, o passar por cima dos outros. Questionar tudo isso novamente, estar aqui no café com os livros, experimentar a liberdade. Saber que há uma via que está para lá da escravidão, do ser mais um, saber que essa via pode ser dolorosa mas saber que ela existe. Estar aqui, saber que não se está aqui por acaso, que temos um propósito, uma missão. Saber que isto está muito para lá do pão nosso de cada dia. Saber que isto não é o trabalho absurdo. Procurar o amor e o conhecimento. Ser o homem íntegro, integral. Não se deixar levar pela grande depressão. Estudar, ler os grandes, filosofar. Estar aqui, estar vivo, sem culpas nem pecados. Estar aqui soberano, sem patrões.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

A LUTA COMUM

Grécia, Portugal, Espanha. A mesma luta. Contra os governos ultra-liberais, contra a austeridade, contra a troika. Mas também o combate contra a democracia burguesa, contra o sistema político, contra o capitalismo dos mercados. Milhões nas ruas a dizer sim à vida, contra os banqueiros e os especuladores da morte. Milhões a dizer basta. Milhões a dizer que isto não serve, que isto não presta. Que se esgotaram todas as negociações, todas as concertações sociais. Que exigimos o mundo e exigimo-lo agora, como cantava Jim Morrison. Que não é mais possível suportar o roubo, a vigarice, a mentira. Que somos cidadãos, homens livres, e não escravos ou macacos. Que temos de fazê-los cair de uma vez por todas.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

O HOMEM NOBRE

Este é um mundo de negociantes e de polícias, como diz Albert Camus em "O Homem Revoltado". Para combatê-lo temos de recorrer à arte e à criação. Uma revolução que despreza a arte e a criação redunda numa China ou numa União Soviética. Mas a sociedade dos negociantes e dos polícias necessita de ser ultrapassada. Daí o renascimento do homem através da criação. Começa com as crianças, com uma educação não virada para o acumular do dinheiro, para o lucro, para o interesse. Onde o ensino artístico e da literatura assumam um papel fundamental. Onde se desenvolva o espírito crítico e se eliminem os programas imbecis e narcotizantes da televisão. Onde os cidadãos discutam livremente nas ruas, sem medo, sem patrões, sem polícias. Onde a filosofia se exercite. Assim atingiremos o homem nobre de Nietzsche e de Platão.

sábado, 22 de setembro de 2012

O POVO E A REVOLUÇÃO

O povo continua a sair á rua. O povo quer o Passos Coelho na rua. O povo não aceita migalhas nem mudanças de coméstica. O povo acordou, afinal não somos o país de brandos costumes de que se falava. Rebentam petardos, chovem pedras e garrafas. Como na Grécia, como em Espanha. Passos Coelho e Cavaco não vão aguentar muito mais tempo. A revolução está próxima. Tomemos o presente nas nossas mãos. Não cederemos aos gatunos. Permaneceremos na rua. Até ao fim.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Tivemos uma certa liberdade de escolha no liceu, com bons professores a Português e a Filosofia. Incentivaram-nos para a leitura, para a reflexão, para a escrita. Mas depois houve um ponto em que percebemos que há forças que nos querem afastar da liberdade, que nos querem impedir de sermos nós mesmos, que querem que façamos parte do rebanho. Passámos pelo consulado de Cavaco Silva, pelos “yuppies”...e pela promoção dos “yuppies”, dos jotinhas, dos carreiristas. Passámos pela tentativa de castração do pensamento autónomo, livre. Mas nós vínhamos do “boom” do rock português, dos UHF, dos Jafumega, vínhamos de Vilar de Mouros, dos “hippies”. Nós ouvíamos os Doors e os Pink Floyd. Nós líamos Marx, Nietzsche e os anarquistas. Nós líamos Mário de Sá-Carneiro e Fernando Pessoa. Revoltámo-nos contra o cavaquismo e contra as propinas. Cometemos erros e asneiras. Mas hoje temos a noção de que tivemos quase sempre razão. De que nunca fomos na conversa do Cavaco e que agora não vamos da do Passos Coelho. Constatamos que ainda temos a liberdade de escrever, de divulgar as nossas ideias no facebook ou nas páginas de um jornal, constatamos que a máquina de propaganda e o capitalismo dos mercados não nos silenciaram totalmente, constatamos que é tempo de revolução e de revolta.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

A OUTRA METADE

Vão rareando as pessoas que nos recebem de braços abertos, que verdadeiramente nos amam e respeitam, que se dão. A maioria das pessoas vive no medo, no medo de perder a casa e o emprego, na obrigação de competir com o parceiro do lado, de juntar dinheiro. Verdadeiramente não vivem. Verdadeiramente não são capazes de ser autênticas. São capazes de ser bem-educadas, civilizadas, nada mais. O homem está desligado da sua metade.

domingo, 2 de setembro de 2012

ALGO

Dizer algo que os outros não dizem, algo que não vem na comunicação social, algo que às vezes dizemos nos bares a desoras, bem bebidos. Algo que dizemos sem esperar recompensa, algo que não tem preço, livre, absolutamente livre, como tudo deveria ser. Algo que faz de nós deuses, senhores de impérios de luz, detentores do milagre da vida. Algo que nos acompanha desde a infância, que nunca soubemos explicar, algo que importa dizer, que nos distingue dos outros. Algo que somos realmente, que nos aproxima da sabedoria, que nos torna bons e belos. Algo que é o amor.

sábado, 1 de setembro de 2012

O AMOR É A SOLUÇÃO

Contemplar a beleza essencial, conhecer o belo em si mesmo, eis o motivo pelo qual viemos ao mundo, segundo Sócrates. Eis a via de Eros, eis o amor. Nada nos eleva tanto quanto o amor, quanto o desejo de geração e procriação no belo. Alguns procuram a eternidade nos filhos, na descendência, outros procuram-na na criação, na poesia. Nada está acima do amor, da fraternidade. O amor não faz cálculos, não visa o lucro, não inveja, o amor é o contrário do capitalismo. O amor une-nos, faz-nos crescer, mesmo quando discutimos, mesmo quando não estamos de acordo. O amor torna-nos magníficos, sublimes, poetas, filósofos. O amor junta-nos à mesa, celebra-se com vinho, alimento, sabedoria. O amor dá-nos forças, asas, alegria. O amor é a solução, o último reduto que eles não podem comprar, que eles não podem negociar. Por isso te amo, por isso te amarei sempre.