segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

REI E SENHOR


Seis da manhã. Hora de criar. O mundo ainda dorme lá fora. Não se ouve vivalma. Estou entregue, e bem, às leituras de Ezra Pound e de Miller. Há poetas e escritores que nos engrandecem, que aumentam a vida.
"Há apenas uma grande aventura, e essa é para o interior, rumo ao eu, e para essa não contam tempo nem espaço, nem tão-pouco feitos", escreve Henry Miller nos "Trópicos de Capricónio". E, de facto, é a vida interior, a descoberta do eu, a demanda de um Graal dentro de nós que faz de nós conquistadores, navegadores, sábios.
Seis da manhã. Hora de criar. Daqui a pouco ides todos prostituir-vos nos vossos empregos de merda a troco de uns trocos para manter a casa, o carro e o frigorífico. Não vos invejo. Tendes mais haveres do que eu mas eu tenho a minha liberdade. Tanto posso criar às seis da manhã, como às quatro da tarde, como às dez da noite. Não tenho chefes a foder-me os cornos nem regras, nem horários. Sou rei e senhor da minha vida. Às vezes fico deprimido mas sei perfeitamente onde quero chegar. E às seis da manhã sinto-me particularmente criador. É de mim que saem as palavras. É de mim que sai o ritmo. Não devo nada a ninguém.
Seis da manhã. Hora de criar. Não ouço nem cães nem gatos. Começo a ouvir agora os galos. Se é que não estou a ouvir vozes...Hamlet, Hamlet. São fantasmas, Hamlet. Olha! São aviões. Pássaros a cantar. O mundo começa a acordar.

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