terça-feira, 18 de janeiro de 2011
ODISSEIA NO PIOLHO
Estou no Piolho e bebo
o Piolho está quase vazio
estive a falar com o Simões
e os empregados
falam de futebol
não fui correcto com a Gotucha
e agora estou a beber
e a olhar para as gajas
da televisão
Não me espetes os mercados nos cornos!
Os mercados são a negação da vida
os mercados castram a potência
e a alegria
não me atires os poetas da emenda
quero escrever o que me vem à cabeça
não estou à venda nos mercados
Chega o anão
desta vez não torce pela selecção
dirige-se à casa de banho
e eu escrevo
a minha arma é a caneta
a Fátima Lopes olha para mim
realmente antes andar bêbado
do que gramar esta merda
Sou o poeta dos cafés e dos bares
tusso
a Gotucha já não me liga
não deveria tê-la tratado assim
mas agora estou aqui
tenho a vida toda à minha frente
não sou um gajo consagrado
mas já tenho aparecido nos jornais
estou contra Deus
não suporto o Presidente
ainda assim vou votar
mas sou de mim
não pertenço a nenhuma corte
por isso ando sozinho
não sou de ninguém
deixei o partido
sigo o caminho
que conduz a mim mesmo
Morte aos mercados!
Os mercados não comandam
a minha vida
o Presidente e o Governo
não me dizem o que tenho de fazer
sou completamente livre
olhai!
Sou completamente livre
não estou nos gráficos
nem nas estatísticas
teria vergonha
de usar gravata
não procuro emprego
nem o caralho que seja
estou vivo
hoje, no Piolho, às 19:51
não dependo de nada
a não ser da cerveja, do papel
e da caneta
sinto-me iluminado
sou de mim
vivo
mando foder os mercados
e a castração social
não me deis a mão
estou bêbado
embriagado da vida
não sou o intelectual sisudo
não sou o ser respeitável
sou meu
metei os mercados pelo cu acima!
Não estou ao serviço de seita nenhuma
não tenho que prestar contas a ninguém
rio
gozo
cuspo nas caras mercantis
tenho uma fé inquebrantável no homem novo
mostro-me ao mundo
mas não estou à venda na praça
não me atireis pecentagens
não me coloqueis na bolsa
sou completamente livre
escrevo o que me apetece
não quero compromissos
nem conversas mansas
sou sobretudo vontade
permaneço aqui no Piolho
os mercados não me entram
pelos cornos acima
olho para o cu da gaja
sou completamente eu
não há aqui leis
só a cerveja que vem
às vezes vejo a bola
mas também não sou dela
estou bêbado
não tenho vergonha de estar bêbado
continuo a escrever
a minha vida é escrever
sou egocêntrico
mas, ao menos, não me deixo converter
alguém há-de ler-me
não tenho que estar
preocupado com isso
sou ébrio
não estou a competir
em nenhum campeonato
não ando atrás de ninguém
não sigo os fazedores de opinião
existo aqui e agora
há alturas como esta
em que não tenho quaisquer regras
a barriga incha
que se foda!
Enquanto estiver vivo
derramarei palavras
no papel
enquanto estiver vivo
berrarei essas palavras
porque não sou dos mercados
porque não suporto o Presidente
porque amo a mulher ausente
Iluminações
é o que tenho
iluminações
no Piolho às 20:23
não me peçam para obedecer
a uma qualquer bandeira
a Pátria que vá
para a puta que a pariu!
Estou hoje mais vivo do que nunca
pouso os óculos
hoje sou Quixote
hoje enfrento os moínhos
grito como o Do Vale
faço discursos à nação
poderia ser candidato
não devo mesmo nada a ninguém
remo contra a maré
não sou niilista
não sou derrotista
tenho fé no homem que aí vem
espeto a caneta na folha
sou do bem mas tenho maldade
sou o homem que escreve à mesa~do Piolho
não sou o Lobo Antunes
nem o José Luís Peixoto
escrevo livremente
o que vem da veia
não tenho grandes preocupações
com a forma
e depois vou berrar
estas coisas ao Pinguim
era lá que estava o Joaquim
e eu sou uma espécie de sucessor
deliro-dizem
vou até ao fim
Odisseia no Piolho
morte aos mercados
e aos seus profetas!
Dai-me poetas,
àcidos, profetas
dai-me para a veia
que eu já não vou cair
olho para a gaja
sou Hamlet
príncipe da Dinamarca
ouço vozes
delírios
dou-me ao mundo
não espereis de mim lirismos
versos bonitos
sou aquele que regressa.
Porto, Piolho, 17.1.2011
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1 comentário:
Muito bom.
Mas vê se fazes as pazes com a tua musa.
csd
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