sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

DO HOMEM


Safar-se. Arranjar um emprego. Sacar dinheiro. Sobreviver. Eis a que se resume a existência humana. Eis o que nos metem na cabeça ao longo dela. Que pobreza! Vir ao mundo para isto. Crescer para isto. Condicionar todos os passos em função da pequena esperteza, da safadeza. É isto o homem pequeno. O homem pequeno está por todo o lado. Este ainda é o tempo do homem pequeno. Reconhecido e respeitado por amealhar o maior quinhão, a maior parcela. A poesia, a filosofia são meros adornos subordinados à lógica do mercado e do desenrascanço. Não há aqui qualquer grandeza ou nobreza, não se questiona o homem, não se procura a evolução, o crescimento da espécie humana. Não há qualquer evolução, qualquer tentativa de superação, a superação do homem pela qual Nietzsche e outros filósofos se bateram. Macacos, macacos que trepam, sobrevivem e mercadejam. Não passam disso mesmo os homens pequenos. A ciência e o conhecimento estão reduzidos à lógica dos macacos. Acumula-se dinheiro, bens, poder, influências como se acumulam bananas. Para quê Platão? Para quê Nietzsche? Se continuamos reduzidos à lógica do sustento, da sub-vida. Não é possível o homem descer tão baixo. Não é possível ver a vida resumida a isto. Aliás, as imagens das pilhagens, do save-se quem puder no Haiti são sintomáticas. É o primarismo, o primatismo levado ao extemo, mesmo entre intelectuais. Não. O homem não é isto, não pode ser isto. Isto não é um jogo de futebol. A bola a rolar, a contabilidade dos ganhos e das perdas, a mercearia. O homem nasceu para se superar, para ser igual aos deuses, para ser ele próprio um deus ou, se quisermos, o super-homem. E o homem supera-se na criação, no afecto, no conhecimento, nas mesas partilhadas. O homem é questionamento e vontade. O homem não é submissão, conformismo, aceitação. "Viver segundo a minha vontade ou não viver", disse Nietzsche. O homem é criação e vontade. Não precisa de Deus nem de deuses. Não precisa sequer de governantes, nem de deputados, nem de chefes. O homem é tudo e nada. Não conduz nem é conduzido. Vive. Canta. Dança. Ri. Acredita em si mesmo. Ama. Supera-se. É livre. É caminho e fim em si mesmo.

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