domingo, 23 de setembro de 2007

A ILÍADA NO VELVET


A ILIADA NO VELVET




Não sou menos do que em Agosto


mas as meninas já não vêm




volto ao bar escuro


quase sem cheta


como nos anos 90


em Braga


o estrelato quase à porta


e a cidade não me dá nada


não se passa absolutamente nada




Não sou menos do que Augusto


mas à minha volta só vejo


gajos, putos e mulheres tomadas


a cidade está deserta




às vezes parece renascer


com o balançar das tuas ancas




Perdi o último metro


a estrela está só


a menina bonita já não está


e eu estou a perder a lata


nem sequer tenho cacau


para apanhar uma borracheira


sou de Braga do porto


era lá que deveria estar


e não aqui neste bar murcho


apesar da moira ser muito simpática




ao que parece,


nada se vai passar até às 6,


nem tão pouco conversas com putas,


travestis e amigos das multas


que nos oferecem poemas


e são tesoureiros da Junta de Freguesia




só putos e tédio


não há rock nada rola


e a menina bonita não está


não vai estar mais




deveria ter ido para casa-


dizem a moral e o bom senso


só aparecem putos e mais putos


e eu escrevo


porque dizem que sou um poeta maldito


com tendências alucinatórias e visionárias


e os meus admiradores e detractores


esperam isso de mim


entregue a mim próprio


com poemas, livros e palavras


que não consigo transmitir às gajas


de que gosto e espeto no papel




olho para o cu da gaja que está ao balcão


e o mundo renasce


o mundo das tatuagens


dos vidros partidos


dos automóveis


da bófia


do bailarino


do sangue na guelra


do homem em guerra


e já me apetece cantar outra vez


usar e abusar de vez


onde está a menina?




Bebo e, uma vez mais,


agradeço a amabilidade


e a doçura da Li Han




Aguardo a fiesta


sempre é preferível à conversa


dos gajos sem conversa




onde está a magia de Agosto,


de Paredes de Coura,


onde as miúdas te olhavam,


te procuravam e se metiam contigo?


Pensaste que eram tudo provocações,


"Era o Rouxinol e era a Rita",


tiveste medo e agarraste-te à menina


do Gerês que amas,


que realmente amas


e queres acariciar, cobrir de beijos,


abraçar para sempre,


a menina que ficou na tenda


enquanto tripavas no hotel


a menina que te deu de comer,


de beber e te vestiu


quando a chuva te batia nos cornos


a menina que te despertou do transe


és a estrela mas permaneces teso




e as ancas continuam a balançar ao balcão


não sabes se hoje ou qualquer noite


te dirigirão a palavra


que se foda!


ao menos aqui sabes que escreves livremente


enquanto que no outro tasco


te abandonaram quando usavas da palavra


sobraram 7 ou 8


7 ou 8 amigos, 7 ou 8 espectadores


para a estrela do rock n' roll


7 ou 8...em Paredes eram 500...




o bar enche e já há algumas gajas


que não conheces nem elas te reconhecem


o resto são putos


e música foleira




aos 38 anos, o poeta subversivo e surrealista


que vai à rádio e aos jornais


no meio de putos que não sabem quem és


nem querem saber


38 anos e sobram as ancas da gaja


dos blue jeans ao balcão


38 anos e hoje de nada te vale a canção


nem tens palco para brilhar


e o teu amigo canta em Famalicão


onde deverias estar


afinal, ias lá ficar noite fora


noite fora e ninguém à tua mesa


noitr fora e os putos não gramam a tua cena


a única que te topa é a Li Han


sempre não é agarrada ao pau


como o outro camarada


e apetece-te beber a noite toda


mesmo que a noite não dê em nada


apetece-te continuar com a Ilíada no Velvet


que começou com duas loiras


no café das ruas da cidade antiga




és Dionisos, Aquiles, Ulisses


e ninguém te reconhece


já não há deuses nem semi-deuses


Esparta está minada


mesmo que fiques até de madrugada


a escrever baboseiras que ate podem


ter algo de sublime


mas não te servem de nada




tens a quem sair


sabes que não tens emenda


e podes cair de novo


touro no meio da arena


da música foleira


escreves e ninguém dança


escreves para encher a pança


ou a alma ou o caralho que seja




és a puta do rock


à cata de clientes à cata de estrelas


és a puta do rock


e cantas daqui a uma semana


és a puta do rock


e vais ficar até de madrugada


és a puta do rock


e és de Braga


és a puta do rock


e não se passa nada


és a puta do rock


e andas com as voltas trocadas


és a puta do rock


e não sacas mulher nem te esforças por nada


és a puta do rock


e o mundo é uma merda


tal como s música foleira que passa.




Aqui ninguém te ama


e escreves rock n' roll para a sanita


contas os trocos e não sobra nada


onde está a fama? A cama?


A Glória? a MULHER que te grama?




É o rock e a amiga...


é o rocker no meio do nada


a boazona do teu amigo


nem sequer te chama


é o rock sem a amiga...


é o rock e a derrocada...


é o poeta e o anarca aos papéis


até de madrugada


é o sexo à mão de semear


com o fio dental à molhada.




Até sei que isto numa "soirée" de poesia


num tasco qualquer dá direito a palmas


mas aqui...é morte d' alma


é a morte do artista


são versos para a sepultura




escrever...morder...morrer...


escrever...e acabar sem nada...




ondem páram os teus amigos,


velhos companheiros de noitada?


Onde páram aqueles


que te beijam a cara?




Poema épico até de madrugada


Lídia Cavalo de Tróia


Afrodite vinda das àguas


reis de que vens


Alexandre, o Grande,


sangue de poeta


mulher que foges


a meio da batalha


mulher que entras e sais


e te sentas ao som da batida


Allen Gingsberg beat generation


beber até ao raiar da aurora.




A. Pedro Ribeiro, VELVET, Vila do Conde.

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