DO GRANDE POETA
António Pedro Ribeiro
Os grandes poetas são magos, são xamãs.
Vivem a experiência do "desregramento dos sentidos", como dizia Rimbaud.
Vivem desesperadamente o instante. Para compensar o grande tédio da existência quotidiana vivem uma vida interior riquíssima, intensíssima. Vivem uma embriaguez permanente mesmo quando estão parados à mesa ou ao balcão.
Passam do céu ao inferno, do inferno ao céu numa só tarde como se dizia de Rimbaud e de Baudelaire. Vão beber cervejas ao inferno, como dizia Cesariny de Rimbaud, e regressam.
O cidadão comum cruza-se com eles mas raramente os compreende.
Aproxima-se dele quando ele vai beber cervejas. Mas não o acompanha ao inferno.
Não é capaz. Teme o inferno, teme descer às profundezas de si mesmo.
Mas há qualquer coisa nas mulheres, em certas mulheres, que as aproxima do poeta.
Qualquer coisa que não é troco nem troca, qualquer coisa que se aproxima de Deus, da ideia de Deus, do amor enquanto divindade.
É certo que também há homens, amigos, companheiros que se aproximam do poeta. Que bebem copos com ele mas que não podem acompanhá-lo ao inferno. Nem sequer alguns que se dizem poetas, escritores, diseurs.
Até podem ter a retórica mas falta-lhes o fogo.
Jamais conseguirão criar nas condições em que o faz o poeta.
Não é uma questão de jogos de palavras. Não é uma questão de acertar na palavrinha.
É uma questão de vivência, de contacto com o fogo da criação.
É uma questão de jogar o jogo da loucura.
De não ter medo de ir atrás da loucura como se vai atrás do inferno.
De não ir atrás das conveniências e do senso comum.
De ser infinito dentro do finito.
In FREEZONE
segunda-feira, 5 de julho de 2010
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