sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

A MALDADE


Há alturas em que a maldade se apodera de mim. Apetece-me incendiar aldeias inteiras, pilhar, saquear, roubar as velhotas e os endinheirados. Há alturas em que não tenho lei, em que me apetece destruir tudo. Afinal de contas, não tenho quase nada e eles têm tudo. Tenho uma casa, é certo, não durmo na rua. Mas não tenho dinheiro para almoçar fora nem para comprar livros na livraria, nem para comprar discos, nem sequer para andar de bar em bar noite fora. O que me vale é que tenho amigos que me vão pagando os copos. Mas há alturas em que a maldade se apodera de mim. Quero ver tudo a arder, como Nero. O dinheiro também poderia arder todo e estes gajos ficavam aos papéis. Não suporto mais a vidinha pacata desta gente, não suporto mais a segurança do lar, das telenovelas, do futebol. Não os suporto mais. Só quero ver o país e o poder a arder. E, já agora, dai-me uma gaja para curtir. Eu só quero ver o poder a arder. Telefono às amigas mas estão todas ocupadas. Estou farto da rotina do Piolho. Estou farto das aulas de alemão. Estou farto do que estes gajos me dão. Quero ver as bombas a rebentar. EStou farto deste faz de conta, desta paz pode, deste beber copos sem partir vidros ou pichar paredes. Estou farto da normalidade. Quero aparecer na televisão de cocktail molotov na mão. Estou farto do Tiero e da poesia dos cocós. Estou farto da corte do forrobodó. Apetece-me mesmo incendiar a cidade. EStou farto do porreirismo e da nacional-unidade. Quero apedrejar os bancos e os mercados. Quero deixar de ser bonzinho. Quero ver o poder a arder, os faraós empalados, a humanidade a renascer. Faço pactos com Sade e Satã. Quero bombardear os estádios e a televisão. Quando a maldade se apodera de mim...

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