domingo, 11 de fevereiro de 2018

ILUMINADO

Que fazer? Agora tenho um nome, uma banda, uma missão a cumprir. Compreendo as razões dos pacifistas mas ao ver tanta maldade, tanta podridão, tanta ignorância tenho que cavalgar o caos, tenho que destruir. Ainda ontem ouvi um gajo dizer no café que os sírios não querem trabalhar, só querem distúrbios e guerra. É com estes imbecis que me deparo. São estes imbecis que votam nos nazis e na direita. Estes imbecis merecem uma lição. Uma grande lição. Tal como os politiqueiros e os cães capitalistas. Tanta ignorância, Leonardo. Tanta ignorância, Sócrates, Platão, Nietzsche, Henry Miller. Só se divertem com futebóis, com imbecilidades. Mas não perdem pela demora. A revolução está aí às portas. Teremos que fazer certos pactos estratégicos, naturalmente. Contudo, nunca me senti tão forte. Nunca em mim foi tão evidente a vontade de potência. E as pessoas ouvem-me, dialogam comigo. A revolução começou em Braga. Na sexta. Penso que não me engano. Desta vez é mesmo. Estou confiante, G. Os deuses abençoam-me. Os partidos andam à nora, não percebem quase nada, não entendem a psicologia profunda. São sempre as mesmas fórmulas gastas. Eu falo como um profeta, como Zaratustra, como Jesus, como Che Guevara. As palavras ardem, cortam, matam como facas. Agora não posso voltar atrás. Este é o meu tempo. Esta é a minha hora. Tantos anos. Tantas noites. Humilhações, depressões, tristezas. Agora reino. Como Artur de Camelot, como D. João I, como D. Afonso Henriques. Como um rei anarquista. Não estou louco. Delineio planos, estratégias, como diz o Valter Hugo Mãe. O mundo é meu. Todo meu. Escutai o meu riso infame, soberano. Escutai o meu grito animal em palco. Deixai as vossas merdinhas. Chegou a hora. A minha hora. O meu espírito é divino e infinito. Nada está acima de mim. Nem Deus, nem Estado, nem partidos, nem empresários. Olhai como danço. Como estou em comunhão com as estrelas, com o universo. Como sou luz. Como estou iluminado.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

O MUNDO É NOSSO

É o cultivar do espírito que nos torna sábios, não a experiência. Há os seres do mundo da luz e os seres do mundo das trevas. Os do mundo da luz movem-se sem cadeias nem grilhetas, segundo diz Henry Miller.
Quando o ser humano alcançar todos os seus poderes será divino. Quando se converter no deus que é será livre. Só existe uma coisa: o espírito. O espírito responde ao espírito. O resto é conversa. Nem sequer é preciso praticar quaisquer exercícios físicos ou espirituais. Devemos ser inteiros, completos, santos. Daí que todas as sombras que nos impingem não passem de ilusões. Nós somos mais fortes, mais poderosos. Que importância tem um Trump se eu posso ser divino? Que importância têm esses personagens que desfilam nos ecrãs? Sombras. Meras sombras. Nós somos superiores, nós somos da luz de Platão. Deixêmo-los a rastejar como vermes. O espírito é nosso. O mundo é nosso.

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

A GLÓRIA

A Glória. Finalmente, a Glória. O artigo do Valter Hugo Mãe no Jornal de Letras. Sou, finalmente, um poeta reconhecido. Não me queira vingar de ninguém. Não que me pôr em bicos de pés. Simplesmente, a Glória. A "profunda honestidade" do poeta subversivo. Escrevo no Pátio. Teria que escrever num café. Ouço Jimi Hendrix. Os cafés tornaram-se parte essencial da minha vida. Como em Mário de Sá-Carneiro, como em Fernando Pessoa. Não escrevo histórias da Carochinha. Escrevo manifestos, programas de governo, como diz o Valter. Já há 30 anos escrevia bons poemas. Agora sou um dos melhores poetas deste país. Sem falsas modéstias. Escrevo a um ritmo estonteante. Embriago-me no acto da escrita. Outra vez Hendrix. "Foxy Lady". Desejo desesperadamente as mulheres belas. Passei muito tempo só na minha vida. Agarrei-me à leitura, à música e aos poemas. Ultimamente a poesia até é mais prosa. Hendrix incendeia, traz consigo Satã. O Hard Rock. A velha guitarra eléctrica. Vontade de beber. A verdade é que a grande maioria está morta. Não explode. Não rebenta. Não procura a Glória. Fica-se pelas meias-medidas, pelo supermercado, pela mercearia. E eu aborreço-me, G. Raramente há contacto com o desconhecido. Raramente há o espanto, a surpresa, a poesia, a filosofia. Há uma mera simpatia, nada mais. Uma simpatia de conveniência. Sou uma estrela mas estou só. Não te queixes, Pedro. Alcançaste a Glória. Não és um gajo qualquer. O teu pai bem te dizia.