sábado, 23 de outubro de 2010

DA GOTUCHA


DA GOTUCHA

Sente-se mais senhor. Sente-se o homem em construção, um homem nobre. Sabe que agora não há volta a dar-lhe. Não há ponto de retorno. Seguiu determinada via, seguiu a via da liberdade e da vida aumentada, seguiu os ensinamentos de Nietzsche, Morrison e Miller, apesar de haver ocasiões em que se deixa bombardear pelo sistema. É preciso que a Gotucha o compreenda. É preciso compreender também que o escritor trava batalhas terríveis consigo próprio. É preciso compreender que o capitalismo e a castração entram por nós dentro e nós temos de vencê-los. É preciso derrotar também os nossos demónios, os nossos fantasmas. Sim, a luta está dento de nós, Gotucha. É também graças à nossa vida interior que acrescentamos vida. O escritor procura o triunfo da vida. O escritor enfrenta os pregadores da morte e da economia. O escritor escreve e aguarda o avião da Gotucha. Que nada de mal aconteça à sua menina, é tudo quanto deseja. O escritor escreve à esplanada da “Padeirinha”. Está muito calor. Pouco ou nada se passa à sua frente. Sente-se mais apto para enfrentar o mundo. Sente-se mais sábio. Com mais palavras. Sente-se dono da palavra. Escreve livremente. Sente-se solto. A loira não está. Mas isso não o desmoraliza. Olha as horas. Tem que se preocupar com o avião da Gotucha. Com a Gotucha preocupa-se verdadeiramente. Fica triste quando ela está triste. Ri quando ela ri. Acredita na Gotucha. A Gotucha deu-lhe a volta à cabeça.

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